Camila Maciel
Repórter da Agência Brasil
São Paulo - Quando recebeu o diagnóstico de mal de Parkinson, há seis anos, a advogada Juliana Torres, 59 anos, disse que achou que a sua vida tivesse perdido o sentido. "Sabia que era uma doença degenerativa. Com o passar do tempo, os sintomas só foram piorando. Meu corpo ficou rígido, mal mexia o pescoço. A gente também sofre de solidão, porque perde o convívio social", relatou. Em fevereiro deste ano, no entanto, uma cirurgia de alta tecnologia mudou a perspectiva de vida dela. O implante de um eletrodo no cérebro, feito pela equipe de neurocirurgia funcional da Santa Casa de São Paulo, fez com que ela recuperasse os movimentos e, com eles, a qualidade de vida.
O procedimento, custeado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), consiste em estimular, por meio de um dispositivo, as regiões do cérebro responsáveis pela manifestação dos principais sintomas da doença, como tremor e rigidez. "A ideia de tratar cirurgicamente essa doença vem há mais de 50 anos, mas antes cauterizavam-se pedaços que estavam doentes", explicou o neurocirurgião Nilton Lara, que coordena a equipe. O método com o eletrodo é considerado pouco invasivo, tendo em vista que o dispositivo é instalado por um pequeno furo e o risco de sangramento diminui de 2% para 0,05%.
Logo depois de passar pela cirurgia, Juliana retomou atividades simples que há anos não fazia. "Conseguir escrever foi muito impactante para mim. Antes, eu só conseguia digitar e, ainda assim, com muita dor", descreveu. Aos poucos, a advogada está conquistando outros movimentos. "Voltei a viver. Senti um bem-estar como nunca", relatou. Estima-se que 200 mil brasileiros, assim como ela, sofram com a doença, especialmente pessoas a partir dos 50 anos, segundo dados do Ministério da Saúde. A perspectiva é que esse número aumente nos próximos 30 a 50 anos com o envelhecimento da população.
Essa cirurgia, que pode custar até R$ 150 mil na rede particular, é feita gratuitamente na Santa Casa desde janeiro deste ano e quatro pacientes já receberam o implante. "Esperamos atender até quatro pacientes por mês", disse o neurocirurgião. O médico informou que na rede pública de São Paulo essa cirurgia só é feita na Santa Casa e no Hospital das Clínicas, que faz o procedimento há alguns anos em caráter assistencial e de pesquisa. "Fora isso, somente hospitais privados [fizeram] e, ainda assim, em poucas capitais, como o Rio de Janeiro, Curitiba, Goiânia, Recife e Belo Horizonte", informou.
Nilton Lara explicou que o perfil dos pacientes selecionados para receber o eletrodo são os que já não apresentam melhoras com o uso do medicamento ou que desenvolveram efeitos colaterais. "No começo, a dopamina [substância utilizada no tratamento] funciona muito bem, mas depois começa a apresentar efeitos colaterais, que são movimentos involuntários. Algumas vezes, eles são mais incapacitantes do que os próprios sintomas da doença de Parkinson. Fica uma coisa sem saída." A perda de funcionalidade do remédio ocorre depois de cinco a dez anos de uso.
Era assim que Juliana se sentia antes de fazer o procedimento. "Estava no fundo do poço. A cirurgia para mim foi uma luz no fim do túnel. Tomava a medicação de duas em duas horas e, para evitar que perdesse o efeito, não podia me alimentar. Estava para definhar de fome", relatou. O neurocirurgião destacou que estão sendo feitos estudos para avaliar o uso precoce do eletrodo, já quando aparecem os primeiros sintomas. Mas ele concorda que, por enquanto, seja mantido o perfil de paciente que já não apresentam resposta ao medicamento. "Se você toma a medicação e se sente bem, porque se submeter a um procedimento cirúrgico? A cirurgia não altera a evolução da doença, o remédio também não", disse.
Apesar de não significar a cura do mal de Parkinson, o implante possibilita que, até que apareçam sintomas de comprometimento cognitivo e comportamental, o paciente tenha uma vida normal, por meio do controle dos sintomas motores. "No estágio avançado, começam a aparecer complicações cognitivas. Aí não há mais nada a fazer, mas eles podem demorar de 20 a 30 anos para aparecer", destacou.
Depois de instalado, o eletrodo não precisa mais ser substituído. Somente a bateria, colocada no mesmo local do marcapasso da cirurgia cardíaca, é que precisa ser trocada quando apresentar desgaste. "Após a alta, que ocorre cerca de quatro dias após o procedimento, o paciente retorna semanalmente ao hospital para que a gente faça regulagem da estimulação por meio de telemetria", explicou o médico. Depois a regulação fica mais espaçada, até que não sejam mais necessárias idas mensais ao hospital. "A gente passa a alterar a estimulação caso o paciente relate alguma piora", disse.
Edição: Juliana Andrade // A matéria foi alterada às 11h21 do dia 11/04/2013 para esclarecer informação no quarto parágrafo. O Hospital das Clínicas faz o procedimento há alguns anos em caráter assistencial e de pesquisa e não apenas com o viés de estudos, como o texto informava
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