Brasília, 55 anos: conheça os projetos que pensaram a capital do país
Brasília é mundialmente conhecida por abrigar monumentos desenhados por Oscar Niemeyer e ter sido planejada como "a cidade em forma de avião". O projeto, assinado pelo arquiteto e urbanista Lúcio Costa, é reconhecido pela Unesco como Patrimônio Cultural da Humanidade e tem como marca a valorização da alvorada no Planalto Central: as construções valorizam a visão do céu da cidade, sendo possível enxergar o horizonte em praticamente todos os pontos do Plano Piloto. A alvorada traduz o sentimento de "novo tempo" vivido à época do mandato de Juscelino Kubitschek como presidente do Brasil. A cidade ganhou de André Marlaux o título de "Capital da Esperança" e se tornou símbolo do processo de modernização pelo qual o país passava enquanto ocorria sua construção e fundação.
Sete deles foram finalistas da competição. Conheça as propostas que poderiam ter dado origem a uma Brasília diferente da que conhecemos:
5º colocado (1): Milton Ghiraldini e equipe
A proposta pensava em uma zona central para a cidade, que seria composta pelo centro governamental, cultural e comercial, além dos ministérios e embaixadas. Ao redor dessa zona, estariam posicionados quatro retângulos que abrigariam as superquadras, que abandonavam o formato de 100m x 100m e eram de 15 a 20 vezes maiores, com um parque interior que seria sua a espinha dorsal. Os desenhos apresentados pela equipe de Ghiraldini mostravam uma cidade setorizada que deveria abrigar no máximo 200 mil habitantes e organizava os espaços tentando equilibrar três elementos da vida urbana: habitar, trabalhar, recrear.
Entre os comentários do júri, destacou-se que o projeto tinha uma simplificação exagerada das zonas e não apresentava o caráter de uma capital.
5º colocado (2): Vilanova Artigas e equipe
Defendia a ideia de que Brasília deveria ter uma distribuição da população melhor do que a que existia no Rio de Janeiro e região costeira do país, e não deveria se transformar em centro demográfico, comercial, industrial, cultural e turístico, como ocorreu com a capital anterior. Previa que os habitantes da cidade seriam divididos em três populações: a nuclear, de funcionários públicos, civis e militares, a colateral, formada por turistas ou pessoas que estivessem residindo na cidade por temporada. O território seria distribuído em zonas, que concentrariam cada uma atividades diferentes: desde a função administrativa e comercial até as áreas residenciais e verdes.
O júri criticou, neste projeto, a ausência das embaixadas, consulados e centros de rádio e TV, e entre outros pontos considerou que as zonas residenciais eram muito uniformes e que havia má circulação das residências para o centro cívico da cidade e a sede do governo.
5ª colocado (3): Henrique Mindlin e Giancarlo Palanti
O projeto apresentado definia a cidade como uma área imersa em áreas verdes, e o traçado básico da capital foi elaborado conforme se contornava o Lago Paranoá e a localização aproximada das estradas de ferro e rodagem próximas à região do Distrito Federal. Brasília seria organizada em dois eixos principais: de atividades públicas, administrativas e governo; e de vida particular, cruzando-se com o centro comercial e recreativo da cidade.
O júri elogiou a proposta no aspecto de densidade, economia e uso da terra, mas criticou, neste projeto, a segregação por classe das moradias de operários, o agrupamento das embaixadas e dos ministérios, feito em extremidades distintas do plano piloto. A avaliação foi, também, de que as unidades de habitação resultariam disformes quando colocadas em prática.
3º e 4º colocados reunidos: M.M.M. Roberto e equipe
Para o júri, o projeto para construção e financiamento da cidade era prático e realista, e foi considerado o mais completo do concurso em relação ao uso da terra. No entanto, por ter partes separadas, não tinha relações de caráter metropolitano: cada parte possuía vida própria.
