Conselheiro do CNJ critica preferência de casais por crianças brancas e pequenas na hora da adoção

25/05/2011 - 20h24

Débora Zampier
Repórter da Agência Brasil

Brasília – Os números deixam claro que a matemática da adoção no país está longe de um resultado satisfatório. Segundo o Cadastro Nacional da Adoção (CNA), a quantidade de famílias aptas a adotar no país supera em quase sete vezes o número de crianças e adolescentes prontos para terem um novo lar. Mas, apesar da enorme procura, 70% desses casais querem crianças de cor branca e 80%, crianças com até 3 anos de idade.

Para Paulo Tamburini, conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e um dos responsáveis pela implantação do cadastro nacional, o problema hoje não está mais na falta de informação, mas na cultura do brasileiro.

“Eu, se fosse fazer uma análise fria dos dados que nós recebemos, diria que a maioria dos pretendentes da adoção sofre de eugenia [termo relativo ao estudo da perfeição genética]. Querem crianças perfeitas e se pudessem fazê-los geneticamente seria ainda melhor”, disse Tamburini, em palestra que comemorou o Dia Nacional da Adoção no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Tamburini criticou a preferência por crianças de cor branca e menores. “Do jeito que está, a adoção parece um supermercado. Daqui a pouco, vão fazer a adoção pela internet, vem pelo Sedex a criança, com o desenho do modelo de criança que elas [as famílias] querem. Temos que enfrentar esse paradigma antes de estimular a adoção”, apontou.

O conselheiro diz que não esperava encontrar tantos empecilhos para a adoção quando se tornou um dos entusiastas do CNA, em 2008. “Suamos a camisa indo de Norte a Sul do país fazendo propaganda, informando as pessoas que agora existe esse tipo de ferramenta que facilita a adoção onde quer que tenha criança apta à adoção e [candidatos a] pais. Óbvio que encontramos pessoas de boa vontade, parecia uma maravilha, mas confesso que não encontrei ressonância nos tribunais e nem nos juízes”.

O conselheiro lamentou a falta de vocação de juízes que se candidatam a varas da Infância e da Juventude com o objetivo de fazer carreira e também o fato de os juízes vocacionados dessas varas sofrerem preconceito na hora de pleitear uma promoção. Tamburini criticou ainda os tribunais por não terem acolhido a proposta de orçamento para as coordenadorias específicas de adoção.

Desde quando foi criado, em 2008, os números do CNA têm melhorado em termos proporcionais. No primeiro ano, eram 4.106 pretendentes para 469 crianças e adolescentes; em 2009, a proporção passou a 22.390 pretendentes para 3.277 possíveis filhos. Neste ano, são 26.694 pretendentes para 4.427 crianças.

Ainda assim, Tamburini alerta para o fenômeno cultural que persiste. “A mentalidade do brasileiro não mudou. Quem diz que brasileiro é bonzinho, alegre e feliz, é mentira. Quando vejo que só querem uma criança pequena e branca, me parece que falta aquele espírito humano de solidariedade e amor que ocorre quando a mulher fica grávida e sabe que vai amar qualquer um que nascer”.

Edição: Lana Cristina//O título foi alterado