Palco de debates, Constituinte também teve pontapé e sequestro de avião, conta Paim

04/10/2013 - 8h54

Iolando Lourenço e Ivan Richard
Repórteres da Agência Brasil

Brasília - O processo de elaboração da Constituição Cidadã, em 1987 e 1988, foi muito além dos debates e das disputas políticas sobre os mais variados temas de interesse do país. Segundo o senador Paulo Paim (PT-RS), constituinte e um dos principais nomes na luta pelas causas trabalhistas à época, para obter maioria em temas considerados “progressistas”, como a ampliação dos direitos dos povos indígenas e a reforma agrária, foram usadas inclusive estratégias “de terror”, como o sequestro de pequenos aviões que trariam a Brasília parlamentares ligados ao setor rural.

“Tivemos embates muito duros, como o da reforma agrária. Todos sabem que aquela noite [de votação do Capítulo 3º da Constituição, que trata da política agrícola e fundiária e da reforma agrária] foi quase uma noite de terror, em que aviõezinhos eram sequestrados para não deixar que parlamentares que tinham posição diferente em relação à questão da terra pudessem chegar aqui”, relembrou Paim à Agência Brasil.

Para o petista, a Constituinte foi um momento “ímpar” na história do Parlamento, quando foram construídas muitas conquistas para os trabalhadores. “Eles se mobilizaram e pressionaram os constituintes para a aprovação de novos direitos trabalhistas. Todas as mobilizações da época ajudaram a fazer com que a gente tivesse férias mais um terço, redução da jornada de 48 horas para 44 horas, garantia do turno ininterrupto de seis horas, uma nova redação para o salário mínimo e o direito de greve”, enumerou.

Vinte e cinco anos depois, no mesmo plenário em que foi aprovada a Constituição Cidadã, agora com os cabelos grisalhos e em meio a uma sessão do Congresso para a análise de vetos presidenciais, Paim recordou as batalhas ocorridas entre os 559 constituintes, na maioria das vezes em sessões que se estendiam madrugadas adentro.

“Tudo que conseguimos foi fruto de muito debate, de muita luta, de mobilização. O que vi de parlamentares dizendo: 'Paim manda tirar esse cartaz aí com o meu nome me chamando de traidor do povo que eu passo a votar do lado dos trabalhadores, porque com  isso  aí eu não concordo'. Respondia: 'Pode deixar, vota do nosso lado que eu retiro os cartazes'”, contou.

Houve, segundo ele, momentos de tensão. “Foram grandes momentos de mobilização, de pressão e de bom-senso. Lembro-me do Juarez Antunes [constituinte pelo PDT do Rio de Janeiro], que levou um soco, e caiu duro no chão na minha frente , se não me engano de um parlamentar de Pernambuco, devido às divergências. Ele, do meu lado, defendendo as questões dos trabalhadores e do movimento sindical”, disse Paim. O autor da agressão foi o deputado Gilson Machado (PFL-PE), em resposta a um pontapé dado por Antunes no então líder do pedetista Brandão Monteiro (RJ).

O plenário da Câmara tem quatro microfones dispostos no corredor que separa as poltronas dos parlamentares do  lado  esquerdo e direito. Dois são colocados em frente à Mesa Diretora e os restantes no meio do corredor. A confusão ocorreu durante votação de um projeto que mudava o regimento da Constituinte e Juarez Antunes, de esquerda, tentou usar um microfone localizado do lado direito, tradicionalmente utilizado por parlamentares direitistas.

Para Paim, ao contrário do que muitos previam, que o detalhamento das regras constitucionais “acabariam com o país”, a execução dos preceitos constitucionais tem ajudado na consolidação da democracia e também da economia. “Aqueles que diziam que a Constituição que elaboramos seria um retrocesso, um atraso, quebraram a cara, porque o Brasil é uma das economias mais equilibradas do mundo e que se sustenta, enquanto os ditos países do Primeiro Mundo, que não tem uma legislação detalhista como a nossa ,estão praticamente em uma situação de caos, de desespero”.

Edição: Marcos Chagas

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