Alana Gandra
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - A Associação de Medicina Intensiva Brasileira (Amib), que representa os profissionais que atuam nas unidades de tratamento intensivo (UTIs), quer implantar no Brasil o curso de catástrofe e desastres (Fundamental Disaster Management-FDM) da Sociedade Norte-Americana de Medicina Intensiva.
O primeiro curso está previsto para abril, em Goiânia, e há dois programados para São Paulo no final daquele mês. Especialistas dos Estados Unidos e de Portugal participarão dos cursos já programados. A expansão do treinamento para todo o país depende de parceria com o Ministério da Saúde, disse hoje (30) à Agência Brasil o presidente da Amib, José Mário Teles. Na semana passada, médicos intensivistas brasileiros participaram do FDM.
Teles destacou que o curso existe há mais de oito anos nos Estados Unidos, em função de ataques terroristas, desastres naturais, infecções virais e pandemias. “Existe esse conceito nos Estados Unidos que um hospital de porta aberta, isto é, um hospital de emergência, tem que estar preparado para atender uma situação de múltiplas vítimas”.
A ideia da Amib é trazer o curso para o Brasil em função dos grandes eventos que estão programados para o país, como a Copa do Mundo de 2014. “Se vamos nos preparar para eventos como a Copa do Mundo e as Olimpíadas, temos que ter essa conscientização, porque aglomerar pessoas em estádios, festas, é uma situação que propicia esse tipo de coisa”.
Para o presidente da Amib, o Brasil não está preparado para o atendimento súbito de muitas vítimas. Ele disse que a taxa de ocupação nos hospitais brasileiros é de quase 100%, com um número significativo de pacientes aguardando horas na fila de emergência para serem atendidos. Para Teles, planejamento é a palavra-chave quando se tem uma situação em que aumenta de maneira súbita o número de feridos. Segundo ele, se não houver planejamento de pessoal, material, equipamentos e de espaço, a situação se complica.
O médico informou que existem atualmente tendas infláveis que podem ser montadas do lado de fora dos hospitais, em apenas um minuto e 15 segundos, para atendimento de 30 pessoas em macas. “Ou seja, tem que ter mais profissionais, mais equipamentos, materiais, medicamentos e mais espaço. Um hospital tem que ter estrutura”.
Teles comentou que a proximidade dos grandes eventos internacionais vai obrigar os hospitais privados a investir em planejamento de catástrofes. Ele considera, porém, que esses investimentos têm que ser públicos, feitos pelo Ministério da Saúde. “Senão, não tem condição”.
A expectativa é que o ministério dê apoio à realização desses cursos no país. O presidente da Amib ressaltou que ao mesmo tempo que prepara os profissionais para lidar com situações extremas, o curso ensina a fazer a triagem de pacientes e a usar os recursos de maneira mais eficiente. “Esse curso no momento, infelizmente, é muito oportuno”, disse, referindo-se à tragédia da Boate Kiss, em Santa Maria (RS), onde mais de 230 jovens morreram no último domingo (27).
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), nos países de baixa renda acontecem 9% do total de desastres no mundo, com 48% das fatalidades. Teles disse que a falta de investimentos e de preparo dos intensivistas explica esse fato. Gráfico apresentado durante o curso pela Sociedade Norte-Americana de Medicina Intensiva revela que quando ocorre um acidente com múltiplas vítimas, a pessoa que chega à emergência de um hospital até uma hora depois 50% de perigo de morrer. Os que chegam duas horas depois, têm 78% e os que chegam três horas depois, o índice de mortalidade se aproxima de 95%.
Segundo Teles, o Brasil apresenta uma série de dificuldades para atender vítimas de catástrofes, inclusive de locomoção. No caso da Boate Kiss, em Santa Maria (RS), ele destacou que a ação dos órgãos militares foi fundamental, ao disponibilizar aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) para o transporte dos feridos.
Ele destacou que o Rio Grande do Sul é o estado que dispõe dos melhores profissionais de unidades de terapia intensiva do país. ”Se essa tragédia tivesse acontecido em outro estado, com certeza, nós teríamos muito mais que 300 mortos, por causa das dificuldades que poderiam ser encontradas”. O médico enfatizou a necessidade de que sejam feitas simulações nos hospitais a cada quatro meses, para que as dificuldades observadas antes e depois possam ser discutidas pela equipe. A meta da Amib é treinar no curso de catástrofes e desastres 5 mil pessoas por ano.
Edição: Tereza Barbosa
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