Guerra ao crack mobiliza prefeitura, ONGs e líderes comunitários no Rio

01/11/2009 - 0h47

Luiz Augusto Gollo
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - Um plano de açãopara o combate ao uso de crack e à exploraçãosexual de crianças e adolescentes está sendo preparadopela Prefeitura do Rio de Janeiro e será divulgado na próximaterça-feira (3).Para discutir e definir as ações do plano, a Secretaria municipal de Assistência Social coordenou o 1ºFórum Municipal de Enfrentamento ao Uso Abusivo de Crack e deOutras Substâncias Psicoativas, que contou com a participaçãode representantes do governo e da sociedade civil. Osubsecretário de Proteção Especial da Secretariade Assistência Social, Carlos Augusto de Araújo Jorge,que acompanhou os debates ocorridos durante o fórum, destacoua importância das discussões. “Pela primeira vezestamos abordando a cultura de lidar com o problema. Não éa assistência social, nem a polícia, nem os médicostratando isoladamente da questão, mas sim todos em discussãotambém com os representantes das comunidades mais carentes”,disse.Nos últimos dois meses, como preparaçãopara o fórum, foram promovidas várias reuniõesnas comunidades; em seguida, houve novas reuniões nas sedesdas dez áreas em que a secretaria dividiu a cidade e,finalmente, chegou-se ao fórum onde as conclusões decada etapa foram expostas e debatidas.“O uso de crackestá associado à exploração sexual decrianças de muitas maneiras, algumas assustadoras”, disseCarlos Augusto. “Já vimos o caso de um menino de 9 anosprostituído pelos traficantes, que andava travestido e ésoropositivo. E de uma menina resgatada que tinha uma infecçãovaginal em estado avançado”. A situaçãode vida dos menores envolvidos no tráfico e no consumo docrack é muito diferente daquela dos meninos e meninasque cheiravam cola e thinner nas ruas, alertou o subsecretário.“O crack é devastador, como bem definiu o secretáriomunicipal de Assistência Social, Fernando William”.Hámeses, Fernando denunciou o crack como o grande inimigo dasociedade. “No censo municipal de abandono, do ano passado,registramos 410 crianças e adolescentes abandonados nas ruasda cidade. São menores e jovens que usavam thinner e cola desapateiro e agora usam crack, mais barato e muito mais prejudicial”,explicou o secretário. A rotina do seu pessoal revela quecrianças a partir dos oito anos de idade compram pequenaspedras da droga por 50 centavos e se viciam imediatamente.“Oviciado não quer saber de nada, só do crack. Masa droga é tão violenta que as próprias criançaspreveem a morte. Ficam até seis dias sem comer, perdem asforças, a morte é a consequência natural paraelas”, disse. Fernando William lembrou também a dicotomiaexistente entre o combate ao vício e o Estatuto da Criançae do Adolescente, no qual são impostas restriçõesao emprego de força.Ainda segundo o secretário,o universo de usuários de crack no Rio de Janeiro e nasregiões periféricas pode atingir mais de três milcrianças, adolescentes e jovens. A rápida disseminaçãoda droga, seu baixo custo e a constatação do usuáriode que está num beco sem saída.A disseminaçãoda droga, as relações complexas dos viciados com ostraficantes e a reação das milícias que dominamcentenas de comunidades pobres na cidade foram outros aspectosdestacados nos debates. Uma líder comunitária de SantaCruz, conhecida como Gaúcha, contou de um garoto de 11anos barbaramente espancado a pauladas e chutes por milicianos que osurpreenderam se drogando na favela, mesmo diante dos gritosdesesperados do pai para que parassem.“Não existemmais estatísticas oficiais”, apontou Gaúcha,aplaudida ao final: “A gente só ouve 'seis mortos noAlemão', 'quatro corpos encontrados no mato', e por aívai. E as vítimas têm entre 12 e 29 anos de idade”.De acordo com as autoridades municipais, a maioria dosmenores nas ruas estudou até a quinta série; querdizer, os professores tem que agir desde cedo. Umarepresentante do magistério enfatizou a quase impossibilidadede se resgatar a criança que já está nas ruas,em contraste com o ambiente escolar propício.A majorSílvia, representante da Polícia Militar nos debates,reforçou a necessidade de a sociedade confiar na polícia,para as ações contra a violência alimentada pelouso do crack. “Faço parte dos 138 novos oficiais da PM,todos com nível superior, alguns com pós-graduação.Eu mesma estou fazendo mestrado. Nasci no ano em que acabou aditadura, cresci num país democrático e acredito naforça da sociedade para mudar a realidade”.A oficialda PM falou do programa específico da instituiçãode aproximação das famílias com problemas como otráfico, o consumo de drogas e outros delitos, para orientaçãoe esclarecimento. Mas advertiu, como os demais participantes doencontro, que nenhuma instituição ou instância degoverno pode vencer a luta sem o engajamento dasociedade.