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Boko Haram: entenda a trajetória do grupo terrorista nigeriano

16/01/15 13h38
Leandro Melito

Brasília - Na primeira semana de janeiro o grupo terrorista Boko Haram realizou um ataque que deixou cerca de 2 mil mortos na cidade de Baga, no Nordeste da Nigéria, segundo a Anistia Internacional - número que confronta a versão do exército local de 150 mortes - e foi considerado pelo exército nigeriano o maior ataque já realizado pelo grupo desde 2009.

As ONGs Humans Rights Watch e a Anistia Internacional divulgaram imagens aéreas das duas cidades, datadas de 2 de janeiro, um dia antes do ataque, e de 7 de janeiro, indicando o que a Anistia classificou como uma “devastação de proporções catastróficas”, com mais de 3,7 mil estrutras - 620 em Baga e 3.100 em Doron Baga - atingidas ou completamente destruídas. De acordo com a Human Rights Watch, 11% da cidade de Baga e 57% de Doron Baga foram destruídas, provavelmente devido a incêndio.

Imagens de satélite mostram ataque do Boko Haram na Nigéria, dizem ONGs (Anistia Internacional )

 

Mortos e refugiados

Nos últimos cinco anos, o Boko Haram causou cerca de 13 mil mortos - sendo 10 mil apenas em 2014 -  e 1,5 milhões de refugiados. Nos últimos três meses, mais de 25 mil pessoas entre moradores, deslocados e retornados receberam ajuda do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) que atua em parceria com a Cruz Vermelha local para atender as vítimas do conflito. No ano anterior, 45 mil pessoas precisaram receber ajuda alimentar. Segundo o  CICV, milhares de pessoas que abandonaram suas casas no nordeste da Nigéria buscaram refúgio em Diffa no sudeste do Níger.

Novo patamar

O pesquisador em etnologia da Universidade de Göttingen, na Alemanha, Roman Loimeier considerou em entrevista à agência alemã Deutsche Welle que o grupo terrorista alcançou um novo patamar em suas ações terroristas. “Nós agora entramos em um terceiro estágio do terrorismo do Boko Haram: eles ficaram sob pressão e, de 2013 para cá, começaram a agir contra a população civil muçulmana. Estão fazendo isso para amedrontá-la e forçá-la a não colaborar com as autoridades”.

Origem

O Boko Haram foi criado em 2002 pelo clérigo muçulmano Mohammed Yusuf como uma oposição à educação ocidental com o nome de Jama'atu Ahlis Sunna Lidda'awati wal-Jihad, que significa "pessoas comprometidas com a propagação dos ensinamentos do Profeta e Jihad".

No incício, o grupo consistia em  um complexo religioso, que incluiu uma mesquita e uma escola islâmica em Maiduguri, nordeste da Nigéria.

Estado islâmico

Com o alto custo da educação no país e a resistência ao ensino ocidental na região, muitas famílias muçulmanas pobres de toda a Nigéria e de países vizinhos, matricularam seus filhos na escola. O termo "Boko Haram" significa "educação ocidental é proibida" em tradução livre. O apelido foi criado pelos moradores da região onde se localiza a escola, que promove uma versão do Islã que torna proibido (haram) para os muçulamanos participar de qualquer atividade política ou social relacionada com a sociedade ocidental.

A escola passou a servir como um centro de formação e de recrutamento de jihadistas e atuar politicamente contra as autoridades do norte da Nigéria, “com ataques direcionados a unidades policiais, bloqueios de estradas, instalações militares, instituições governamentais e prisões”, explica Loimeier, que classifica o período de 2003 a 2009 como a primeira fase do terrorismo exercido pelo grupo.

Território

A partir de 2009, o Boko Haram parte para uma estratégia militar focada na conquista de territórios com o objetivo de instaurar um estado islâmico. A estimativa é de que o grupo domine uma área de cerca de 25 mil km² onde vivem cerca de 1,5 milhão de nigerianos. “Aí tivemos uma espécide de guerra. Nesse período, [o grupo armado] também aterrorizou minorias étnicas e religiosas na conquista de territórios”, ressaltou Loimeier. A região Norte do país onde se concentram os ataques é habitada em sua maioria por muçulmanos e 72% vivem na pobreza, enquanto o sul do país é de maioria cristã e registra 27% da população vivendo na pobreza.

Yusuf, o criador do grupo, foi morto sob custódia policial em 2009, seu corpo foi exibido pela rede estatal de televisão da Nigéria e o Boko Haram declarado extinto pelas forças de segurança. Apesar do anúncio de seu término, o grupo se reagrupou em torno de um novo líder, Abubakar Shekau , intensificou sua estratégia terrorista e, a partir de 2013, passou a fazer ataques contra a população civi do país.

 

Ajuda internacional

O exército nigeriano sofreu críticas por ter supostamente saído do local e deixado a cidade entregue aos rebeldes no ataque do início deste ano e se recusar a fazer a contagem dos corpos, o que não permite precisar o número de mortos.  Para Loimeier, o exército nigeriano é o principal entrave para que o país receba ajuda internacional no combate ao Boko Haram. “As potências internacionais já se deram conta de que o exército nigeriano tem um histórico de vender suas armas para o Boko Haram. Isso tem levado a um certo desencanto com a Nigéria, mas, ao mesmo tempo, os norte-americanos, a França e Israel tem seus agentes secretos na região e acompanham de perto o que está acontecendo”.

As ações terroristas do  Boko Haram começaram a cruzar a fronteira com os Camarões e seu líder, Abubakar Shekau, ameaçou o país vizinho em uma mensagem de vídeo, o que levou o presidente camaronês, Paul Byia, a pedir ajuda internacional para combater o grupo. Já o presidente nigeriano, Goodluck Jonathan, criticado por não conseguir controlar a insurreição, emitiu um comunicado condenando os ataques de Paris, apesar de raramente se pronunciar sobre ataques em seu país.

* Com informações da Agência Brasil e Deustche Welle

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