Preservação da Mata Atlântica é aprovada

03/12/2003 - 21h06

Cristina Guimarães
Repórter da Agência Brasil

Brasília, 3/12/2003 (Agência Brasil - ABr) - Após 11 anos tramitando na Câmara, o Projeto de Lei 285/99, que trata do uso da Mata Atlântica, foi votado hoje pelo plenário após muita negociação. O acordo que permitiu a votação da matéria entre foi fechado após reunião de ambientalistas, da bancada ruralista e governo com o líder do Governo na Câmara, deputado Aldo Rebelo. Mas até o final da tarde, pouco antes da votação pelo plenário, deputados ainda discutiam alguns artigos do texto.

De acordo com o Projeto, será proibido o desmatamento de vegetação primária para edificação ou loteamento, seja em áreas metropolitanas ou áreas urbanas. A retirada de vegetação secundária, em áreas urbanas, só será permitida para fins de loteamento se garantir a preservação nativa em no mínimo 50% da área total.

O projeto também define que para a concessão de incentivos econômicos deverão ser consideradas as características da área beneficiada, como a importância ambiental do ecossistema e da gleba, a existência de espécies da fauna e da flora ameaçadas de extinção, a relevância dos recursos hídricos, o valor turístico e ainda a capacidade de uso real e a sua produtividade. Além de incentivos tributários, o projeto prevê incentivos creditícios. O proprietário ou posseiro que tenha vegetação primária ou secundária em estágios avançado ou médio de regeneração receberá das instituições financeiras alguns benefícios, como prioridade na concessão de crédito agrícola, para os pequenos produtores rurais e populações tradicionais, além de prazo diferenciado para pagamento de débitos agrícolas e juros inferiores aos cobrados.

O texto final garantiu ainda a criação do Fundo de Restauração dos Ecossistemas Atlânticos. O Fundo será formado por recursos da União, por contribuições em dinheiro, valores, e bens que venha a receber de pessoas físicas e jurídicas, nacionais ou estrangeiras. Os recursos do Fundo serão destinados ao financiamento de projetos de restauração ambiental e de pesquisa científica.

Um dos pontos que estavam dificultando um consenso se referia à área da Mata Atlântica. Foram definidas como área integrante do Bioma Mata Atlântica as formações florestais nativas e ecossistemas associados com as delimitações estabelecidas em mapa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), como a mata de araucárias, manguezais, vegetações de restingas, campos de altitude, brejos interioranos, e encraves florestais do Nordeste. Também foi incluída e votada a emenda que propõe indenização para os proprietários prejudicados com a proibição de exploração do imóvel rural. O acordo decidiu pela preservação dos 7,2% restantes da cobertura original da Mata Atlântica.

Para o deputado Luciano Zica (PT-BA), que relatou as emendas, o projeto define um marco regulatório e cria condições para utilizar, de forma sustentável, o que resta da Mata Atlântica. "Colocamos um fim à devastação. Vamos garantir atividades econômicas com preservação. Foi consenso que eu mesmo não acreditava ser possível", afirmou o deputado em tom de comemoração. Zica disse que o projeto não é o dos sonhos dos ambientalistas, nem de uma ou outra corrente de pensamento, "mas é o projeto possível que garante a preservação do que resta do bioma". A estimativa é de que a Mata Atlântica vinha perdendo uma área equivalente a um campo de futebol a cada quatro minutos. O deputado Walter Pinheiro (PT-BA) chamou a atenção para o fato de que a floresta agora, passa a ter valor econômico. O setor florestal responde por 4% do PIB, produzindo US$ 20 bilhões por ano. O setor é responsável pela exportação de US$ 5 bi, o equivalente a 22% das exportações, além de gerar 2 milhões de empregos.

Em 11 anos, período de tramitação do projeto na Câmara dos Deputados, foi desmatado um milhão de hectare da Mata Atlântica. Os remanescentes da vegetação nativa de Mata Atlântica cobrem hoje menos de 7% do bioma original.

MINISTRA MARINA SILVA HOMENAGEADA

Após a votação, os deputados aplaudiram o resultado, junto com a ministra Marina Silva, que recebeu da organização não governamental SOS Mata Atlântica um vaso com bromélia. No plenário, a ministra disse que o momento é histórico e representa um compromisso do governo com o meio ambiente e um esforço do Congresso. O secretário de Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco, disse que a aprovação aconteceu graças ao governo que assumiu o projeto como prioridade. Capobianco salientou que a votação esclareceu definitivamente que o projeto não é um elemento inibidor do desenvolvimento. "Havia uma suspeição de que o projeto iria gerar imobilismo, prejudicar a produção; e podemos hoje demonstrar o lado positivo do projeto: o de como pode e não o projeto do não pode". Nos últimos onze anos, Capobianco acompanhou a tramitação do projeto como militante e membro de entidades ambientalistas.

O PL 285/99 é um substitutivo ao Projeto de Lei 3.285/92 apresentado pelo então deputado Fábio Feldmann. O texto recebeu mais de 80 emendas e foi discutido pelo Grupo de Trabalho criado na Câmara dos Deputados. A votação foi simbólica, aprovada por unanimidade. O projeto segue agora para apreciação do Senado.