Advogado compara caso de garoto desaparecido há oito anos com o de Eliza Samudio

22/04/2013 - 20h01

Alex Rodrigues
Repórter Agência Brasil

Brasília -  Para o advogado Alan Hahnemann Ferreira, que desde o ano passado representa gratuitamente a mãe do adolescente Murilo Soares, desaparecido há oito anos, a decisão da Justiça de Goiás de arquivar as acusações de envolvimento de oito policiais militares da Rondas Ostensivas Táticas Metropolitanas (Rotam) no sumiço de Murilo e a não resolução de mais 38 casos de desaparecimento após a abordagem de policiais militares deve-se principalmente à “falta de atenção do Poder Judiciário” goiano.

O advogado admite que o caso é complexo, já que os corpos de Murilo e do servente Paulo Sérgio Pereira Rodrigues, de 21 anos, amigo da família de Murilo e que estava com ele no momento da abordagem policial, em 22 de abril de 2005, nunca foram encontrados, mas o compara com o julgamento do ex-goleiro do Flamengo, Bruno Fernandes, condenado a 22 anos por matar Eliza Samudio, para mostrar as diferenças entre a Justiça mineira e a goiana. Diferença, segundo ele, resultante da pouca atenção dada aos desaparecimentos goianos.

“Nos dois casos não há um corpo. No caso do Bruno, há testemunhos, às vezes dos próprios coautores [acusados pelo crime]. E foram esses elementos que ajudaram a formar o chamado corpo de delito [indícios que ajudam a corroborar a tese de que houve um crime]. Já no caso do Murilo há muito mais depoimentos que no caso Bruno. Inclusive de testemunhas que não tem nenhuma relação com ele. Há também gravações de conversas entre dois policiais. Sangue no interior da viatura identificada a partir dos testemunhos – mesmo que esse sangue não tenha sido submetido a exames adequados. Ou seja, há provas mais que suficientes para formar o corpo de delito indireto”, disse o advogado, sugerindo que um dos fatores que podem explicar a diferença de tratamento entre os casos do ex-goleiro e do adolescente goiano é a grande repercussão midiática do primeiro.

“A exceção de alguns veículos impressos, e muito por iniciativa de uns poucos jornalistas, a mídia local tem um receio enorme de tratar desses temas. Aí, sem isso, fica uma briga de Davi contra Golias. Com certeza, sem essa atenção, não há a necessária mobilização da sociedade. Logo, não há pressão pela resolução desses casos”, disse o advogado à Agência Brasil hoje (22), dia em que o desaparecimento de Murilo e de Rodrigues completa oito anos sem que ninguém tenha sido punido.

Considerado por organizações de defesa dos direitos humanos como o mais emblemático dos casos de desaparecimento associados à violência de policiais goianos, Murilo tinha 12 anos na época dos fatos. Segundo sua mãe, a dona de casa Maria das Graças Soares, a pedido do pai, que tinha que trabalhar, o adolescente voltava para casa de carona com Rodrigues quando foram parados em uma blitz policial. Rodrigues tinha antecedentes criminais. Segundo Graça, isso não justifica o que ocorreu, mas pode indicar que seu filho “estava no lugar errado, na hora errada e com a pessoa errada”.

De acordo com o advogado, há cerca de 30 pessoas que testemunharam ter presenciado algo que confirma a versão do envolvimento policial no desaparecimento de Murilo e de Rodrigues, cujo carro foi encontrado no dia seguinte, carbonizado. Mesmo assim, a Justiça goiana decretou que o caso fosse arquivado por falta de provas materiais, pois os dois corpos nunca foram encontrados. Com isso, os oito policiais acusados foram inocentados. Procurada para comentar o caso, o Tribunal de Justiça de Goiás informou apenas que o caso depende do julgamento de um agravo pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

“Há uma falta de atenção, um descuido com essas 39 pessoas desaparecidas”, disse Ferreira. “O Poder Judiciário goiano muitas vezes assumiu uma visão muito legalista e, com isso, acaba protegendo os policiais acusados. Vemos isso nas sentenças de arquivamento de processos e de áudios e no próprio desenrolar das investigações”, disse o advogado.

Por meio do chefe de Comunicação Social, coronel Anésio Barbosa Júnior, a Polícia Militar de Goiás informou que acompanha os desdobramentos do caso, classificado como “extremamente complexo”. A corporação garante ter interesse em que os fatos sejam devidamente esclarecidos para que, se comprovadas as acusações, os eventuais responsáveis sejam punidos ou para que, caso nada seja provado, não restem dúvidas sobre a atuação de quaisquer servidores públicos ou da corporação.

Edição: Fábio Massalli

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