Com mensalão, STF julgou maior processo de sua história

28/12/2012 - 7h00

Débora Zampier
Repórter da Agência Brasil


Brasília – “Vocês nunca mais vão ouvir falar de uma ação tão longa, de um julgamento tão complexo.” Foram com essas palavras que o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, encerrou o julgamento da Ação Penal 470, o processo do mensalão, após mais de quatro meses de trabalho. Responsável por conduzir o caso na condição de relator, Barbosa admitiu que o mensalão trouxe “traumas” e que chegou a ter dúvidas sobre a conclusão do julgamento.

Além do grande impacto político, a complexidade da Ação Penal 470 vem da própria estrutura do processo. Originalmente com 40 réus, a ação produziu mais de 50 mil páginas e demandou a oitiva de 600 testemunhas. O julgamento durou 53 sessões e consumiu 204 horas de funcionamento do plenário, monopolizando o trabalho do STF no segundo semestre – em geral, a Corte leva até quatro sessões para julgar casos mais complexos.    

A denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) em 2006 apontava indícios de funcionamento de esquema de pagamento de propina a políticos e desvio de dinheiro público entre 2003 e 2004. Depois de anos de apuração, o procurador-geral, Roberto Gurgel, concluiu que o mensalão foi “o mais atrevido e escandaloso esquema de corrupção e de desvio de dinheiro público flagrado no Brasil".

Os crimes descritos pelo Ministério Público foram corrupção, peculato, lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta de instituição financeira, evasão de divisas e formação de quadrilha. Entre os denunciados estavam políticos ligados ao governo, parlamentares, assessores, donos e funcionários de empresas da área financeira, publicitária e de corretagem e um funcionário público.

Dos 40 réus iniciais, três não chegaram a ser julgados pelo STF. Ex-secretário-geral do PT, Silvio Pereira fez um acordo com o Ministério Público e prestou serviços comunitários; José Janene, ex-líder do PP na Câmara dos Deputados, morreu em 2010; e o empresário Carlos Alberto Quaglia, dono da corretora Natimar, será julgado pela Justiça comum devido a um erro processual no STF.
 
O julgamento do mensalão começou no dia 2 de agosto, depois de quase sete anos de tramitação na Suprema Corte, com a solução de questões preliminares e a apresentação das teses de acusação e de defesa. A fase de condenações e absolvições começou em 16 de agosto e terminou apenas em outubro. Dos 37 réus, 25 foram condenados e 12 absolvidos.

A etapa da fixação das penas começou no dia 23 de outubro e só acabou no início de dezembro. A Corte decidiu que 11 réus devem cumprir a pena em regime inicialmente fechado, 11 em regime semiaberto, um em regime aberto e dois tiveram a pena substituída por medidas restritivas de direito, como pagamento de multa e proibição de exercício de função pública.  Ao todo, as condenações somaram 273 anos, três meses e quatro dias de prisão, e as multas superaram R$ 20 milhões em valores ainda não atualizados.
 
A partir de 5 de dezembro, os ministros decidiram questões residuais, ajustando penas e autorizando a perda de mandato de parlamentares. O julgamento terminou em  17 de dezembro, mas a ação penal continua tramitando. É esperada para o início de 2013 a publicação do acórdão, documento que sintetiza os principais acontecimentos do julgamento. Somente com o acórdão as sentenças podem ser executadas ou recorridas pelos advogados, que já prometeram acionar o STF para contestar as condenações e penas aplicadas.

 

PENAS DO MENSALÃO

 

 

 

 

Núcleo Político

RÉU

CRIME

PENA

José Dirceu

ex-ministro Casa Civil

Formação de quadrilha

Corrupção ativa

10 anos e 10 meses

José Genoino

ex-presidente do PT

Formação de quadrilha

Corrupção ativa

6 anos e 11 meses

Delúbio Soares

ex-tesoureiro do PT

Formação de quadrilha

Corrupção ativa

8 anos e 11 meses

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Núcleo ligado ao Congresso Nacional

João Paulo Cunha

deputado federal (PT-SP)

 

Corrupção passiva

Peculato

Lavagem de dinheiro

 

9 anos e 4 meses

Roberto Jefferson

ex-deputado federal (PTB-RJ)

Corrupção passiva

Lavagem de dinheiro

7 anos e 14 dias

Pedro Corrêa

ex-deputado federal (PP-PE)

Corrupção passiva

Lavagem de dinheiro

 

7 anos e 2 meses

Pedro Henry

deputado federal (PP-MT)

Corrupção passiva

Lavagem de dinheiro

7 anos e 2 meses

Valdemar Costa Neto

deputado federal (PR-SP)

Corrupção passiva

Lavagem de dinheiro

7 anos e 10 meses

Romeu Queiroz

ex-deputado federal (PTB-MG)

Corrupção passiva

Lavagem de dinheiro

6 anos e 6 meses

Bispo Rodrigues

ex-deputado federal (PL-RJ)

Corrupção passiva

Lavagem de dinheiro

6 anos e 3 meses

José Borba

ex-deputado federal (PMDB-PR)

 

Corrupção passiva

2 anos e 6 meses, substituída por restrições de direitos

João Cláudio Genu

ex-assessor do PP

Lavagem de dinheiro

Corrupção passiva (prescrita) 

5 anos

Jacinto Lamas

ex-secretário do PL

Lavagem de dinheiro

Corrupção passiva (prescrita)  

 

5 anos

Emerson Palmieri

ex-tesoureiro informal do PTB

Lavagem de dinheiro

Corrupção passiva (prescrita)

4 anos, substituída por restrições de direitos

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Núcleo Publicitário

 

Marcos Valério

publicitário

Formação de quadrilha

Lavagem de dinheiro

Corrupção ativa

Evasão de divisas

Peculato

 

40 anos, 2 meses e 10 dias

Ramon Hollerbach

publicitário

Formação de quadrilha

Lavagem de dinheiro

Corrupção ativa

Evasão de divisas

Peculato

 

29 anos, 7 meses e 20 dias

Cristiano Paz

publicitário

Formação de quadrilha

Lavagem de dinheiro

Corrupção ativa

Peculato

 

25 anos, 11 meses e 20 dias

Simone Vasconcelos

ex-diretora financeira da SMP&B

Lavagem de dinheiro

Corrupção ativa

Evasão de divisas

Formação de quadrilha (prescrita)

 

12 anos, 7 meses e 20 dias

Rogério Tolentino

advogado ligado a Marcos Valério

Lavagem de dinheiro

Corrupção ativa

 

 

6 anos e 2 meses

 

 

 

 

 

Núcleo Financeiro

Kátia Rabello

ex-presidenta do Banco Rural

Formação de quadrilha

Lavagem de dinheiro

Gestão fraudulenta

Evasão de divisas

 

16 anos e 8 meses

José Roberto Salgado

ex-vice-presidente do Banco Rural

Formação de quadrilha

Lavagem de dinheiro

Gestão fraudulenta

Evasão de divisas

 

16 anos e 8 meses

Vinícius Samarane

ex-diretor do Banco Rural

 

Lavagem de dinheiro

Gestão fraudulenta

8 anos e 9 meses

 

 

 

 

Demais condenados

Henrique Pizzolato

ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil

Lavagem de dinheiro

Peculato

Corrupção passiva

 

12 anos e 7 meses

Enivaldo Quadrado

ex-sócio da corretora Bônus Banval

Lavagem de dinheiro

3 anos e 6 meses

Breno Fischberg

ex-sócio da corretora Bônus Banval

Lavagem de dinheiro

5 anos e 10 meses

 

Edição: Graça Adjuto e Lílian Beraldo