Alana Gandra
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - Mostrar aos alunos como a natureza “faz” negócios e oferece soluções para problemas do dia a dia é uma missão prazerosa para o professor do Departamento de Design da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Fred Gelli.
Considerado um dos maiores especialistas brasileiros em biomimética, ciência que busca inspiração e aprendizado na natureza para projetos sustentáveis em várias áreas do conhecimento, como desenho industrial, arquitetura e engenharia, o professor avalia que a resposta dos alunos é cada vez mais positiva. Ele transforma as aulas em um lugar para pensar e acaba ampliando a discussão para a perspectiva de transformação. E aí, a biônica é o ponto central. “A natureza é fonte de resposta para qualquer problema”, assegurou Gelli à Agência Brasil.
“Quando você olha para qualquer ecossistema como fonte de inspiração para pensar nessa perspectiva dos negócios, a gente está falando de um grande ambiente de trocas, assim como ocorre nos nossos ambientes de negócio”. A diferença é que, na natureza, o ambiente nessas trocas é sustentável, apesar de cada elemento ter o seu lucro para poder sobreviver. “Existe ali um balanço interessante entre competição e cooperação”.
O professor citou o caso do leão, que precisa de um território de pelo menos 30 quilômetros quadrados para poder viver bem. “É o lucro dele. Só que existe uma sabedoria universal que faz com que ele entenda que, para existir, o seu vizinho tem que ter o seu próprio lucro. Porque sabe que, se esses caras deixam de existir, o sistema do qual ele depende e ele próprio podem ficar ameaçados”, disse.
No caso do jeito humano de fazer negócios, segundo ele, a conclusão é que “o homem quebrou esse equilíbrio fino entre competição, que é necessária para as coisas evoluírem, e cooperação”. O desequilíbrio dessa lógica foi causado pela ganância, que priorizou a maximização do lucro e a minimização dos custos a qualquer preço. “Esse tipo de pensamento vai contra a lógica da natureza de entender que você precisa garantir a geração de valor para todo o ecossistema do qual faz parte”. A isso se denominam negócios de valor compartilhado, enfatizou Gelli. Ele acredita que esse será o jeito de fazer negócios no futuro.
Quando era ainda aluno da PUC, Fred Gelli e sócios fundaram, em 1989, a empresa Tátil, que nasceu do seu projeto de graduação sobre o jeito da natureza de embalar as coisas. Um trabalho desenvolvido àquela época pela empresa nascente foram embalagens feitas de material reciclado que dispensavam cola e se inspiravam no encaixe dos ossos humanos. A preocupação da empresa com a ecoinovação é grande. A empresa conta, entre seus funcionários, com uma bióloga que auxilia no desenvolvimento de embalagens com baixo impacto ambiental.
No ano passado, Gelli desenvolveu, com apoio da Fundação Getulio Vargas de São Paulo, um projeto que visava a entender justamente como os negócios são processados pela natureza. A ideia era criar um banco de inspirações para qualquer pessoa interessada em criar algo a partir de organismos bióticos. Esse banco está em andamento o tempo todo, porque não tem fim, ressaltou Gelli. Chamou a atenção, porém que embora o conceito seja original, a perspectiva é óbvia.
“Quando você olha para qualquer ecossistema como fonte de inspiração para pensar nessa perspectiva dos negócios, a gente está falando de um grande ambiente de trocas, assim como ocorre nos nossos ambientes de negócio”. A diferença é que, na natureza, o ambiente nessas trocas é sustentável, apesar de cada elemento ter o seu lucro para poder sobreviver. “Existe ali um balanço interessante entre competição e cooperação”.
Fred Gelli explicou que de maneira intuitiva, o homem, desde o tempo das cavernas, sempre olhou a natureza como fonte de inspiração para os problemas diários. Em vez de ater-se ao termo biomimética, que foi cunhado em 1997, o professor prefere falar de inspirações em soluções naturais. “É mais abrangente, inclusive, porque você inclui o que é biônico ou biótico, ou seja, as experiências e inspirações que vêm de organismos vivos, e também inspirações que vêm de referências abióticas”.
Um exemplo de referência abiótica são os cristais de rocha que podem, segundo Gelli, ser uma inspiração interessante para uma série de soluções de um jeito da natureza de resolver, nesse caso, problemas estruturais.
A biomimética significa, então, o aproveitamento da experiência que a natureza vem experimentando há 3,8 bilhões de anos, para “criar soluções para problemas muito parecidos cm os que nós temos no nosso dia a dia”. A evolução da ideia e do princípio contidos na natureza foi sendo amadurecida durante milhões de anos e o homem pode observar essas ideias e trazê-las para uma ação concreta hoje. E com uma vantagem, ressaltou Gelli. “Deus não cobra direito autoral de ninguém”, disse .
O professor destacou também que as inspirações podem vir de fontes diferentes e trazer soluções para qualquer área do conhecimento. Um exemplo clássico é o velcro, que foi inspirado nos carrapichos, que são sementes que grudam nos animais para pegar carona e espalhar as espécies. Há soluções mais estratégicas, buscando entender como a natureza “faz negócios”, observando-se como ela equaciona e faz relacionamentos.
“É um campo infinito de possibilidades”, disse Gelli. Completou que se trata de um “desafio monumental”. Na avaliação do professor da PUC-RJ, esse banco de ideias está aí, à disposição de todas as pessoas para que elas possam ir beber nessa fonte.
Matéria alterada às 19h06 para acréscimo de informação
Edição: Aécio Amado
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