Camila Maciel
Repórter da Agência Brasil
São Paulo – O som do instrumento medieval espineta preenche os corredores da Igreja Santo Antonio, construída por volta de 1590, no centro da capital paulista. Arquitetura, acústica e sonoridade transportam os ouvintes à atmosfera dos concertos de câmara dos séculos 16 e 17. A curiosidade do público em torno dos instrumentos musicais antigos utilizados no Projeto Sons das Igrejas do Centro, em funcionamento desde março, foi o mote para a montagem da exposição Instrumentos da Música Antiga, em cartaz na unidade Carmo do Serviço Social do Comércio (Sesc) até o dia 27 de novembro.
“A música daquela época era feita para salas pequenas. Os instrumentos tinham uma sonoridade mais delicada. É muito bacana fazer [as apresentações] nas igrejas, porque elas têm uma acústica adequada. Eles [os instrumentos] eram feitos para esse ambiente. Com isso, levamos a ideia da performance autêntica ao extremo”, explica Priscila Rahal Gutierrez, responsável pela exposição e supervisora do Núcleo de Ação Cultural do Sesc Carmo.
Priscila explica que, tanto o projeto como a exposição, fazem parte do movimento interpretação autêntica, surgido na Europa, na década de 1960, que buscava retomar a execução original das composições de grandes maestros. “[Surgiu] quando começaram a criticar muito as orquestras que tocavam Bach [Johann Sebastian Bach – 1685-1750] com instrumentos modernos, porque, na verdade, ele não compôs para esses instrumentos. O som que ele fazia não era esse”, relata a supervisora.
Para a exposição, foram selecionados 19 categorias de instrumentos que reúnem 22 modelos como a espineta, equipamento de teclas que foi desenvolvido no início do século 15 por Giovanni Spinetti. De acordo com a responsável pelo projeto, embora lembre um piano moderno, a espineta não deve ser considerada como um antecessor dele, tendo em vista que eles conviveram por mais de meio século e conservam características específicas. Enquanto no piano as cordas são marteladas, no instrumento antigo as cordas são beliscadas por uma “unha” feita com o talo de uma pena de ave.
“A espineta não tem muita possibilidade de fazer dinâmico, que é a diferença entre sons fortes e fracos. No piano, a força é diferente de acordo com a tecla. De fato, o piano passou a permitir mais recursos. Mas Bach não conhecia o piano moderno quando produziu suas peças”, explica Priscila Rahal. Além da espineta, a exposição traz, no grupo dos instrumentos de tecla, o cravo. A principal diferença entre eles é a posição das cordas em relação ao teclado. No primeiro, o ângulo é 30 graus, no segundo o ângulo é 90 graus.
A exposição divide os instrumentos em quatro grupos: teclas, sopro, cordas dedilhadas e cordas friccionadas. O clarinete barroco é um dos exemplares dos instrumentos de sopro. A supervisora explica que, apesar do equipamento existir atualmente, a principal diferença é a presença das chaves no lugar dos furos, que eram tampados pelos dedos dos músicos. “Tem peça de Mozart que ele compôs para esse clarinete, em que a troca de dedos é dificílima. Eram peças virtuosísticas que hoje são mais fáceis de tocar”, comparou.
Dentre os instrumentos de cordas, o representante comercial Felipe Bruno Silva, 28 anos, considerou a viela de roda um dos mais curiosos. “Nunca tinha visto nada parecido. E o som parece daqueles filmes antigos de guerra da Idade Média”, lembrou. A viela de roda faz parte do grupo de instrumentos de cordas friccionadas, as quais são tensionadas por uma roda movida a manivela e alteradas por um teclado. Os visitantes da exposição podem conferir o som de cada instrumento por meio de fones de ouvido.
Como parte da exposição, a igreja Nossa Senhora da Boa Morte, na rua do Carmo, receberá o concerto A Família Bach no próximo dia 30, a partir das 12h. A apresentação será constituída por flauta doce, violoncelo e cravo, reunindo repertório do século 18. Além do concerto, o projeto inclui bate-papos com instrumentistas que vão apresentar de forma mais detalhada os equipamentos. A programação, inteiramente gratuita, pode ser conferida no site do Sesc (www.sescsp.org.br).
Edição: José Romildo