Comissão da Verdade de SP ouve parentes e amigos de desaparecidos da ditadura

28/02/2013 - 18h23

Fernanda Cruz
Repórter da Agência Brasil

São Paulo – Parentes e amigos de desaparecidos políticos da ditadura militar deram depoimentos hoje (28) na Comissão da Verdade do estado de São Paulo. Entre eles, a neta de David Capistrano, um dos dirigentes do Partido Comunista Brasileiro (PCB). A jornalista Cecília Capistrano fez um relato emocionado do sofrimento da família com o desaparecimento do avô.

Ela disse que após ter passado a atuar na clandestinidade e se mudado, em 1972, para a Checoslováquia, David decidiu retornar para o Brasil, em 1974. “Todos pediam para que David não voltasse, sabiam que algo de ruim estava para acontecer”, disse Cecília.

Segundo os registros da Comissão da Verdade, David desapareceu em 1974, ao longo do percurso entre as cidades de Uruguaiana (RS) e São Paulo, quando viajava de carro para reencontrar a família. “O relato que eu queria dar é desse sofrimento que vai passando de geração em geração”, declarou.

A família de Elson Costa, outro militante do PCB que sumiu durante a ditadura, pediu à Comissão a mudança no atestado de óbito. Ela quer que o documento no qual consta Elson como “desaparecido”, passe a constar “assassinado por tortura”.

De acordo com José Miguel Soares Winsk, sobrinho de Elson Costa, seu tio foi torturado durante 20 dias, além de ter recebido uma injeção com líquido para matar cavalos. O corpo teria sido jogado em um rio na cidade de Avaré, interior de São Paulo. “Segundo depoimentos extraoficiais, ele foi levado para uma chácara em Itapevi, onde funcionava um centro de tortura”, disse.

Elson desapareceu em janeiro de 1975, segundo testemunhas, após ter sido preso em um bar ao lado de sua casa em São Paulo, enquanto tomava café da manhã. “A família o procurou das mais diferentes maneiras, escrevendo cartas ao Ministério da Justiça. A viúva escreveu ao presidente da República”, disse Winsk.

Genivaldo Medeiros da Silva, amigo do desaparecido José Montenegro de Lima, relatou que esteve preso e recebeu tortura no DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna) por cerca de 20 dias.

Ele disse que foi preso pela polícia dez dias depois do desaparecimento de José Montenegro. O amigo estava sumido desde 29 de setembro de 1975. Genivaldo relatou à comissão que, quando chegou ao DOI-Codi, os torturadores diziam que Montenegro estava morto “e que se eu não colaborasse ia morrer também”.

Outra amiga de Montenegro, a médica Albertina Duarte, trabalhava no Hospital das Clínicas de São Paulo no período em que ele desapareceu. Segundo ela, o amigo atuava como um facilitador entre os militantes, articulando a ida de muitos deles ao centro médico. “Ele montava estratégias de atendimento”, disse.

Como os integrantes do PCB viviam na clandestinidade, muitos dos tratamentos médicos e cirurgias de que precisavam eram feitos de modo precário. A própria Albertina era quem fazia as intervenções. A médica disse que não podia nem mesmo contar com estoques de sangue durante as operações.

Albertina relatou, em um depoimento emocionado, que chegou a esconder muitos dos seus pacientes militantes no banheiro do hospital, para que não fossem reconhecidos. Em certo momento, começou a reparar que fichas médicas passaram a desaparecer do seu consultório. Em 1968, no município de Sorocaba, ela também foi presa durante sete dias.

 

Edição: Aécio Amado

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