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Brasil, um país de muitas línguas

Criado em 16/11/16 10h22 e atualizado em 16/11/16 10h38
Por Plenarinho [2]

Você conhece a história da Torre de Babel? Segundo essa passagem bíblica, no começo da história da humanidade, todos os homens da Terra falavam a mesma língua. Até o dia em que resolveram construir uma enorme torre - tão, tão grande, que chegasse ao céu. Durante a construção da torre, os homens começaram a falar línguas diferentes e pararam de se entender. O resultado foi que a torre ficou inacabada por causa da dificuldade de comunicação entre eles. E o que essa história tem a ver com o Brasil?

Aqui na nossa terrinha, também se falam várias línguas. Tantas que talvez você nem imagine! Hoje, são mais de 200 línguas no Brasil. Parece a história da Torre de Babel, com uma diferença: aqui as pessoas se entendem. E, com todas as variedades, permanecemos unidos pelo fato de sermos todos brasileiros. Cada um com sua história.

O nosso país é o resultado da mistura (algumas vezes pacífica, muitas vezes não) de espanhóis, franceses, alemães, holandeses, italianos, árabes, japoneses... Não podemos nos esquecer dos índios, habitantes originais desta terra. E eles não são apenas um povo. São guaranis, ianomamis, xucurus, baniwas, tikuna... Ah, e existem também os africanos bantos, nagôs, gêges (ou ewes)... Seria muito difícil que todos esses povos que se misturaram para formar o povo brasileiro falassem apenas o português, certo?

Línguas, dialetos, sotaques

Para se comunicar, o ser humano precisa de uma linguagem. A língua, meio usado para a comunicação, é um sistema de símbolos usados por pessoas de uma mesma comunidade. Você certamente conhece ou já ouviu falar de algumas línguas como o Inglês, o Espanhol, o Alemão, o Italiano, o Francês...

A língua de um povo é o que caracteriza de forma mais profunda a sua identidade. Por meio da língua, é possível conhecer sua história, sua forma de falar e de sentir o mundo. A língua também permite a transmissão de conhecimento, arte e cultura.

Aryon Rodrigues, professor de Letras da Universidade de Brasília, explicou ao Plenarinho que “a língua materna (a primeira língua que a criança aprende, geralmente ensinada pela mãe) é aquela por meio da qual cada pessoa se humaniza e socializa, adquirindo a experiência das gerações anteriores e aprendendo a viver e sobreviver em sociedade”. 

Para um povo, é a língua que garante a solidariedade interna, a capacidade de equilíbrio e de desenvolvimento econômico, material e intelectual e as condições de relacionar-se e competir com outros povos em pé de igualdade.

Você já deve ter percebido que em um único país, há diferenças na mesma língua. São palavras e expressões variadas. Quando essas diferenças não impedem a comunicação, elas são chamadas de dialeto. Assim, a língua falada pelos que vivem no Rio de Janeiro é um dialeto, como é um dialeto a língua dos que vivem em Porto Alegre e assim com praticamente todas as outras comunidades de falantes de português no Brasil. Cada uma dessas comunidades fala português, mas seu português é um pouco diferente do português falado nas outras comunidades.

Quando as diferenças impedem ou dificultam consideravelmente a compreensão, então estamos falando de línguas diferentes. Por exemplo, o português e o alemão. Eles são tão, tão diferentes, que, se um brasileiro que nunca estudou alemão for para a Alemanha, vai ficar perdidinho. Um alemão também não vai entender o português sem estudar a nossa língua.

Ah! E aquela diferença no jeitinho de falar?! "Porrrta", "oitennnta", "paixtel" (pastel), "pãozin de quej" (pãozinho de queijo)... São os sotaques - características de pronúncia de um dialeto (variedade regional ou social de uma língua), percebidas por falantes de outro dialeto.

Viva a diversidade

O Brasil é o país com o oitavo maior número de línguas em uso!!! A maioria delas é das comunidades indígenas: 180! Você acha muito? É realmente muita coisa, mas, na época do Descobrimento, havia muito mais. Eram 1.078. Já pensou? Mas olha só, naquela época também existiam mais índios. Quando os portugueses chegaram, eles eram cinco milhões. Hoje são apenas 734 mil indígenas.

Em 1550, há um tempão, chegaram muitos negros vindos da África. Eles não vieram por vontade própria, chegaram como escravos, trazidos à força. A escravidão aconteceu até o ano de 1850, quando foi decretada a Lei Áurea pela princesa Isabel. Enquanto foi permitida, a escravidão trouxe para cá aproximadamente 3 milhões de africanos, muitas culturas e línguas.

Ah! Não podemos esquecer de outras línguas como italiano, alemão e japonês. Elas chegaram no Brasil com os imigrantes, que vieram buscar aqui a oportunidade de uma vida melhor. Esses povos chegaram em maior número no Brasil, a partir do ano de 1800. Mas antes disso, já estavam por aqui portugueses, espanhóis e holandeses.

