Pedro Peduzzi
Repórter da Agência Brasil
Brasília – A Justiça Federal rejeitou os pedidos feitos pelo Ministério Público Federal (MPF) para que a empresa Norte Energia, responsável pelas obras e operação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, fosse obrigada a concluir no prazo de 60 dias o cadastro socioeconômico dos moradores que seriam afetados pelo empreendimento e para concluir em 120 dias o processo de regularização fundiária. Na sentença emitida pela 9ª Vara Federal do Pará, o juiz federal Arthur Pinheiro Chaves considerou improcedente o pedido que tentava proibir a empresa de ingressar sem autorização nas casas dos moradores. O MPF antecipou à Agência Brasil que vai recorrer da decisão.
Em relação à regularização fundiária na região da Volta Grande do Xingu, cujo prazo solicitado pelo MPF seria de até 120 dias seguindo os moldes do Programa Terra Legal, o juiz argumentou que, ao contrário do que foi dito pelo MPF, o Ministério do Desenvolvimento Agrário está tomando providências para implementar o programa na região de influência da obra da Usina de Belo Monte, não se podendo afirmar que o Poder Público tem sido abusivamente omisso em relação ao assunto.
Ainda segundo o juiz, o prazo apresentado para a conclusão dos trabalhos é muito restrito, diante da complexidade e a extensão da tarefa – sob a responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento Agrário, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), entre outros. Além disso, diz Chaves, um prazo maior, como o defendido pela União, é mais razoável devido às limitações de ordem material e humana e à necessidade de minucioso levantamento em área de grande extensão, para a identificação de todas as formas de ocupação existentes na área.
Nota publicada pela 9ª Vara informa que o magistrado entendeu que, em relação à conclusão do cadastro socioeconômico no prazo de 60 dias, o caráter de urgência “não tem amparo legal e nem está justificada na documentação anexada ao processo pelo MPF, uma vez que não se tem notícia de que algum morador da Volta Grande do Xingu já tenha sofrido efeitos adversos decorrentes da construção da hidrelétrica”.
Segundo o juiz, tendo por base trechos da ata de uma reunião ocorrida em julho de 2011, há apenas relatos acerca de contratempos causados pela ação das empresas contratadas pela Norte Energia. “A afirmação de que a demora na finalização do cadastramento das famílias estaria violando o princípio da dignidade da pessoa humana, em face da incerteza gerada na população, não tem o condão de, por si só, à míngua de fatos concretos e legislação específica, determinar a urgência requerida”. Além disso, acrescentou o juiz, em toda a tramitação não ficou “caracterizada” a existência de condutas de cunho ilegal ou abusivo por parte da Norte Energia.
Contatado pela Agência Brasil, o procurador da República no Pará, Ubiratan Cazetta, disse que o MPF vai recorrer da sentença no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília (DF). “Ainda não recebemos o processo, mas sabemos da decisão. Com certeza vamos recorrer, por entendermos que há uma diferença de percepção dos fatos. A sentença disse que algo está sendo feito, mas entendemos que, pela dimensão do problema, não se pode ficar postergando isso para momento mais próximo da formação do lago ou da entrada em operação da usina”, disse o procurador do MPF.
Cazetta argumenta que, se for levada em consideração a história do Brasil em situações similares envolvendo empreendimentos hidrelétricos, vê-se que é comum atrasos na aplicação de mecanismos de indenização e compensação a grupos de pessoas atingidas por eles.
"Nossa preocupação tem base em fatos. Veja o caso de Tucuruí: até 2005 havia um grande volume de pessoas dizendo não terem sido indenizadas. Há portanto um grande risco de compensações não serem feitas”, argumentou o procurador. “No caso de Belo Monte, envolvem questões colocadas na licença prévia em 2010, retificadas em 2011. No que diz respeito às condicionantes, não se vê a mesma prioridade que se vê nas obras de engenharia”.
Outro ponto que preocupa o MPF é a diferença de critérios para a definição de indenizações e compensações e a falta de transparência no processo. “Entendemos que isso seja algo complexo, como disse o juiz, mas discordamos da diferença de critérios. Queremos que eles sejam equânimes; justos, e que reflitam um mesmo tratamento para as pessoas. Além disso, não se pode transformar esse processo de indenização e regularização em uma caixa-preta, sob a argumentação de estar protegendo a privacidade das pessoas”.
A Agência Brasil entrou em contato com a Norte Energia, mas até o fechamento da matéria não obteve retorno com a posição da empresa sobre a decisão da Justiça e sobre as manifestações do MPF.
Edição: Fábio Massalli
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