Camila Maciel
Repórter da Agência Brasil
São Paulo - A Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) mantém um projeto similar ao desenvolvido pela prefeitura de São Paulo para dependentes químicos com o intuito de reinseri-los socialmente. A principal diferença entre os modelos, no entanto, está na exigência feita pelo projeto da universidade de que o morador esteja em abstinência por pelo menos 60 dias. "No modelo de apoio, que é o nosso, o paciente já está em outra fase de reintegração social. Eu venho aqui uma vez por semana. Essa é a característica da casa de apoio, que não tem intervenção", explica Isabel Oliveira, psicóloga do projeto.
O projeto de moradia assistida da Unifesp não mantém técnicos atuando na casa. "Eu coordeno a casa e tenho o [senhor] Ângelo que me dá um suporte, que também é um residente", explica a psicóloga. No programa municipal, uma equipe de sete acompanhantes reveza-se para ficar na casa em tempo integral. "Se eu tiver uma recaída [de algum interno] não tenho como manejar aqui, tenho que tirá-lo, pois há o risco de que isso prejudique o processo de tratamento dos outros moradores", justifica Isabel.
Os critérios para ser aceito no programa da Unifesp, além do período de 60 a 90 dias de abstinência, são: ter suporte familiar, estar em tratamento terapêutico fora da residência e ter condições para manter as despesas dentro da casa. "A família dá o suporte, ou alguns têm emprego. Eles ficam esse tempo para reorganizar a vida, voltar a estudar, procurar emprego e reconstruir os vínculos familiares", explica a psicóloga.
É o que espera o auxiliar administrativo Márcio Davi Machado, 45 anos. Há três meses na casa, ele conseguiu retomar o trabalho na Universidade de São Paulo (USP) e agora quer ter condições de estabelecer uma moradia própria. Apesar das várias internações anteriores, ele diz que está mais fortalecido para enfrentar as dificuldades e superar o vício. "Entendi que antes de tudo vem o emocional. Se algo me desestabiliza, é aí que complica. Preciso ficar bem comigo", explica.
Enquanto conversa com a reportagem da Agência Brasil, Márcio prepara um arroz doce e troca receitas com o projetista Ângelo Aggiu, 66 anos, o morador mais antigo da casa. Ele, que está há dois anos na residência, é responsável pelas contas conjuntas, como diarista e alimentação coletiva. Apesar do clima de companheirismo, Seu Ângelo, como é chamado pelos demais, não nega que, às vezes, é preciso contornar desavenças na casa. "É como uma família mesmo. Tem um que reclama que pegaram o leite, outro que fala do volume da tevê. A gente tem que ir conversando", relata.
Desde abril de 2010, quando o projeto foi iniciado, 23 moradores passaram pela casa. "Cerca de 50% dos residentes atendidos permaneceram no programa por, no mínimo, seis meses, com boa evolução", avaliou Oliveira.
Em março, Anderson Faria da Silva, 30 anos, espera entrar nas estatísticas da casa como um dos casos de cumprimento da meta: com estudo e emprego garantidos. "Estou decidindo com a minha família onde vou voltar a estudar, porque é o meu pai que vai custear", explicou ele, que cursou até o 7º ano. Enquanto está na casa, ele sai todos os dias para procurar emprego. "Minha rotina é assim: compro jornal na banca, olho o que sei fazer, vejo que tem vaga para manobrista e corro atrás. Fiz testes ontem, amanhã tenho outros dois lugares. Amanhã não dá porque tenho terapia, vou conciliando, não dá para largar", relatou.
Anderson, que passou recentemente por um processo de internação, sairá da casa para morar com o pai, que vai passar por uma cirurgia e não pode recebê-lo no momento. "Ficar sozinho agora ia ser complicado. Ele está em Minas Gerais com parte da família", explicou. Assim que o pai voltar para São Paulo, ele espera reconstruir a relação familiar, que foi desestabilizada pelo vício. "Sou o único dos que estão morando aqui [na casa da Unifesp] agora que vai voltar para a família. É normal que as relações fiquem abaladas", avaliou.
Edição: Tereza Barbosa
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