Somou isso tudo? O resultado é um povo diverso, que fala, entre tantas outras línguas, o Nheengatu, o Hunsruckisch e a Gira da Tabatinga. O Zé Plenarinho, que adora estudar línguas, convida você para conhecer um pouco da história dessas três línguas!

Lá em São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, vive o povo indígena Baniwa. A primeira língua que um indiozinho de lá aprende a falar é o Nheengatu. Essa língua tem uma história muito interessante. Os missionários da igreja, na época da colonização, responsáveis por catequizar os índios, esforçaram-se para criar uma única língua indígena para todos os povos. A ideia dos missionários era facilitar a comunicação. Foi assim que surgiu o Nheengatu. Hoje, cerca de duas mil pessoas falam essa língua no Brasil.

Quer conhecer outra língua falada no Brasil?! Pois o Hunsruckisch (que nome difícil!!) é falado por parte da população do Rio Grande do Sul. Essa língua é uma mistura de Alemão e Português. E é resultado da chegada dos alemães na região, em 1924.

A Gira da Tabatinga, língua dos filhos, netos e bisnetos de escravos, ainda é falada no nosso país. Ela foi passada de pai para filho e é uma importante forma de resistência da cultura africana.

As línguas não podem morrer

Para que as línguas existam, elas precisam ser faladas. Mas os números de hoje não são nada otimistas: a cada duas semanas, uma língua morre no mundo! E pior: segundo dados divulgados pelo professor de Linguística da Universidade de Roma, Renato Coretti, durante o 87º Congresso Mundial de Esperanto, realizado no Brasil em 2002, cerca de 90% das 6 mil línguas que existem hoje não serão mais faladas nos próximos 100 anos.

Na África, 600 das 1.400 línguas estão ameaçadas de desaparecer em razão da pressão das grandes línguas. Na Austrália apenas 20 línguas sobrevivem ao lado das 250 línguas faladas até o final do século XVIII (de 1701 a 1800). Em muitos países da América do Sul, os governos esperam que os 275 idiomas não-oficiais desaparecerão antes que se tornem idiomas de ensino oficiais. Hoje, no Brasil uma longa lista de idiomas indígenas e africanos não são mais falados. É o caso de perguntar: será que em breve línguas como a Tikuna, o Guarani, o Kayapó e o Xavante também não serão mais ouvidas?“

Esse montão de línguas é uma riqueza, um verdadeiro patrimônio. Para continuar existindo, elas precisam ser faladas e ensinadas.

E aí, os governos têm de entrar em ação com políticas de valorização. As escolas das cidades onde vivem os usuários devem ensinar as línguas que o povo da região fala. As pessoas também precisam ter liberdade para utilizar suas línguas maternas sem correr risco de “tomar uma bronca”, como já aconteceu em outras épocas no Brasil.

Vários governos brasileiros não deram importância à diversidade de línguas do Brasil e tentaram implantar aqui uma só língua, o português, ignorando milhares de falantes e reprimindo a manifestação de várias pessoas. O primeiro que agiu assim foi Marquês de Pombal, que governou o Brasil de 1750 a 1777. Pombal queria que o Brasil tivesse apenas uma língua e proibiu que outras fossem faladas. 

Na época da Segunda Guerra Mundial, durante o governo de Getúlio Vargas (1937-1945), várias línguas também foram proibidas: o Talian (língua de origem italiana), o Pomerano (língua parecida com o alemão, falada num país chamado Pomerânia) e o Hunsruckisch (aquela língua que mistura o Português com Alemão, lembra?). Tudo porque o Brasil era inimigo na guerra de alemães e italianos.

O governo militar (1964-1985) proibiu a transmissão radiofônica em línguas indígenas e estimulou programas educacionais voltados para o uso da língua portuguesa, substituindo a indígena. Só pela Constituição de 1988 foram reconhecidos os direitos lingüísticos dos povos indígenas, inclusive o direito de ter programas de educação em suas próprias línguas.

Curiosidades

Quer ver como o Português é uma língua rica, resultado da contribuição e mistura de vários povos? Lá vai o desafio: de onde vêm as palavras “cutucar”, “bagunça” e “cochilar”?

Nosso professor Edu Coruja tem a resposta: “Cutucar” vem da palavra kutúk, que em Tupinambá (uma língua indígena) significa tocar com objeto pontudo, ferir. 

E “bagunça”? Mesmo não sabendo de onde vem, com certeza você sabe como fazer, não é? Pois fique sabendo que “bagunça” vem da palavra bulungunza, que em Quicongo (língua africana) é nada mais, nada menos que desordem, confusão. E “cochilar” também vem do Quicongo: kushila quer dizer dormir levemente.

Na escola, muitas vezes inventamos algumas línguas diferentes. Talvez você já tenha experimentado se comunicar com seus colegas por meio de algum código secreto, como a Língua do P ou a Língua do I, por exemplo.  

Creative Commons - CC BY 3.0

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