Emerson Penha
Correspondente da EBC na África
Maputo, Moçambique – Dois milhões e cem mil crianças moçambicanas são órfãs ou vulneráveis e estão fora de qualquer tipo de proteção familiar. O número é resultado de levantamento feito pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) – organismo da ONU para a proteção de crianças e adolescentes – e representa 10% da população do país, estimada em 21 milhões de habitantes.
De acordo com Úrsula Pais, especialista em proteção à criança do Unicef, há um fenômeno entre a população infantil do país, chamado pela instituição de “órfãos pela segunda vez”. Segundo explica, isso ocorre quando as crianças perdem os pais e passam a ser criadas pelos avós. Esses, por sua vez, já idosos, logo não podem mais cuidar delas, que tornam a ficar abandonadas.
As muitas mortes provocadas por doenças adquiridas em decorrência da aids são um fator importante nesse levantamento. Há regiões no país em que dois em cada três habitantes são portadores do vírus HIV. As crianças que perderam seus pais que eram soropositivos sofrem preconceito da própria família, que em muitos casos não as acolhem, mesmo quando estão livres da infecção.
Entre outros motivos, a rejeição baseia-se em crendices como a de que esses meninos e meninas trariam má sorte à casa que as recebesse. Com isso, existem vários casos de adolescentes entre 12 e 15 anos de idade que cuidam – ou tentam cuidar - de vários irmãos e de outras crianças da região em que vivem. Há legiões delas pelas aldeias da Savana Africana, segundo a especialista.
Há ainda as crianças albinas, consideradas “enfeitiçadas” e muitas vezes usadas, ainda bebês, em rituais de magia, principalmente no Norte do país, próximo à fronteira com a Tanzânia. Quando sobrevivem, frequentemente mutiladas e com graves sequelas psicológicas, sofrem preconceito.
Outro problema das crianças albinas é que, como a pele não tem pigmento, elas têm alto risco de desenvolver câncer, fator acentuado pela incidência de luz solar do continente. Além disso, são pessoas brancas que vivem em comunidades formadas exclusivamente por negros, e por isso são segregadas.
Segundo Úrsula Pais, o modelo brasileiro, com programas de inclusão social como o Bolsa-Família ou os mecanismos que articulam setores da sociedade, como os conselhos tutelares, pode ser exemplo para Moçambique na luta pelos direitos das crianças. “Eu acho que o Brasil tem um sistema de proteção social bastante avançado, que chega a alcançar as pessoas que são necessitadas”.
Edição: Davi Oliveira