Obras de infraestrutura representam possibilidades e riscos ao patrimônio histórico, dizem arqueólogos

14/09/2013 - 17h02

Flávia Villela
Repórter da Agência Brasil

Rio de Janeiro – O incremento da atividade econômica tem sido o principal vetor de crescimento das pesquisas arqueológicas no Brasil. Mas se por um lado, as centenas de obras de infraestrutura em território nacional têm possibilitado diversas descobertas, por outro, têm gerado a destruição do patrimônio histórico, segundo arqueólogos.

Para o arqueólogo Eduardo Neves, da Universidade de São Paulo (USP), a arqueologia brasileira vive um momento paradoxal. A economia aquecida, combinada às leis ambientais e patrimoniais motivaram nos últimos 20 anos a multiplicação de cursos de graduação e pós-graduação em arqueologia, além da geração de empregos e de investimentos em pesquisa. Entretanto, segundo ele parte do patrimônio arqueológico foi e está sendo destruído em nome do progresso. “Estamos estudando muita coisa, mas muito está sendo destruído e não temos noção do tamanho dessa destruição, que é irreversível”.

A crítica do arqueólogo refere-se à forma como a maioria das pesquisas está sendo desenvolvida nos últimos anos em canteiros de obras. Esse tipo de pesquisa é chamada de arqueologia de contrato ou preventiva e por uma imposição legal é realizada em obras que necessitam de licenças ambientais.

Dados do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) revelam que de 1991 a 2012, o Instituto aprovou 6.114 projetos, sendo mais de 5 mil relativos a esse tipo de arqueologia, advinda do licenciamento ambiental. Nos últimos dez anos, esse tipo de arqueologia mais que triplicou no país, sobretudo, devido às obras do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) e preparativas para os megaeventos.

Neves, que já trabalhou como consultor em algumas obras de infraestrutura pelo país, dedica-se hoje exclusivamente à academia. Especialista em arqueologia na região amazônica, ele tem recordações desagradáveis das pesquisas que fez em grandes empreendimentos e afirmou que boa parte do patrimônio encontrado acabou abandonada após o fim das obras.

Ele ressalta que o momento exige ações imediatas por parte das autoridades e da academia para garantir a sobrevivência desses bens culturais finitos. Todos os envolvidos no processo de resgate, pesquisa, preservação e difusão de conhecimento dos bens arqueológicos deveriam se unir e dialogar na busca de garantir a expansão das obras, sem comprometer o patrimônio arqueológico.

“O Brasil tem uma agenda de desenvolvimento muito intensa, tem um potencial de crescimento muito grande, pois passou muito tempo parado. Mas nesse processo, muita coisa está se perdendo. Talvez a troca de experiências e a cooperação entre governo, acadêmicos e empresários possam reverter isso. O desafio é de todos”, declarou ele.

Para a diretora do escritório de arqueologia Scientia Consultoria, Maria do Carmo Mattos Monteiro dos Santos, a arqueologia de contrato ou preventiva não difere em nada da arqueologia acadêmica em seu objetivo central de resgatar, estudar e preservar o patrimônio cultural. “A diferença é o cronograma e o orçamento fechados. Mas não acho que isso represente prejuízo científico”, contou. “Temos um levantamento de vários estudantes da Universidade do Estado de São Paulo (USP) fazendo pesquisas com temas advindos da arqueologia preventiva”.

Maria do Carmo lamentou, no entanto, que pouco do que é descoberto é divulgado à população. “A socialização do conhecimento, dos resultados por meio da educação patrimonial, não está acontecendo na velocidade ideal”. Ela lembrou que a educação patrimonial, que envolve projetos de divulgação sobre os achados arqueológicos às populações diretamente envolvidas, é uma exigência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) há pouco mais de dez anos. “Está havendo uma evolução gradual e contínua dessas ações, graças a atuação do Iphan”.

Edição: Denise Griesinger
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