Falta de transporte afeta homenagem às vítimas da Chacina da Candelária

27/07/2012 - 18h02

Guilherme Jeronymo
Repórter da Agência Brasil

Rio de Janeiro – Foram realizados hoje (27), no Rio de Janeiro, missa e ato ecumênico em lembrança das crianças mortas na Chacina da Candelária, tragédia ocorrida há 19 anos. Em seguida, os participantes fizeram a Caminhada em Defesa da Vida, que percorreu trecho entre a Igreja da Candelária e a Cinelândia, também no centro da cidade, onde foram realizadas apresentações musicais.

Os organizadores reclamaram da falta de apoio oficial para o transporte dos participantes, o que teria esvaziado a cerimônia. O presidente do Conselho Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedca), José Pinto Monteiro, disse que foram solicitados, na semana passada, 70 ônibus à Secretaria Estadual de Assistência Social e Direitos Humanos, que não foram fornecidos. Ele estimou em 3 mil o número de pessoas que deixaram de comparecer à Candelária.

Segundo o secretário estadual de Assistência Social e Direitos Humanos, Antonio Claret Campos Filho, presente ao evento, o governo estadual apoiou a marcha e buscou viabilizá-la, reconhecendo o movimento em torno dela e sua importância na luta pelos direitos humanos no município, mas alegou que não teve condição de apoiar a parte de transporte.

O ato de homenagem às vítimas da Candelária ainda tinha direito a R$ 200 mil previstos no Fundo Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, valor que também pagaria o custo do transporte, mas o recurso não foi liberado por falta da regularização da comissão de administração do Cedca. Segundo o presidente do conselho, faltou a indicação de membro do governo para esse cargo, o que impede a gestão de recursos do colegiado.

Ocorrida em 23 de julho de 1993, no centro da capital fluminense, a chacina resultou na morte de oito meninos em situação de rua. Na ocasião, mais de 40 crianças e adolescentes dormiam na praça em frente à Igreja da Candelária quando cinco homens desceram de dois carros e fizeram vários disparos na direção do grupo. Na segunda-feira (23), associações de mães e entidades sociais fizeram vigília em memória das vítimas da Chacina da Candelária.

No ato e na missa realizados hoje, havia diversas faixas e cartazes, além de fotos de jovens vítimas da violência. Compareceram ao ato parentes de vítimas das chacinas do Borel, Guaratiba e Acari, representantes de mães com filhos internados no Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase) e integrantes do Movimento Mães de Maio, de São Paulo.

“A sociedade civil organizada deu uma resposta positiva, porque todos temos uma causa, a de combater de forma intransigente os altos índices de homicídio de adolescentes, sobretudo de meninos negros, que têm sido maioria [das vítimas] no Rio de Janeiro”, disse Marisa Chaves de Souza, integrante do Cedca e do Movimento de Mulheres em São Gonçalo.

O esvaziamento do ato foi motivo de diversas manifestações durante as cerimônias no interior da igreja, inclusive por parte dos sacerdotes católicos. “Quem tem medo da Candelária? Que tem medo do grito das crianças do Rio de Janeiro? Parece que alguém tem medo”, protestou o padre Renato Chiera, da diocese da Baixada Fluminense.

Para o sacerdote, os eventos de homenagem aos mortos da chacina sempre tiveram repercussão. “Nós sempre tivemos a possibilidade de fazer uma bela caminhada, essa voz ressoava pelo Brasil e pelo mundo inteiro. Será que alguém tem medo disso? Que isso manche a imagem da Cidade Maravilhosa?”, questionou.

O presidente do Cedca, José Pinto Monteiro, disse que a comissão organizadora e o próprio conselho se esforçaram para garantir o transporte, quando a verba de R$ 200 mil não foi liberada. “O que nós tentamos fazer em cima da hora: buscar requerimento junto à secretaria. Mas isso demanda tempo, e conforme vai se aproximando o dia fatal, fica muito mais fácil justificar a ausência do recurso, por conta do tempo, do que efetivamente arregaçar a manga e ir buscar os caminhos”, criticou.

Monteiro também reclamou do esvaziamento do colegiado. “O fato é que, por uma sucessão de inconsequências e de desmandos, nós não conseguimos, nesses últimos dois anos, ter uma estruturação do conselho da criança, alinhada com os requerimentos da política administrativa”.

Edição: Davi Oliveira