Audiência pública na Câmara discute PEC do Trabalho Escravo

15/05/2012 - 17h41

Carolina Sarres
Repórter da Agência Brasil

Brasília – Governo, juízes, procuradores e auditores fiscais do Trabalho afirmam que o conceito de trabalho escravo e degradante não carece de especificação mais objetiva para que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do Trabalho Escravo seja aprovada, assim como a possibilidade de expropriação não deve ser um obstáculo à aceitação da proposta. Representantes da Conferência Nacional da Indústria (CNI) e da Conferência Nacional da Agricultura (CNA) discordam e pedem que a legislação brasileira dê segurança jurídica ao patronato. Esse foi o cerne das discussões de audiência pública realizada na manhã desta terça-feira (15), na Câmara dos Deputados.

A audiência ocorreu no contexto das negociações para a aprovação da PEC do Trabalho Escravo, de 2003, que tramita há quase dez anos no Congresso e voltou à pauta na Casa. Na última semana, parlamentares decidiram adiar a votação da matéria, que foi remarcada para o próximo dia 22. Líderes da bancada ruralista não concordam com a falta de definição na proposta do que seria considerado trabalho escravo e com a possibilidade de expropriação em locais onde houver funcionários em situação degradante.

“Não há dificuldade de conceituação do que é uma situação degradante”, afirmou a representante da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), Luciana Conforti.

Para a auditora fiscal do Trabalho, Jaqueline Carrijo, a tipificação da legislação é propositalmente genérica, para que se possa aplicar a todas situações ilícitas.

“Se houvesse especificação, não abarcaríamos todas as necessidades dos trabalhadores, haja vista o dinamismo e a complexidade das varias atividades. A fiscalização é feita segundo um contexto. Por exemplo, acredito que ninguém discorde que trabalhar 30, 40 horas dirigindo [no caso de caminhoneiros] não seja jornada excessiva”, disse Jaqueline.

Segundo o representante da CNA, Cristiano Barreto, a legislação é subjetiva e deve ser concedida segurança jurídica ao empresariado responsável pelas relações com os trabalhadores.

“Não defendemos o trabalho escravo, mas queremos entender de forma incontestável como é e o que é. Consideramos a avaliação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, de que se for dada à vítima a liberdade de abandonar o trabalho e rejeitar as condições, não é razoável considerar a existência de trabalho escravo. O bem tutelado é a liberdade”, explicou Barreto.

Para o presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), Sebastião Caixeta, o conceito de trabalho escravo não pode ser restrito ao cerceio de liberdade individual.

“A dignidade da pessoa humana e do trabalho são fontes maiores de toda a ordem jurídica brasileira. O bem tutelado não é mais só a liberdade individual, mas dignidade intrínseca a todo ser humano. O que leva ao trabalho escravo é um conjunto de circunstâncias, não situações isoladas”, falou Caixeta.

“Essa conceituação jurídica não tem mais cabimento. Retirar essas espécies do [Artigo] 149 seria um retrocesso. Aí, sim, estaríamos em insegurança jurídica”, disse o coordenador da Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete), Jonas Ratier Moreno.

A ministra da Secretaria dos Direitos Humanos (Sedh), Maria do Rosário, não compareceu e foi representada por José Armando Fraga Diniz Guerra. Segundo ele, o entendimento da secretaria é de que possíveis alterações do Artigo 149 do Código Penal (que enquadra o trabalho escravo como delito) – como precondição para a aprovação da PEC na Câmara – serão fonte de insegurança e não o contrário.

“Esperamos que a PEC nunca seja utilizada. Traz penalização dura, mas é para que sirva de exemplo. Se tiver que ser feita expropriação, não vai ser ao arrepio da lei e da Constituição. Será respeitado todo o processo legal que já existe”, explicou Guerra.

De acordo com a analista da CNI, Rossana Marques Salsano, a expropriação é pena considerada excessiva por ser perpétua – o que, segundo ela, é contrário ao ordenamento jurídico brasileiro.

O procurador Sebastião Caixeta, por outro lado, disse que embora a autonomia privada seja um princípio, a função social da propriedade deve ser mantida. Caso haja identificação de trabalho escravo no local, “não há como a autonomia privada prevalecer sobre isso”.

A audiência ainda teve a presença da diretora da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil, Andrea Bolzon; dos representantes do Ministério do Trabalho e Emprego (TEM), Alexandre Lyra; e da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), Waldir Ferreira da Silva.

Edição: Fábio Massalli