Para especialistas, governo não deve afrouxar cortes no Orçamento por causa de recorde na arrecadação

26/02/2012 - 11h50

Wellton Máximo
Repórter da Agência Brasil

Brasília – A arrecadação recorde de R$ 102,5 bilhões em janeiro não deve servir de justificativa para um eventual afrouxamento nos cortes no Orçamento. Segundo especialistas, o comportamento observado no mês passado, quando a entrada de recursos no caixa do governo superou as previsões, não deve se repetir nos próximos meses. Os números da arrecadação de janeiro foram divulgados sexta-feira (24) pela Receita Federal,

Para os economistas, o recorde histórico na arrecadação mensal deveu-se muito mais a fatores atípicos do que ao desempenho da economia, que está em desaceleração. As receitas do governo foram influenciadas em janeiro pelo pagamento de R$ 5,2 bilhões de royalties do petróleo e pelo recolhimento em atraso de R$ 1,2 bilhão de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) por empresas dos setores de bebidas e automóveis.

“São processos episódicos, que acontecem apenas uma vez”, destaca o economista chefe do banco SulAmerica ING, Newton Rosa. Para os próximos meses, ele acredita que o ritmo da arrecadação cairá, possivelmente a partir de fevereiro. “O quadro para as empresas não está muito bom. Por causa da desaceleração da economia, as empresas terão rendimento menor, o que se refletirá na arrecadação”, avalia.

Em relação ao impacto que a arrecadação recorde terá sobre as contas do governo, Newton Rosa adverte que a equipe econômica deve continuar cautelosa em relação aos gastos públicos. “O governo deve se manter prudente, principalmente se quer entregar superávit primário [economia de recursos para pagar os juros da dívida pública] de 3,1% do PIB [Produto Interno Bruto]”, diz. Neste ano, a meta de superávit primário do governo federal, estados e municípios corresponde a R$ 140 bilhões.

Para atingir o superávit primário estipulado, o governo promove cortes no Orçamento todos os anos. O bloqueio de verbas atingiu R$ 55 bilhões em 2012. O valor, no entanto, pode ser reduzido ao longo do ano, caso a arrecadação supere o previsto. No ano passado, o governo tinha cortado R$ 50 bilhões, mas o valor final do contingenciamento ficou em R$ 38 bilhões porque a previsão de receitas foi reajustada no segundo semestre.

A economista sênior para a América Latina do Banco RBS, Zeina Latif, também diz que a arrecadação de janeiro não deve servir de base para qualquer aumento de gastos nos próximos meses. “O ano está começando agora e ainda há muita incerteza em relação ao desempenho da arrecadação em 2012. A tendência de desaceleração continua, e ainda é cedo para dizer se as estimativas de receitas no Orçamento para o ano serão superadas.”

Além das incertezas em relação ao comportamento das receitas federais, Zeina espera que o esforço do governo para que o Banco Central continue a reduzir a taxa Selic (que indica os juros básicos da economia) consiga frear qualquer impulso de ampliação dos gastos públicos. “Com o Banco Central realizando cortes e almejando taxa de juros de um dígito, é difícil acreditar que o governo mude a estratégia de conter gastos e abrir espaço para a redução da Selic”, diz Zeina.

Edição: Nádia Franco