Financiamento restringe diversidade cultural, admite ministério

28/09/2006 - 16h28

Alessandra Bastos
Repórter da Agência Brasil
Brasília - A isenção de impostos para empresas é responsável por nove em cada dez reais aplicados pelo governo federal para financiar a cultura. O dado do Ministério da Cultura mostra a dependência que a produção cultural brasileira tem da Lei Rouanet, que isenta de impostos as empresas que financiam eventos culturais.O problema é que há “uma série de áreas que não despertam interesse das empresas”, admite Juca Ferreira, ministro interino da Cultura. Ferreira acredita que é um desafio para o próximo governante tomar as rédeas do financiamento cultural, já que hoje é a a iniciativa privada quem define a maior parte dos investimentos.O ministro considera que as empresas “querem ter retorno de imagem na clientela dos seus produtos, parcelas que tenham o mínimo de poder aquisitivo”. “Você não pode permitir que o Estado confunda cidadão com consumidor. Todo cidadão tem direito a acesso a cultura e isso só é possível quando você disponibiliza recursos orçamentários do Estado”, considera Juca Ferreira. Juca Ferreira considera que produções populares ou de música erudita têm dificuldade de acesso a recursos de empresas privadas. “Você acaba deixando de fora uma parte considerável da produção cultural brasileira”, destaca.A vinda do canadense Circo du Soleil custou R$ 9 milhões aos cofres públicos brasileiros, mais do que o total gasto pelo Ministério no ano passado com intercâmbios (R$ 8 milhões), capacitação (6 milhões) ou com contribuições a organismos (R$ 0,5 milhão).O ministro interino afirma que esta foi uma brecha da Lei Rouanet que “teve de ser respeitada”, mas que o problema já foi resolvido. “A Lei prevê financiamento sem associar a um retorno social. Se a Lei não é boa, temos que mudá-la e não transgredi-la. Infelizmente, achamos errado”, conta.Segundo Juca, um mês depois de ter sido aprovado o Circo de Soleil saiu um decreto. O Soleil ficou pra história, chamou atenção de que recurso público para ser aplicado tem que ter retorno social”. Agora, pelo decreto, todo projeto cultural que seja realizado com recurso público tem que garantir um plano de acessibilidade, ou seja, quantas pessoas a mais foram beneficiadas a partir do financiamento.“Temos adotado como mecanismo o concurso público que permite a produção independente da região do país. Todos os lugares concorrem. O Centro-Sul tinha um privilégio de acesso a recursos totalmente desproporcionais em relação à sua demografia”, diz Juca Ferreira. “Queremos que todas as regiões tenham acesso proporcionais. E queremos evoluir em relação à justiça na distribuição, mas temos consciência que não chegamos ainda ao ideal”, admite.Isaura Botelho, da Fundação Memorial da América Latina, defende o investidor “pessoa física” como solução para projetos de menor visibilidade já que “a escolha do indivíduo é por aquilo que lhe é mais próximo, com o qual mais se identifica e por projetos extremamente relevantes para grupos ou comunidades específicas. É a fatia que falta conquistar e que pode garantir a diversidade”, afirma Isaura Botelho.Geraldo Moraes, diretor do Congresso Brasileiro de Cinema (CBC) tem a mesma opinião. “O Brasil inteiro busca o patrocínio da Petrobras. É preciso diversificar os investidores. A pessoa física pode ajudar na produção de curtas-metragens, filmes de animação, obras mais baratas”. Em 2005, cerca de três mil pessoas investiram na cultura. Sobre a porcentagem que significaram no investimento total por isenção fiscal, o ministro interino brinca: “Significou que é insignificante”, diz.Na visão do Ministério, é necessária uma campanha de mobilização e esclarecimento “de que a pessoa pode destinar uma parte do imposto devido a uma atividade ou setor cultural. Está sendo pensada, mas exige recursos”, explica Juca Ferreira. Este é um dos desafios para os próximos quatro anos já que “tem um potencial de crescimento enorme principalmente se a gente disponibilizar um banco de projetos para que a pessoa consulte e escolha para onde direcionar sua contribuição”, diz.