Gilberto Costa
Correspondente da EBC em Portugal
Lisboa - A grande circulação de pessoas entre os países e a ocorrência de picos de calor e de umidade estão favorecendo a ocorrência de casos de dengue na Europa. A infestação dos mosquitos transmissores da doença é tanta que os órgãos de saúde pública e as instituições de pesquisa sanitária consideram a possibilidade de surto em alguns lugares – como no Sul do continente.
Entre outubro e dezembro do ano passado, o Arquipélago da Madeira (no Oceano Atlântico a cerca de 1.000 quilômetros de Lisboa) registrou mais de 2,1 mil casos de dengue. A chegada do vírus à parte continental de Portugal é dada como certa por especialistas, provavelmente, no próximo verão.
“O surto de dengue na Madeira é um surto que irá se repetir no futuro, a partir do momento em que temos condições para que haja transmissão autóctone da dengue, temos o vetor e o vírus”, salienta Jorge Atouguia, médico especialista e investigador do Instituto de Higiene e Medicina Tropical de Portugal. “Essa transmissão vai ocorrer periodicamente; assim como se passa no Brasil e em outros países da América Latina e da Ásia.”
Segundo ele, o surto de dengue na Madeira ocorreu porque há a grande presença na ilha (especialmente em Funchal) do Aedes aegypti, transmissor do vírus, e porque alguma pessoa com a doença – que desembarcou no arquipélago vinda de uma área tropical e tenha sido picada pelo mosquito – deu início ao ciclo de contaminação.
“Para evitar a doença depois da chegada do mosquito [que vem sendo verificada desde 2005] o importante era que não houvesse ninguém infectado, mas esse alguém chegou em outubro de 2012”, calcula Jorge Atouguia.
De acordo com o pesquisador, o vírus veio da Venezuela. Segundo ele, há cerca de 300 mil pessoas com origem ou parentes na Ilha da Madeira, morando na Venezuela. Há voos diretos entre os dois lugares, o que pode propiciar que algumas pessoas com o vírus viagem e desembarquem antes de começar a sentir os sintomas da doença (febre, dor de cabeça, dor atrás dos olhos, dores musculares, dores nas juntas, prostração e vermelhidão no corpo).
Além da Madeira, Autoguia prevê que o Aedes aegypti possa circular em Portugal na época de mais calor e se alojar em definitivo na Região Sul de Portugal (no Algarve), onde as temperaturas são mais elevadas. O mosquito circula geralmente onde há temperaturas acima dos 15 graus Celsius (ºC).
O pesquisador alerta que na Europa há outro vetor que contribui para a propagação da doença – um “primo asiático do Aedes aegypti”: o mosquito Aedes albopictus já presente no Sul da França, na Itália, e na Espanha. O Aedes albopictus vem sendo verificado na Europa desde a década de 1980 (na Albânia) e, apesar de não passar o vírus para os ovos (como faz o Aedes aegypti), ele transmite a doença ao picar uma pessoa infectada e depois outra sem o vírus.
No caso do Aedes aegypti, as fêmeas se alimentam do sangue humano no período de reprodução e passam o vírus para os ovos, de onde surgirão novos mosquitos contaminados.
Por enquanto, não foi verificado nenhum caso de dengue hemorrágica (que pode levar à morte), porque somente um tipo do vírus da dengue foi encontrado na Europa. A possibilidade do agravamento da doença ocorre quando uma pessoa já contaminada é infectada posteriormente por outro tipo de vírus. No Brasil, circulam quatro tipos do vírus da dengue e por isso há casos de dengue hemorrágica. “Espero que isso [a dengue hemorrágica] nunca aconteça. Se ocorrer, terá efeitos danosos inclusive para a economia”, alerta Jorge Autoguia ao lembrar que a Ilha da Madeira tem o turismo como uma das principais atividades.
O especialista lembra que “onde há pessoas há o mosquito” e, por isso, como ocorre no Brasil, é preciso fazer campanhas de esclarecimento para que a população tome os cuidados para evitar o vetor da doença. A possibilidade de ocorrência de dengue na Europa e nos Estados Unidos é prevista pela Organização Mundial da Saúde (OMS) há pelo menos cinco anos. No Brasil, há diferentes pesquisas em andamento para a criação de vacina contra a dengue, esterilização do Aedes aegypti, além de iniciativas locais para controle da transmissão.
Edição: Talita Cavalcante
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