Seca afeta merenda escolar no Nordeste e comércio no Sul do país

06/09/2012 - 13h42

Carolina Gonçalves
Repórter da Agência Brasil


Brasília – Os produtos da agricultura familiar que compunham 42% da merenda escolar no município de Araripe, a 500 quilômetros de Fortaleza, no Ceará, hoje, representam apenas 21%. A queda na participação dos produtos dos pequenos agricultores na merenda dos alunos da rede pública de ensino reflete os prejuízos provocados pela seca na região. Os produtores nordestinos foram, ao lado dos sulistas, os mais afetados pela estiagem este ano no país.

No caso de Araripe, cerca de 60% das lavouras de milho, feijão e mandioca foram perdidas, segundo dados da Secretaria de Desenvolvimento Agrário e Meio Ambiente do município. A seca afetou também o setor de bovinos, caprinos e ovinos. Os órgãos locais ainda não têm levantamentos da pecuária, mas reconhecem que os prejuízos ultrapassaram as cercas das propriedades rurais e chegaram à cidade.

“Temos um considerável impacto em toda a economia do município. Aqui, se a agricultura vai mal, toda a economia vai mal, afeta todos os setores. No comércio, por exemplo, já estimamos perdas em torno de 20% a 30%”, declarou o secretário de Desenvolvimento Agrário, Rutemberg Fortaleza.

Segundo ele, no caso da merenda escolar, Araripe é um dos poucos municípios nordestinos que conseguem superar, com folga, a meta estipulada pela lei de participação da produção local na composição da refeição escolar. “É muito difícil atingir a meta de no mínimo 30% de produtos locais na merenda escolar. Tínhamos um padrão acima desta meta até o primeiro semestre deste ano (42%), mas tivemos muitas perdas. Vamos aguardar o inverno para tentar retomar isso”, explicou Fortaleza.

Uma das medidas de apoio aos pequenos produtores é a garantia de transporte do milho comercializado a preços subsidiados em relação ao valor de mercado estipulado pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). O produto tem sido demandado pelos agricultores para alimentação animal. Para obter as sacas ao preço de R$ 18,10 (quase a metade do valor de comércio), os agricultores precisam fazer um cadastro  e efetuar o pagamento. Como o milho é enviado para o depósito da Conab em Juazeiro do Norte, município a mais de 100 quilômetros de Araripe, prefeituras da região do Cariri estão disponibilizando veículos para buscar o insumo.

“Só na última terça-feira, trouxemos 330 sacas de milho. O envio do caminhão depende do volume de produtores que se cadastram. No mês passado o transporte foi feito três vezes por semana, para atender 48 produtores. A gente sabe que o pequeno produtor não tem condições de pegar o produto e este mês mais produtores estão se cadastrando”, explicou.

Na outra ponta do mapa, na Região Sul do país, onde a seca também castigou a produção de grãos, o impacto dos prejuízos recaiu sobre outros setores da economia, com efeitos praticamente nulos sobre a composição das merendas escolares. Em Ijuí, no Rio Grande do Sul, as estimativas apontam para uma participação de 35% dos produtos da pequena agricultura na composição da merenda escolar este ano.

“Embora a seca tenha prejudicado bastante as lavouras de soja, o abastecimento de água para animais e as pastagens não tivemos uma queda muito grande no fornecimento do alimento porque a produção dos pequenos é basicamente de hortaliças com produção irrigada. Os agricultores sentiram a falta de água, mas tinham fontes alternativas para irrigação”, explicou Eloir Torres Haas, coordenador do Núcleo de Produção Vegetal da Secretaria de Desenvolvimento Rural de Ijuí, no Rio Grande do Sul.

A produção agrícola de pequeno e médio porte no município é variada em tipos de cultivo e complementada pelas agroindústrias que produzem, principalmente, derivados de carne, como linguiça, e panificados como biscoitos e pães. “Mais de 30 produtos destas fontes compõem a merenda”, acrescentou Haas.

Ijuí é ainda responsável pelo abastecimento de merenda escolar em outros três municípios vizinhos - Cruz Alta, Santo Ângelo e Carazinho -, atendendo 56 escolas estaduais e municipais desta região.

O conforto em relação à situação do abastecimento da rede pública de ensino não se repete no comércio. “Nosso Produto Interno Bruto é muito variado, mas o comércio é a principal fonte econômica e existe uma forte relação entre o comércio e a agricultura”, destacou Edezin Bernick, técnico em Agropecuária da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) Ijuí.

O resultado da equação é um impacto direto no segmento ligado a insumos agrícolas e máquinas e equipamentos. Pelas contas da Emater, as perdas dos produtores locais de soja e milho chegam a quase 80% da produção. No caso do leite, a estimativa aponta queda de 40% na produção. “O reflexo é grande. Estimamos que, pelo período de estiagem, vamos fechar com uma perda R$ 1,5 bilhão só na agricultura, diretamente”, acrescentou.

 

Edição: Lílian Beraldo