3º e 4º colocados reunidos: Rino Levi e equipe
O júri considerou que o projeto tinha boa aparência, mas mas não tinha um centro de transporte, além de apresentar uma altura desnecessária nos edifícios, com uma concentração de pessoas desaconselhável.
2º colocado: Boruch Milman e equipe
O projeto apresentado por Milman e sua equipe defendia a ideia de que a nova administração governamental deveria ser alojada em uma pequena cidade. Para tanto, a proposta definia que o plano piloto seria a conciliação de uma cidade governamental de crescimento controlado com outro local de crescimento ilimitado, flexibilizado em satélites urbanos, já dando sinal para a característica metropolitana que Brasília provavelmente teria.
Para o júri, a proposta trazia uma localização muito atraente para as habitações na península. No entanto, considerou-se que as áreas adequadas, pelo projeto, para uma população de 750 mil pessoas não poderiam ser desenvolvidas com facilidade ao infinito. Não havia, também, utilização das áreas mais elevadas do terreno, e havia muitas vias sem desenvolvimento em suas periferias, fator que encareceria o desenvolvimento.
1º colocado: Lucio Costa
Enquanto alguns projetos foram entregues à comissão julgadora com diversos desenhos detalhados e mais de 200 páginas explicativas, a proposta de Lúcio Costa foi apresentada apenas com um plano piloto desenhado à mão e um relatório justificativo de 24 páginas, o mínimo exigido pela organização. Na proposta, a cidade era organizada pelo cruzamento de dois eixos, um deles arqueado para o escoamento das águas, resultando assim na forma de avião que se conhece. Ao longo do eixo reto, foram ordenados os setores de administração governamental; e no eixo arqueado, a região residencial, por onde passa uma malha rodoviária constituída de pistas de alta velocidade e pistas laterais para o tráfego local.
O plano previa que o centro governamental e o plano piloto estariam totalmente construídos em 10 anos. O tamanho da cidade seria limitado: após 20 anos, seu crescimento se daria pelas penínsulas e em cidades satélites. Problemas que são observados hoje pelos moradores do Distrito Federal, com a dificuldade de eslocamento e alagamentos em época de chuva, acontecem, segundo Milton Braga, não "por causa" do projeto de Lucio Costa, mas "apesar" do projeto de Lucio Costa. Para ele, alguns aspectos como o crescimento da cidade não foram tão bem considerados quanto deviam, mas o projeto aponta o desenvolvimento de Brasília em um organismo metropolitano, compsoto por cidades satélites. "Isso (o crescimento pelas satélites) se fez, mas se fez muito mal, e não é por causa do projeto dele, é pela ausência de ouros projetos, de uma capacidade de planejar esse desenvolvimento", argumenta.
Adaptações vêm sendo feitas na capital, desde a sua fundação, para acompanhar o ritmo de desenvolvimento urbano comum a todas as cidades. Por isso, alguns aspectos do projeto de Lucio Costa, como a setorização do território de acordo com atividades comercial, hoteleira, etc, vem ganhando novos contornos. "Cada vez mais a vida urbana mistura as atvidades, a gente trabalha e mora muitas vezes ano mesmo lugar. A evolução foi na contramão do funcionalismo urbano, que foi uma grande esperança de tornar a cidade mais saudável, eficiente, mas não deu certo", explica Braga.
A Brasília construída não foi exatamente igual àquela apresentada no concurso: segundo Milton Braga, o projeto implantado é mais moderno, porque vários arquitetos depois trabalharam no desenvolvimento do plano piloto. O projeto de Lucio Costa, na opinião do arquiteto, favorece um futuro otimista para Brasília. "Esse futuro vai ser tanto melhor quanto melhor a gente souber transformá-lo, o que não é uma coisa fácil. é importante não descaracterizar a essência (da cidade) é fundamental, até porque ela é tombada, mas também não deixar de transformá-la quando for necessário porque a vida não para, a cidade é sempre inacabada. Essa simplicidade de organização essencial é a chave para que ela possa se transformar sem perder o seu DNA", conta.