Thais Leitão*
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Um novo pedido de habeas corpus em favor de dois brasileiros presos há cinco meses no Senegal (África) será julgado amanhã (5) pelo Tribunal de Recursos de Dacar, capital do país. A informação foi divulgada pelo presidente da organização não governamental (ONG) de defesa dos direitos humanos Rio de Paz, Antônio Carlos Costa, que está no Senegal para acompanhar o processo.
Segundo o presidente da ONG, associada ao Departamento de Informação Pública do Secretariado das Nações Unidas, os missionários José Dilson Alves da Silva, 45 anos, e Zeneide Moreira Novais, 53 anos, estão sendo submetidos a graves violações de direitos humanos. Eles estão detidos na Maison d’Arrêt et Correction de Thiès (Casa de Detenção e Correção de Thiès).
"Eles vivem condição desumana de encarceramento, com celas superlotadas, por onde circulam ratos e baratas, com muito calor, falta de ventilação, mau cheiro, além de haver roupas e bagagens penduradas em todas as paredes", disse.
Costa explicou que os brasileiros foram detidos em novembro do ano passado, pela polícia da cidade de Mbour, situada a 60 quilômetros de Dacar. Inicialmente, foram acusados de formação de quadrilha e exploração de menor, após denúncia feita pelo pai de um dos adolescentes atendidos no Projeto Obadias, conduzido por eles. Trata-se de um abrigo para meninos de rua, onde é oferecida assistência que inclui alimentação, roupas, consultas médicas e atividades esportivas.
"Muitas das crianças atendidas no projeto vieram de outros países africanos e passaram a mendigar nas ruas de Dacar", disse o presidente da ONG.
Em dezembro, um pedido de liberdade provisória, apresentado pelo advogado indicado pela embaixada brasileira, foi negado pelo Tribunal de Justiça local e em 18 de janeiro ocorreu a primeira audiência sobre o caso. O juiz de instrução decidiu inspecionar o projeto social que, apesar das acusações, não foi fechado pela Justiça senegalesa.
Antônio Carlos Costa ressaltou que, segundo informações das autoridades, durante a inspeção não foram identificadas contradições nos depoimentos das crianças e dos adolescentes abrigados na unidade e nenhum deles reclamou de maus tratos, trabalho escravo ou tráfico de menor.
O presidente da ONG acrescentou que, em um segundo momento, os brasileiros receberam nova acusação, de desvio de menor, em razão de não terem a guarda provisória das crianças e dos adolescentes acolhidos na unidade, que não foi legalizada segundo as leis locais.
"O juiz determinou uma audiência para acareação entre José Dilson e um suposto advogado contratado em maio de 2012 para legalizar o projeto social. Na audiência, ele confessou que não era advogado e que, portanto, é o principal responsável pela não legalização do abrigo", disse.
Um pedido de habeas corpus, feito este ano, também foi negado, sob a alegação de que os brasileiros poderiam fugir do país e que o centro social continuava em situação irregular.
"É inegável que houve transgressão da lei do Senegal por parte da instituição brasileira, já que ainda não está legalizada, mas um detalhe chama a atenção nessa história: até hoje ninguém tem prova documental das acusações [contra os brasileiros]: nem as famílias do José Dilson e da Zeneide, nem as agências missionárias às quais pertencem, nem a embaixada brasileira, acrescentou.
Costa informou que apelou ao governo brasileiro e ao Ministério das Relações Exteriores para que intensifiquem perante o governo do Senegal, respeitando a soberania do país africano, o pedido de libertação dos brasileiros. Uma petição lançada pela organização na internet, em favor da libertação dos missionários, recebeu mais de 50 mil assinaturas até 31 de março.
Segundo Antônio Carlos Costa, José Dilson mora há 23 anos na África, onde nasceram seus três filhos. Antes de se mudar para o Senegal, há oito anos, morou na Guiné-Bissau, onde estruturou uma escola que atualmente tem 700 alunos matriculados, além dos centros nutricionais que atendem a crianças e mulheres grávidas. No Senegal, além do projeto Obadias, ele fundou a Escola ABC, que atende a 200 alunos, que recebem alimentação diariamente e estudam em tempo integral. Antes de ser preso, José Dilson também dava aulas de futebol em uma escolinha com 120 meninos.
"Todos esses projetos sociais na África têm sido feitos de acordo com a legislação dos dois países onde ele pode trabalhar, mesmo no Senegal, com exceção do abrigo para meninos de rua. Enfatizamos, no entanto, que não foi por falta de empenho, já que chegou a contratar um suposto advogado, a quem pagou adiantado para solucionar a questão", ressaltou.
O Itamaraty informou à Agência Brasil que está acompanhado de forma intensa e constante o caso dos missionários brasileiros detidos no Senegal desde o final de 2012. Segundo o Ministério das Relações Exteriores, a questão foi mencionada no mês passado pelo ministro Antonio Patriota, em reunião com o chanceler senegalês, Mankeur Ndiaye, que garantiu que o devido processo legal referente ao caso será observado.
O Itamaraty enfatizou que a Justiça do Senegal tem de ser respeitada e destacou que cabe ao Brasil acompanhar o processo legal, para que corra sem violações e para que os brasileiros tenham seus direitos garantidos. O ministério acrescentou que a Embaixada do Brasil em Dacar tem reuniões frequentes com os advogados dos brasileiros, as famílias, as autoridades políticas e judiciais do Senegal. A missão ainda envia produtos e alimentos aos brasileiros presos.
*Colaborou Carolina Sarres
Edição: Graça Adjuto
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