Principal preocupação é preparar adolescente para reinserção social, conta professor de unidade de internação

15/10/2013 - 8h31

Yara Aquino
Repórter da Agência Brasil

Brasília - Policiais na porta da sala de aula, portões trancados e muros altos. Esse é cenário das aulas de português do professor Alan Araújo da Silva aos adolescentes que cumprem medida socioeducativa na Unidade de Internação de Planaltina. O professor Alan é um dos 5.036 educadores que dão aulas a pessoas privadas de liberdade em todo o país, conforme determinação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

O professor Alan se interessou pelo trabalho com adolescentes em situação de risco ao lecionar em escolas da periferia. Em 2009, recebeu o convite para ensinar português na unidade de internação. As diferenças foram logo sentidas e o professor percebeu que teria que fazer adaptações pedagógicas para adequar os conteúdos à realidade dos internos.

“Lá fora você está preocupado em formar o cidadão para o mercado de trabalho, para ele ingressar na universidade. Aqui isso vai ser a longo prazo, a curto e médio prazo você está preparando esse cidadão para ele se reinserir na sociedade, não reincidir em ato infracional”, conta.

Com muitos alunos com histórico de abandono escolar, o professor busca alternativas para despertar o interesse dos jovens. Usa, por exemplo, letras de funk e clipes para analisar o português. “A posição de professor dentro da sala de aula aqui é diferente de lá porque os assuntos, a metodologia têm que estar adequados à realidade daqueles alunos, à linguagem deles”, disse. Os temas sociais são frequentes. “Na sala de aula é preciso desconstruir a intolerância, trabalhamos questões como a homofobia, a violência contra a mulher, doenças sexualmente transmissíveis”, explica.

O envolvimento com os dramas e questionamentos dos alunos é inevitável, segundo ele. E não é raro encontrar na unidade de internação alunos para quem o professor deu aula em escolas regulares.

Na unidade de internação a atenção à segurança é maior e é preciso estar preparado para eventualidades, conta o professor. Segundo ele, nas escolas regulares é menos frequente a evolução de pequenos conflitos para atos de violência. “Aqui há meninos com problemas de relacionamentos, conflitos uns com os outros. A segurança faz essa triagem antes de distribuí-los na sala de aula”, explica. “Aqui todo dia é algo novo, você não sabe o que está acontecendo dentro do módulo onde eles vivem, os conflitos que são gerados lá”, acrescenta.

À medida que aumenta a escolaridade dos alunos, cresce neles também o interesse pelo estudo, o que, segundo o professor, indica a importância do ensino para os jovens que cumprem medidas socioeducativas. A rotatividade dos estudantes que saem ao terminar de cumprir a medida socioeducativa, ou por problemas na unidade, no entanto, é um ponto que causa frustração.

“Você está fazendo um trabalho e vê que vai colher frutos e muitas vezes ele [o adolescente] é transferido, aí desconstrói todo o trabalho feito. Às vezes se está no meio do processo e ele consegue liberação e vai para rua e, lá fora, sem o acompanhamento correto, deixa a escola de novo. Você nunca pode fazer planos a longo prazo”, relata.

Segundo o educador, uma das dificuldades no trabalho é que ações simples de serem postas em prática em outras escolas demoram a fazer parte da realidade das unidades de internação devido à burocracia que é maior. Outro ponto é a dificuldade de acesso aos pais dos internos.

De acordo com dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), referentes a 2012, há 5.036 professores que atuam em prisões e unidades de internação nas redes municipal, estadual e privadas de todo o país. No Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) do ano passado, 75% das pessoas privadas de liberdade se inscreveram para obter a certificação do ensino médio.

Edição: Talita Cavalcante

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