Isabela Vieira
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro- Com cerca de 100 anos de atraso, a energia elétrica chegou, a partir de hoje (8), para parte dos moradores da comunidade quilombola da Ilha da Marambaia, na Baía de Sepetiba. Como o sistema inaugurado só foi instalado nas casas mais antigas, ficaram fora as famílias constituídas pelos jovens, que não são reconhecidos como novos núcleos pela Marinha, administradora da ilha.
Acessível somente pelo mar, a comunidade de descendentes de escravos tem cerca de 270 famílias, das quais 95 foram contempladas pelo Programa Luz para Todos, do Ministério de Minas e Energia.
Apesar de comemorar a possibilidade de retirar da sede do órgão militar os freezers que eram usados para o pescado, os moradores querem que sistema funcione para todos.
"Eu vou querer instalar uma geladeira, um rádio e uma televisão. Aí, a minha filha vai querer fazer isso na casa dela e meu filho também. Não sei como vai ficar porque, com certeza, o relógio [monofásico] não vai aguentar", reclamou a representante da associação de moradores, Vânia Guerra. Ela divide uma casa, com dois "puxadinhos", com os filhos.
Até a chegada da eletrificação, a comunidade era abastecida por um gerador a óleo da Marinha. Sem geladeira em casa, ferro elétrico e computador, a energia era suficiente para assistir à televisão e ligar um rádio. Mas só até as 22h para quem não tinha aparelhos funcionando a bateria ou com minigeradores. Para carregar o celular, era preciso caminhar cerca de 1 quilômetro até o quartel.
Apesar da certificação da Fundação Palmares e do Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra), o Quilombo de Marambaia trava uma disputa pela regularização de 1,6 mil hectares dos 8,1 mil hectares da ilha com a Marinha. Os militares querem instalar uma base de submarinos no local e recorreram à Justiça para expulsar os quilombolas, além de impedir reforma nas casas.
Para intermediar a relação enquanto não sai a decisão judicial, a Secretaria de Políticas de Igualdade Racial (Seppir) investe em programas como a eletrificação, disse a secretária de Comunidades Tradicionais, Ivonete Carvalho. "De um lado, temos os quilombolas e, de outro, a Marinha. Respeitamos todos os argumentos, sem deixar a comunidade de lado."
A regularização fundiária de comunidades quilombolas está prevista na Constituição Federal. Porém, como o caso envolve divergências com órgão do próprio governo, passa por uma reavaliação na Câmara de Conciliação da Advocacia-Geral da União, sem prazo final.
A eletrificação em Marambaia custou R$ 10,5 milhões e foi possível com investimento dos governos federal e estadual, em parceria com a Ampla, concessionária de energia. O sistema levou cerca de três anos para ser implantando e teve um alto custo porque precisou de 9 quilômetros de cabos submarinos.
Edição: João Carlos Rodrigues