Brasília, 28/10/2002 (Agência Brasil - ABr) - Pedido de vista interrompe na 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) o julgamento do recurso do Banco Central do Brasil (BC) contra sua condenação ao pagamento de indenização à PEBB Corretora de Valores Ltda. pelos "supostos prejuízos" decorrentes da sua omissão em fiscalizar a Coroa S/A – Crédito, Financiamento e Investimento. O ministro Paulo Medina pediu vista do processo, após a conclusão apresentada pela ministra Laurita Vaz, acompanhando o entendimento dos demais ministros que já se manifestaram sobre o caso. O que está em discussão é se o direito de o BC propor ação para anular decisão transitada em julgado que lhe foi desfavorável está extinto ou não.
O julgamento foi retomado após o pedido de vista de Laurita Vaz, em seguida ao ministro Franciulli Netto ter acompanhado o entendimento do relator, ministro Peçanha Martins, afastando a decadência (extinção de um direito pela decorrência do prazo legal para o seu exercício) e determinando o retorno da questão ao Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região para o julgamento da ação rescisória (meio processual para anular decisão já transitada em julgado) de modo a invalidar a condenação.
A questão começou a ser discutida em uma ação da PEBB buscando que fosse reconhecida a responsabilidade do Banco Central devido à ausência ou má fiscalização pela autarquia e seus representantes sobre a atuação da Coroa CFI como entidade do sistema financeiro até 1983 e por não ter encerrado em tempo a liquidação extrajudicial da empresa.
Em primeira instância, o BC foi condenado a pagar os valores nominais dos investimentos apurados na perícia contábil, devidamente corrigidos a partir do vencimento das letras de câmbio, excluindo-se os lucros cessantes.
Tanto a autarquia como a corretora apelaram, mas a decisão foi confirmada pelo TRF. De novo ambos recorreram: o processo da PEBB chegou a ser apreciado, mas foi improvido; os do BC não obtiveram êxito. A decisão, então, continuou a mesma: concediam-se os danos emergentes, mas negavam-se os lucros cessantes.
Os advogados do Banco Central, entendendo que se esgotaram todos os prazos para recurso em agosto de 1994, entraram com uma ação rescisória (meio processual para anular decisão já transitada em julgado) em junho de 1996. Tal ação foi extinta porque, de acordo com o TRF, teria ocorrido a decadência ou caducidade, que acaba sendo a perda do próprio direito material em razão do decurso do tempo, importando o desaparecimento de um direito por não ter sido exercido dentro do prazo legal.
Segundo o acórdão, o trânsito em julgado em relação ao BC teria ocorrido em fevereiro de 1994, quando o recurso especial da autarquia não foi admitido, sendo possível haver trânsito em julgado de apenas parte da sentença, desde que não haja correlação dos capítulos anulatórios entre si. O BC argumenta que, se o recurso interposto pela PEBB estava pendente de julgamento, ainda não havia trânsito em julgado, pois o Código não faz distinção sobre de quem é o recurso: se do autor ou do réu. Esse o motivo do recurso especial ao STJ.
Tanto Peçanha Martins como Franciulli Netto entenderam que a decadência só ocorre após o trânsito em julgado da última decisão tomada no processo e, por isso, a ação rescisória da autarquia teria sido interposta dentro do prazo legal e perante juízo competente. Ainda que se considere ter um determinado tema se tornado absolutamente imutável durante o caminhar do processo, seria desnecessário afirmar que o prazo para ajuizar esse tipo de ação a ele referente estaria suspenso, destaca Franciulli Netto.
Antes de proferir seu voto, a ministra Laurita Vaz fez um histórico sobre o caso. Destacou que o BC ajuizou medida cautelar buscando suspender a execução, pois já havia sido determinado o precatório. Foi concedida liminar em dezembro de 1998, e a PEBB impetrou mandado de segurança no STJ contra essa decisão. O ministro Pádua Ribeiro, à época presidente do STJ, concedeu liminar à corretora, determinando que fosse depositado o valor correspondente a aproximadamente R$ 200 milhões na Caixa Econômica Federal (CEF), à disposição do STJ até o julgamento definitivo do mandado de segurança. O BC tentou suspender a segurança no Supremo Tribunal Federal (STF), mas o pedido foi indeferido pelo ministro Celso de Mello. Em meio a essa batalha judicial é que o BC impetrou o recurso especial que se encontra em análise. A ministra ressaltou que é a primeira vez que se tem notícia que essa questão está sendo apreciada por uma das Turmas da Segunda Seção do STJ.
Para a ministra, a tese da corretora tem um certo raciocínio lógico. De outro lado, o relator Peçanha Martins destacando a interpretação e o alcance dos institutos jurídicos, expõe a idéia de que não há que se confundir preclusão ou coisa formal com coisa julgada material, pois esta sobrevem apenas ao final do processo, após a última decisão irrecorrível. Laurita Vaz acompanhou o entendimento dos demais ministros, considerando que não há qualquer dúvida quanto à possibilidade de em um único processo haver um acúmulo de pedidos, o que ocorre por economia processual. Assim, da mesma forma, pode haver no curso desse processo, soluções distintas e independentes para pedidos distintos e independentes.
Partindo de questões independentes entre si, acrescenta a ministra, pode haver decisões finais em momentos processuais distintos, com a possibilidade sim da formação da coisa julgada formal apenas de parte da sentença ou acórdão. Isso quando não houver mais a possibilidade de modificação da decisão tornada pois intangível no respectivo processo observadas as ressalvas quanto às diferentes formas de conhecimento das questões dos recursos interpostos nas instâncias ordinárias e extraordinárias. "De outro lado ressalte-se a coisa julgada material – que se caracteriza pelo reflexo dos efeitos da decisão de mérito dos efeitos da decisão de mérito para fora do processo respectivo – só pode haver como pressuposto para o ajuizamento da ação rescisória depois de esgotados todos os recursos independentemente da questão envolvida nele", afirma.
A conclusão sobre o caso se dará após o último voto, o do ministro Paulo Medina, uma vez que apenas quatro dos cinco ministros que compõem a Turma participam do julgamento. A ministra Eliana Calmon, presidente da 1ª Turma, está impedida em razão de ter participado do julgamento do caso quando integrava o Tribunal Regional Federal da Primeira Região (DF).