Brasil e ONU firmam parceria para continuar programa de nutrição de indígenas

28/05/2013 - 19h08

Thais Leitão
Repórter da Agência Brasil

Brasília - O fortalecimento da organização social em comunidades indígenas e a disseminação de noções de políticas públicas voltadas à garantia de direitos dessa parcela de brasileiros são os principais ganhos com a implementação do Programa Conjunto de Segurança Alimentar e Nutricional de Mulheres e Crianças Indígenas, apontados por lideranças de diversas etnias. Para garantir que as ações tenham sustentabilidade e sejam multiplicadas em outras comunidades, representantes do governo brasileiro e da Organização das Nações Unidas (ONU) assinaram hoje (28), durante evento que marcou o encerramento do programa, uma carta de intenções para dar continuidade aos trabalhos.

A ideia, segundo o coordenador nacional do programa, Fernando Moretti, é transformar as boas práticas em políticas públicas que serão implementadas a partir do ano que vem.

O programa, desenvolvido pelo governo brasileiro em parceria com a ONU, foi executado entre 2010 e 2013 nos municípios de Benjamin Constant, São Paulo de Olivença e Tabatinga, todos na região do Alto Rio Solimões, no Amazonas; e em Dourados, em Mato Grosso do Sul.

"O programa é uma iniciativa do Fundo para o Alcance dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, graças a uma doação [de recursos] do governo da Espanha, mas é um programa do Brasil, que teve apoio das Nações Unidas. Isso significa que o governo vai incorporar as boas práticas implementadas nesses três anos e dar continuidade, tendo concluído o projeto, a essas ações como políticas públicas. Estamos no processo de avaliação das experiências, vamos ver o que pode ser melhorado e a partir daí projetar as próximas ações", explicou.

Segundo ele, entre as práticas que deram certo estão as ações de apoio à extensão e técnica rural, oficinas de capacitação em alimentação saudável e a criação de hortas escolares.

Durante o evento, lideranças indígenas enfatizaram uma preocupação crescente em suas comunidades relacionada à substituição de alimentos tradicionais por produtos industrializados e menos saudáveis. Segundo Eldson Pandero Maurício, liderança da aldeia de Santa Maria da Colônia, no Amazonas, onde vivem cerca de 460 índios da etnia Kokama, frutas comuns na região, como açaí e tucumã, têm dado lugar aos itens comprados.

"Temos tantos alimentos saudáveis, com vitaminas importantes para a saúde, produzidos na nossa região e muitas mães acabam sendo influenciadas pelo capitalismo e se rendem aos produtos industrializados que não fazem bem à saúde das crianças", disse, lembrando que em uma das ações do programa, foi montada uma feira com produtos típicos da região. Na ocasião, nutricionistas exlicaram às mães os benefícios nutricionais de cada uma delas.

Ele enfatizou que outra preocupação é em relação ao fortalecimento do cultivo sustentável e da comercialização dos produtos.

Na avaliação do representante das sete escolas indígenas de Dourados (MS), Laucídio Ribeiro Flores, da etnia Terena, a criação de hortas comunitárias foi a ação que trouxe mais impacto. Segundo ele, a iniciativa é baseada em instrumentos pedagógicos, que incentivam o raciocínio matemático, por exemplo, capazes de estimular também a alimentação saudável entre os estudantes, que replicaram a iniciativa em suas casas, montando hortas para as famílias.

Flores defendeu, no entanto, a aceleração do processo de demarcação das terras indígenas como forma de garantir o fortalecimento dessas ações. "Sem terra, não temos como plantar e produzir, ações fundamentais para garantir a segurança alimentar do nosso povo", disse. No município de Dourados, vivem 14 mil índios - entre terenas, kaiowás e nhandevas - em 3,5 mil hectares.

Durante o evento, como resultado de oficinas de capacitação do programa, jovens indígenas comunicadores lançaram um portal na internet por meio do qual pretendem valorizar sua cultura e suas práticas, principalmente voltadas à alimentação.

"Vamos divulgar receitas de comidas a base de produtos tradicionais, como peixe assado e mujica [prato feito com banana verde], e de bebidas, como a kaitsuma e pajuaru. Queremos valorizar e divulgar nossa cultura, usando os meios de comunicação para isso", disse Gracildo Moraes, da etnia Kokama, que foi capacitado durante o projeto e hoje é monitor em oficinas de comunicação em comunidades indígenas.

A representante adjunta do Programa Cidadania dos Adolescentes do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) no Brasil, Antonella Scolamiero, ressaltou a importância de ações voltadas a jovens indígenas, grupo com alta taxa de suicídio por causa do preconceito a que são submetidos e pela falta de oportunidades. Ela enfatizou que apesar dos avanços que o Brasil vem conquistando na área de direitos da infância, quando se observam apenas as crianças indígenas "o cenário ainda é muito desafiador".

"As estatísticas mostram que a desnutrição ainda é uma das principais causas das mortes de crianças indígenas e que apesar da redução na taxa de mortalidade infantil no país, ela é duas vezes maior para a população indígena do que para a população em geral, chegando a sete vezes mais em algumas regiões", disse.

O Programa Conjunto de Segurança Alimentar e Nutricional de Mulheres e Crianças Indígenas faz parte de uma série de iniciativas financiadas por meio do Fundo para o Alcance dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e apoiadas pela ONU. Ao todo, desde 2007, foram financiados 130 programas em 50 países.

 

Edição: Carolina Pimentel

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