Thais Leitão
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Maria Luíza Barbosa trabalha na casa da carioca Rosemary Machado há 23 anos. Carinhosamente chamada de “braço direito” da dona da casa, faz de tudo: cozinha, limpa e passa roupa. Ela também participou de muitos momentos marcantes da família. Viu os filhos de Rosemary crescerem, entrarem para a faculdade e se casarem.
Nesse período, sempre teve os direitos trabalhistas respeitados, entre eles a carteira assinada, rendimento mensal superior ao salário mínimo e férias de 30 dias. “Com tantos anos de convivência, até os meus defeitos já se amoldaram aos dela e os dela, aos meus”, brinca Rosemary.
Casos como esse devem se tornar cada vez mais raros no Brasil, na opinião de especialistas, principalmente se a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 478/10 for aprovada. O texto que acabou de passar pela Comissão Especial sobre Igualdade de Direitos Trabalhistas da Câmara de Deputados será encaminhado para apreciação do plenário da Casa e, posteriormente, ao Senado.
Apelidada de PEC das Domésticas, a proposta amplia os direitos dos empregados domésticos, incluindo obrigatoriedade de recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), carga horária semanal de 44 horas, hora extra e adicional noturno. A categoria reúne 6,6 milhões de brasileiros, sendo a maioria formada por mulheres, que somam 6,2 milhões de profissionais no ramo.
O consultor em emprego doméstico Mário Avelino considera as mudanças previstas na PEC um “avanço justo”, que assegura à categoria direitos importantes já garantidos a outros profissionais. Ele ressalta, no entanto, que o impacto no orçamento das famílias pode levar a um “grande processo de demissões” e que muitas delas devem acabar optando pela contratação de diaristas.
Segundo Avelino, para evitar o movimento, que ele considera ruim tanto para os patrões como para as trabalhadoras, a PEC deveria vir acompanhada de medidas que reduzam os custos do empregador.
“A doméstica é uma trabalhadora como qualquer outra e é justo que ela tenha garantidos os seus direitos, mas é preciso equilibrar os benefícios para a categoria com a redução de custos para o patrão. Caso isso não aconteça, não tenho dúvida que muita gente vai demitir. É uma catástrofe anunciada”. Avelino também é presidente do Instituto Doméstica Legal, uma organização não governamental que presta consultoria a empregadores domésticos na formalização das relações de trabalho.
Segundo o consultor, um levantamento feito pela instituição indicou que quase a metade das 2 mil famílias cadastradas na entidade demitiriam suas funcionárias caso fosse obrigatório o pagamento do FGTS. Essa é a mudança prevista na PEC que mais vai impactar os gastos mensais dos empregadores.
“A grande massa dos empregadores pertence à classe média, que paga suas contas com esforço. Temos que fortalecer o empregado, mas também quem emprega”, acrescentou.
Uma das alternativas compensatórias apontada por ele para aliviar os gastos dos empregadores é a redução do percentual de 12% pago ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Marinelma Macedo, presidente da Associação das Donas de Casa da Bahia, entidade que representa mais de mil mulheres no estado, também acha que as mudanças previstas na PEC são fundamentais para o avanço das relações trabalhistas na sociedade brasileira. Ela acredita que as famílias vão ter que encontrar caminhos alternativos para dar conta dos trabalhos domésticos.
“A maioria das famílias brasileiras não vai poder ficar sem essas profissionais, que têm papel muito importante na estrutura da nossa sociedade, mas é verdade que algumas terão que contratar diaristas e assumir mais atividades em casa, como lavar a louça”, disse.
O servidor público Pedro Carvalho, que mora em Brasília, diz que precisará refazer o orçamento doméstico, para não ter de abrir mão da babá. Ele não vê outra saída já que não tem com quem deixar os dois filhos pequenos.
“Para mim não vai ter jeito, vou ter que encaixar o aumento de gasto no orçamento da casa. Eu e minha esposa trabalhamos fora e não temos família em Brasília, então teremos que pagar o que a lei mandar”, disse.
Situação parecida vive a médica carioca Liziane Nunes. Ela, que é mãe de um bebê de 1 ano e está grávida do segundo filho, diz que vai continuar precisando contar com a ajuda de uma profissional para dar conta dos afazeres domésticos.
“No meu caso nem adianta mudar o esquema. Com dois bebês e trabalhando fora fica inviável não contar, pelo menos, com uma empregada doméstica”, disse.
Edição: Tereza Barbosa