Desmond Tutu vai deixar a vida pública

07/10/2010 - 5h53

Eduardo Castro
Correspondente da EBC na África

Maputo – O arcebispo sul-africano Desmond Tutu - a "consciência antiapartheid" - completa hoje (7) 79 anos e diz que pretende abrir espaço para que surjam novas lideranças na busca da paz.

Tutu está aposentado das funções religiosas há 14 anos, mas nunca deixou de envolver-se em negociações para a solução de conflitos. Em julho, anunciou que passaria a ter uma agenda mais leve.

Ordenado em 1960, fez da sua igreja, no bairro negro de Soweto, um local de encontros e discussões da resistência ao regime. Com menos de 30 anos, ele já era um dos mais abertos críticos da política racista. Pregava a resistência nas comunidades negras carentes, mas sempre pacificamente, como secretário-geral do Conselho das Igrejas da África do Sul.
        
Em 1984, recebeu o Prêmio Nobel da Paz. Dois anos depois, tornou-se o primeiro arcebispo anglicano negro da Cidade do Cabo. Logo depois do fim do apartheid, em 1995, presidiu a Comissão da Verdade e Reconciliação, que investigou crimes cometidos durante o regime racista.

Herói na África do Sul e em todo o continente, é dele a expressão rainbow nation (nação arco-íris), usada para designar a diversidade do povo do país, que por tanto anos foi negada pelos seus líderes.

Tutu também fez campanhas de esclarecimento sobre o vírus HIV e a aids, além da homofobia e do racismo em geral. Em várias ocasiões, defendeu a causa palestina no Oriente Médio, o fim dos conflitos na Faixa de Gaza e comparou o sionismo ao apartheid. Israel não permitia a entrada dele no país até 2008.
        
“Vamos sentir falta do seu senso de humor, mesmo ao tratar das questões políticas mais delicadas”, disse Brian Sokutu, porta-voz da Comissão Nacional Sul-Africana, partido do presidente Jacob Zuma e de Nelson Mandela. “Verdadeiro com o seu caráter, Tutu nunca calou sua voz ao defender as campanhas para acabar com o regime do apartheid”.

Nos últimos anos, o arcebispo dirigiu palavras duras ao partido, criticando, inclusive, a escolha de Zuma para suceder Thabo Mbeki em 2008. Ele também mostrou-se irritado com o descontrole da corrupção e a má qualidade do serviço público no país.
        
Sua última aparição pública na arena internacional foi na cerimônia de abertura da Copa do Mundo da África do Sul, em julho. Com uma camiseta da seleção do país, gorro verde-amarelo e cachecol dos Bafana Bafana, fez um discurso bem-humorado e mostrou sua conhecida e sonora gargalhada ao mundo mais uma vez. Também pediu aplausos para Nelson Mandela.

Tutu celebra seu aniversário com a esposa Leah a bordo de um navio de estudos, o September At Sea, ancorado justamente na Cidade do Cabo, de onde parte no dia 8 para as Ilhas Maurício. De lá, irá ainda para a Índia, o Vietnã, Japão e Havai, antes de chegar a San Diego, nos Estados Unidos, em dezembro.

Em um comunicado, o encarregado do Escritório Desmond Tutu pela Paz, Dan Vaughan, afirmou que a intenção do arcebispo é completar a agenda que já estava marcada antes da decisão de retirar-se. “O sr. Tutu fará o que antes não tinha condições, como, por exemplo, interagir mais com estudantes. Mas ele também quer ler bastante.”

Edição: Graça Adjuto