Alex Rodrigues
Repórter Agência Brasil
Brasília – Um grupo de representantes dos índios xavantes que atualmente vivem na Terra Indígena Marãiwatsédé, no norte de Mato Grosso, entregou hoje (23) a representantes da Comissão Nacional da Verdade um documento em que relatam episódios de violações aos seus direitos ao longo de décadas.
Entregue à psicanalista Maria Rita Kehl, responsável por coordenar a apuração das denúncias sobre violações aos direitos indígenas entre 1946 e 1988, o Relatório sobre Violações dos Direitos Humanos: O Caso dos Xavante de Marãiwatsédé narra, a partir do ponto de vista indígena, fatos como a invasão do território tradicionalmente ocupado pelos xavantes de Mato Grosso, além de assassinatos e a disseminação de doenças contra as quais os índios não tinham proteção natural.
O grupo xavante também aproveitou o encontro para relatar as dificuldades que continuam enfrentando após receberem o direito ao usufruto da terra – que, legalmente, pertence à União. Também denunciaram que um grupo de pelo menos 50 não índios que se identificam como antigos moradores voltou a ocupar a área nos últimos dias.
De acordo com Maria Rita Kehl, os índios xavantes narram, no relatório, entre outros fatos, as expulsões que sofreram; as epidemias que, nos anos 1950 e 1960, dizimaram mais da metade da etnia; e a ocupação de suas terras por um fazendeiro que abriu uma empresa com a conivência do governo, quando os índios foram retirados do lugar.
“A maioria dos xavantes morreu por epidemias antes de, já nos anos 1990, voltarem para uma reserva muito menor que o território que tinham anteriormente”, disse Maria Rita Kehl ao fim do encontro. O relatório foi produzido pela Associação Bö´U (Urucum) e pela ONG Operação Amazônia Nativa (Opan).
“A importância do relatório é para que nossa história seja reconhecida nacionalmente. Nossos antepassados sofreram muito quando foram transferidos de nossa terra tradicional e [no local] foi instalada a fazenda [Suiá Missú]”, comentou Cosme Paridzané, filho do cacique Damião Paridzané, lembrando que, a partir daí, o grupo xavante passou a se transferir de uma reserva a outra.
Segundo o Censo 2010, cerca de 1,8 mil índios xavantes viviam na terra indígena de 165 mil hectares (1 hectare corresponde a 10 mil metros quadrados, equivalente a um campo de futebol oficial). A retirada dos não índios de Marãiwatsédé foi concluída em janeiro. Há duas semanas, uma comitiva do governo federal, entre eles o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, participou de cerimônia para oficializar a concessão de uso da terra.
Quanto às denúncias, Maria Rita comentou apenas que a Comissão Nacional da Verdade não tem poder para interferir diretamente em nenhum conflito social no país, mas que as queixas poderão ser tratadas conjuntamente com as recomendações que vão ser apresentadas ao fim dos trabalhos.
“A comissão vai encaminhar uma série de recomendações que, esperamos, sensibilizem a sociedade, inclusive o Senado e a Câmara dos Deputados. Podemos, por exemplo, sugerir que a presidenta Dilma continue tendo o poder de homologar terras indígenas; que este poder não seja tirado dela, porque aí, com um Congresso Nacional com uma grande maioria de ruralistas, os indígenas estariam ainda mais ameaçados. Também podemos recomendar a retomada da dimensão de terra necessária para a preservação dessa cultura”.
Edição: Davi Oliveira
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