População deve ajudar a fiscalizar aplicação das verbas emergenciais, dizem CGU e PF

05/02/2012 - 14h38

Pedro Peduzzi
Repórter da Agência Brasil

Brasília – As tragédias naturais que costumam ocorrer no Brasil durante o verão, em meio às chuvas no Sudeste e no Nordeste ou à seca no Sul, permitem que, a partir da declaração de uma situação de emergência ou de calamidade por estados ou municípios, o Poder Público dispense a licitação para a compra de produtos ou a contratação de serviços emergenciais. Para a Polícia Federal (PF) e a Controladoria-Geral da União (CGU), apesar de necessária, essa norma acaba facilitando o desvio de dinheiro público. Mas isso pode ser contornado com a ajuda da própria população, segundo a PF e a CGU.

“É de fundamental importância a fiscalização de gastos públicos emergenciais por parte da sociedade civil”, defende o diretor da Divisão de Repressão a Crimes Fazendários (Dicor) da PF, Oslain Campos Santana. “Nunca vamos dar conta de fiscalizar tudo. Por isso, nosso maior investimento tem sido na transparência. O acompanhamento feito pela CGU sobre as verbas emergenciais, a exemplo das demais, é feito por amostragem”, completou o secretário executivo da CGU, Luiz Navarro.

Em entrevista à Agência Brasil, Navarro destacou que o Portal da Transparência, criado em 2004, permite ao cidadão acompanhar a aplicação dos recursos públicos. “Precisamos muito da colaboração da sociedade. É ela que melhor pode saber se os recursos estão sendo corretamente utilizados, a partir dos dados disponibilizados em nossa página na internet. Essa e outras ferramentas já estão à disposição [da população]”, disse referindo-se ao portais ComprasNet, do Ministério do Planejamento, e dos tribunais de Conta estaduais e da União. “Basta comparar o que consta [nesses sites] com o que foi executado”, acrescentou.

Segundo Navarro, a navegação no Portal da Transparência é simples. “Tem até glossário para explicar os termos técnicos que costumam ser utilizados”. A dificuldade maior, acrescenta, pode ser identificar, por meio do CNPJ, a pessoa jurídica (empresa) responsável pela prestação do serviço. “Mas isso é fácil para a CGU, que pode identificá-la com facilidade. Basta, portanto, o cidadão encaminhar suas suspeitas por meio do Fale Conosco do portal”.

De acordo com levantamento da PF e da CGU, é grande a lista de fraudes cometidas a partir de situações emergenciais. Entre as fraudes, a PF destaca o uso de material fora dos padrões contratados (material de qualidade ou quantidade inferior, por exemplo); a cobrança por serviços não prestados ou prestados parcialmente; o superfaturamento de preços e valores; e pagamentos fora do estabelecido no contrato (ver infográfico abaixo).

Há ainda riscos decorrentes da pressa. “Como a contratação é feita sem licitação, esses projetos costumam ser apresentados de forma inadequada e muito genérica. Isso acaba fazendo com que os gastos fiquem mais altos do que o esperado. O ideal, claro, é que tenhamos um projeto básico bom e bem descrito. Mas é óbvio que em casos emergenciais isso nem sempre é possível de ser feito”, explicou Navarro.

Para o delegado federal Rodrigo Bastos, da Dicor, ainda que não precedida de licitação, essa modalidade de contratação emergencial “deve observar os princípios jurídicos aplicáveis à administração pública, inclusive a isonomia de tratamento dos potenciais contratantes e a busca da melhor solução”.

Segundo o presidente da Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF), Hélio Buchmüller, a população deve ficar atenta para a contratação de serviços que não tenham relação com a tragédia ou que não sejam emergenciais, assim como para serviços com prazo de execução muito longo.

A lei prevê a contratação emergencial para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 dias consecutivos e ininterruptos”, destacou Buchmüller, com base em informações repassadas pelos peritos lotados no Setor de Perícias em Engenharia e Meio Ambiente (Sepema), do Instituto Nacional de Criminalística (INC).

De acordo com Navarro, “há casos de declarações falsas, como pontes que não caíram, alagamentos e destruição de casas e estradas que não ocorreram. Na declaração do prefeito ou do governador, o exagero dos números é um artifício usado na tentativa de obtenção de mais recursos”.

Como nem sempre o Poder Público tem condições de checar todas as informações apresentadas pelas autoridades locais, em muitos casos cabe à população ficar atenta sobre a atuação das autoridades locais, reforça o secretário executivo da CGU.

“As pessoas precisam saber que todo documento público é público se não for declarado sigiloso. Ou seja, basta ir à prefeitura e falar 'quero consultar o processo da obra tal', cientes de que a ocultação de documento público [pela autoridade] é crime”, acrescentou Buchmüller.

Edição: Lílian Beraldo, Aécio Amado e Juliana Andrade