Gilberto Costa*
Correspondente da Agência Brasil/EBC
Lisboa – A crise ainda não acabou na Europa, o desemprego continua em alta, especialmente no Sul do continente, mas há quem enxergue em um futuro próximo o ajustamento das economias europeias sem a presença do Fundo Monetário Internacional (FMI), o credor externo que juntamente com o Banco Central Europeu (BCE) e a Comissão Europeia (CE) formam a Troika, grupo de instituições fiadoras de Portugal, da Grécia, Irlanda e do Chipre.
Esta semana, o presidente da CE, José Manuel Durão Barroso, disse que no futuro haverá "mais do que condições, se os governos quiserem, para que as instituições europeias assumam a plenitude de suas responsabilidades”. Para o presidente de Portugal, Aníbal Cavaco Silva, “o objetivo do FMI está muito voltado para a estabilização financeira. Na União [Europeia], nós temos objetivos de desenvolvimento harmonioso, de coesão e de crescimento econômico”, disse, ao diferenciar o FMI da CE e do BCE.
Antes dessas declarações, o próprio fundo já havia sinalizado sua saída. “O FMI já anunciou que não participará de novos empreendimentos do tipo Troika”, lembrou à Agência Brasil o analista econômico Luís Salgado de Matos, pesquisador ligado ao Instituto de Ciências Sociais que escreve no blog O Economista Português. Conforme Matos, o problema com a permanência do FMI está nas características de parte da União Europeia. “O FMI é um organismo mundial que, supostamente, não deve agir no interior de uma determinada zona monetária. Se, por exemplo, o estado do Texas [EUA], que usa o dólar, tiver dificuldades, Washington não o mandará para o FMI”, explicou.
O analista lembrou ainda que foi a zona do euro que mandou Portugal (entre outros) bater na porta do fundo. “Se o FMI sair da Troika, essa saída deve, supostamente, forçar a zona do euro a assumir mais responsabilidades e a conceder mais crédito aos países-membros em dificuldade. Veremos se isso acontecerá”, ressaltou.
Para o economista João César das Neves, professor da Universidade Católica de Lisboa, a presença do FMI na Troika dá mais respaldo aos programas de ajuda financeira. “O FMI tem tido uma liberdade muito maior que os outros dois [o BCE e a CE], que são entidades políticas e internas da Europa, enquanto o fundo é uma entidade externa e supranacional, e tem liberdade”, disse à Agência Brasil, acrescentando que a autonomia do credor externo “deixa os políticos um pouco aflitos”.
Em Portugal, se tudo correr conforme memorando de entendimento, a saída do FMI e de toda a Troika deverá ocorrer em meados de 2014, com o fim do programa de ajustamento. No entanto, tendo em vista a recessão, há quem defenda em Portugal a dilatação de prazos e de metas (como o equilíbrio de receita e gasto público), o que pode significar a prorrogação da intervenção dos credores na economia lusitana e mais endividamento. “Não é grave se o ajustamento acabar em 2015, 2016 ou até 2017. O que é importante é que os credores internacionais acreditem que de fato há um esforço real e uma mudança de atitude dos portugueses”, ressaltou Neves. Ele ponderou que “mais um ano ou dois de ajustamento vai gerar mais dívida e pesar mais no futuro”.
Em termos ideais, o programa de ajustamento deveria acabar quando o país retomasse o crescimento de forma sustentável, com a economia reestruturada. “A ideia do ajustamento é aumentar o peso dos bens exportáveis. Esse aumento será desejável para a agricultura, indústria transformadora e os serviços. Mas, em Portugal, o setor de bens não transacionáveis [como infraestrutura e patrimônio] continua a ser privilegiado e, por isso, é improvável que nos próximos anos venha a perder terreno”, prevê Luís Salgado de Matos.
João César das Neves é mais otimista e avalia que “está havendo transformação da estrutura produtiva portuguesa desde o princípio da crise em 2008”, antes do ajustamento acertado entre o governo e a Troika. Segundo ele, “não é na indústria e nem na agricultura que está o dinamismo da economia atual. Todo mundo está a voltar-se cada vez mais para os serviços. Até mesmo nos produtos agrícolas e da indústria o componente serviço está presente”.
*Com informações da Agência Lusa
Edição: Graça Adjuto