Teoria sobre gestão internacional de bens pode dar base à interferência na Amazônia, diz diplomata

07/04/2005 - 17h35

Spensy Pimentel
Repórter da Agência Brasil

Brasília – Uma doutrina que se vem estabelecendo em círculos de debate internacionais sobre a existência de "bens públicos comuns", como água potável e recursos florestais, a serem gerenciados pela "comunidade internacional" e não pelos países onde elas se localizam, pode ser o embrião de futuras ingerências estrangeiras na Amazônia, avalia o secretário executivo do Ministério das Relações Exteriores, Samuel Pinheiro Guimarães.

"Hoje, para que haja o benefício da ocupação, não é necessária a presença física", disse hoje Guimarães, em referência à Amazônia, no debate "A Internacionalização da Amazônia: Risco Real ou Temor Infundado", promovido pelo Senado. "Eu não diria que há uma ameaça de internacionalização da Amazônia, mas confesso que acho interessante que haja essa permanente preocupação".

O diplomata explicou que se trata de idéias ainda debatidas em seminários, embora possam ser propagadas para "círculos cada vez mais amplos". E fez a ressalva de que a principal preocupação brasileira deve ser a de administrar adequadamente a região. "É na medida em que o Estado soberano administra os recursos naturais da região amazônica que toda e qualquer ameaça se reduz na mesma proporção".

No início deste ano, o Itamaraty divulgou nota em resposta a declarações do ex-comissário da União Européia para o Comércio, Pascal Lamy. Segundo Guimarães, em um debate da Comissão Econômica para a Europa, em Genebra, sobre "governança global", Lamy, que hoje é candidato à diretoria-geral da Organização Mundial do Comércio, declarou-se favorável a "regras internacionais para bens públicos comuns" como as florestas tropicais (sem se referir especificamente à Amazônia), a água, a pesca e a camada de ozônio. A conveniência de se emitir essa nota foi questionada pelos senadores. Guimarães respondeu que não se tratou de uma declaração "exagerada", senão "firme", e que se destinava a reafirmar que "o Brasil tem competência para administrar o seu território".

O senador Cristóvam Buarque (PT-DF) relatou ter conversado com Lamy há pouco tempo sobre o tema. Segundo Buarque, Lamy explicou a ele que apenas se referiu ao estabelecimento de "regras internacionais" para o uso de recursos naturais e que não quis se referir ao Brasil ou à Amazônia especificamente.

O debate teve a presença de especialistas e autoridades convidados pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. A proposta para a realização da audiência foi do senador Jefferson Peres (PDT-AM). Além de Guimarães, estiveram presentes na mesa o secretário de Política, Estratégia e Assuntos Internacionais do Ministério da Defesa, almirante-de-esquadra Miguel Ângelo Davena, o consultor das Nações Unidas para o Desenvolvimento da Amazônia Armando Mendes e o cientista político Clóvis Brigagão, da Universidade Cândido Mendes.

A inspiração para a realização da audiência, segundo os senadores, veio de repetidas indagações de cidadãos sobre uma mensagem eletrônica que circula pela internet há alguns anos com a foto de um suposto mapa usado em escolas americanas. A carta mostra o território brasileiro separado da região amazônica, considerada área de domínio internacional. Os especialistas presentes foram unânimes em dizer que se trata de uma fraude.