Vladimir Platonow
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro – A Fundação Nacional do Índio (Funai) precisa ser fortalecida e passar por reformulações que garantam melhor apoio ao índio brasileiro. A opinião é do antropólogo Mércio Gomes, que presidiu a instituição por três anos e sete meses no primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Ele argumenta que a política indigenista atual enfraqueceu a Funai ao delegar poder a outras instituições não governamentais, gerando inclusive o fechamento de postos em regiões importantes do país.
“A principal questão hoje é o fortalecimento da Funai. Há um sentimento de que ela deve deixar de prestar assistência aos índios e de intermediar as relações deles com a sociedade nacional. As coordenações regionais, acabaram com os postos indígenas. Não tem mais posto nas aldeias. Se o índio precisar de alguma coisa, tem que ir para a cidade. Com isso, as terras indígenas ficam mais vulneráveis. Isso [foi feito] na suposição que os índios vão ganhar uma autonomia de imediato. Querem retirar a capacidade do órgão de assistir, de cuidar, de ter uma relação, de saber da saúde, de estar lá presente”, disse Mércio.
Para ele, a questão não se resume a simplesmente dar mais autonomia à Funai. “Sou da opinião de que o índio só sobreviveu no Brasil porque foi protegido pelo governo federal. A federalização da questão indígena é muito importante para a educação, para a saúde, para a assistência geral, para promover um desenvolvimento econômico interno. A Funai deveria voltar a ter as mesmas condições que tinha antes, de coordenar a saúde, a educação, a assistência jurídica e a assistência econômica”.
O antropólogo chamou a atenção para o fechamento de postos avançados, inclusive em regiões onde hoje existem conflitos motivados pela construção de grandes hidrelétricas. “Usaram a retórica de que cuidar dos índios pelo posto indígena é paternalista. Foi uma perversão o que ocorreu. Porque em nome de uma ideologia de autonomia, deixam os índios à própria sorte. A Funai está mais enfraquecida. Extinguiram a administração regional de Altamira. Ao extinguir, ficaram os índios soltos, negociando com todo mundo. Extinguiram a do Oiapoque, que é junto à fronteira com a Guiana Francesa. Acabaram com a de Pernambuco, que reunia 45 mil índios. Acabaram com a administração de Porto Velho, onde há duas hidrelétricas”.
Mércio disse que o enfraquecimento da Funai acaba deixando os índios nas mãos de fazendeiros e políticos locais. “É um misto de burrice com perversão. Não sabem o que estão fazendo, mas ao mesmo tempo tem a perversão de diminuir a força da Funai, que vem de muitos anos, de acreditar que o Estado é autoritário, mandão e opressor. Enquanto eles seriam a alegria dos índios. Eles diminuíram o Estado e agora os índios ficam assistidos pelos fazendeiros, os vereadores, os prefeitos. Estão na mão da raposa. Por isso os fazendeiros estão tão afoitos em propostas de lei que visam tirar do Poder Executivo a capacidade de demarcar terras e botar isso para o Congresso”.
A referência é à possível aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 215/2000), que inclui nas competências exclusivas do Congresso Nacional a aprovação de demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, a criação de unidades de conservação ambiental e a ratificação das demarcações de terras indígenas já homologadas.
Para o antropólogo, é preciso fazer modificações que fortaleçam a presença dos índios na Funai. “O momento é de reformular a Funai. Recriar posto indígena, fazer novas contratações, inclusive absorvendo os índios como funcionários. Esses concursos são dificílimos, só quem passa são os bonitinhos da cidade, que tiveram uma boa educação. Aí não dá chance para o índio, que podia muito bem ser chefe de posto, por exemplo. Nenhum índio passou nos dois concursos que a Funai fez.”
Edição: Tereza Barbosa
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