Flávia Albuquerque
Repórter da Agência Brasil
São Paulo - Oito fiscais federaisagropecuários que trabalham no Serviço de Vigilância AgropecuáriaInternacional do Porto de Santos denunciaram hoje (20)irregularidades no sistema de controle e fiscalização dos produtosde origem animal e vegetal que entram e saem do país por aqueleterminal. Na denúncia, que os fiscais encaminharam ao MinistérioPúblico Federal no dia 10 de julho, foram apontados problemasna auditagem agropecuária do porto. Os fiscais alegam ter sofridorepresálias ao buscar a adequação dos procedimentos às normasestabelecidas pela legislação.As principais irregularidadese deficiências apontadas pelos fiscais são a ausência de inspeção física na maioria dos contêineres, tanto na exportação quanto naimportação de produtos, a falta de sistema de alerta informatizadoentre os portos, aeroportos e postos de fronteira, a liberação decarnes e derivados para a Alemanha, Holanda, Rússia, o Reino Unido,a França, Hong Kong, os Estados Unidos e o Egito.Além disso, eles denunciam a liberação decertificado sanitário internacional emitido e assinado por pessoassem habilitação legal, a liberação de produtos sem a formaçãode processo regular pelo Ministério da Agricultura, ao qual estávinculado o Serviço de Vigilância Agropecuária Internacional doPorto de Santos, a liberação de produtos cuja exportação éproibida pela União Europeia e o deferimento de produtos deresponsabilidade do ministério no Sistema Integrado de ComércioExterior (Siscomex), sem que o processo esteja devidamente formado. Os fiscais apontam ainda problemas nos navios quefazem cruzeiros marítimos, nos quais alimentos destinados aos passageiros estariam sendo liberados sem fiscalização. Conforme a denúncia, tais alimentos, incluindo carne e derivados,permanecem no cais, dentro de contêineres que são abertos efechados diversas vezes para o abastecimento dos navios, o quecontribuiria para a ocorrência de casos de intoxicação alimentardurante as viagens.O lixo produzido nas embarcações, seu tratamentoe sua destinação também foram pontos destacados pelos fiscais. Elesafirmam que não há como cuidar do lixo nos navios – afiscalização ignora esse material, o porto não dispõe deincineradores e os terminais não têm autoclaves. O destino dosresíduos não é fiscalizado e todo o material produzido nos navios é levado para aterros sanitários, lixões ou lançado ao mar, afirmam os fiscais. A denúncia cita ainda a falta de verificação da bagagem dosestrangeiros que desembarcam no país, conforme determina a legislação, o que não vemocorrendo. Com isso, há risco de entrarem no país doenças ouinsetos provenientes de outros locais, pondo em risco o ecossistemanacional.Segundo o veterinário e fiscal federalagropecuário Alexandre dos Reis Inácio, as consequências de taisirregularidades podem ser danosas para o comércio exterior doBrasil, já que normas contidas em tratados internacionais estãosendo descumpridas. “A União Europeia exige certificação paraque nosso produto de origem animal entre lá. Uma vez que osprocessos passam pelo Ministério da Agricultura, Pecuária eAbastecimento e são liberados sem nenhum tipo de informação deprocesso, realmente estamos colocando em risco o comérciointernacional e a saúde pública.”Ele ressaltou que grande parte do controle decarnes e derivados, produtos lácteos, mel e ovos vem sendo feitaapenas “no papel” e que alimentos são liberados por pessoas nãohabilitadas. “Tem muita coisa feita só com documentos, papéismuitas vezes sem respaldo." Há, por exemplo, liberações comrequerimento alegando que o importador não exige certificado, o queé “absurdo”. Inácio lembra que os países exigem oscertificados com base em tratados sanitários internacionais.Para ele, os responsáveis pelas irregularidadessão os próprios gestores do serviço de vigilância do Porto deSantos que, de alguma forma, têm dado aval a essas ações. Segundoele, as normas vêm sendo descumpridas desde 2003, mas os fiscais sóas descobriram em 2007, ao assumir postos no local. “Nessa época,houve tentativa de implementação de controles efetivos e ,no iníciode 2008, isso foi impedido pelos gestores. Em menos de dois mesestodo o processo se reverteu e nós, fiscais, passamos a ser personaenon gratae.” O advogado dos fiscais, Quirino Goulart, destacouque eles foram, de alguma forma, afastados de suas atividades noporto, ou removidos para outras funções. De acordo com o advogado,além disso, passaram a ter avaliações mais baixas e, com isso,queda na remuneração, além de sofrer processos administrativos. Goulart disse que não há motivo para oafastamento dos profissionais, que tentaram cumprir a lei e sãoeficientes. “O que há contra eles é uma acusação sem adescrição de fatos ilícitos. Os responsáveis por essas açõesestão sendo processados por danos morais em R$ 5 milhões, além darepresentação encaminhada ao Ministério Público.” A representação está no Ministério PúblicoFederal em Santos, mas ainda não há informações sobre o andamentodo caso.Procurado pela Agência Brasil, oMinistério da Agricultura não deu retorno.