Matrícula em regime especial pode ajudar a levar educação para ciganos nômades

24/05/2011 - 10h32

 

 

Isabela Vieira
Repórter da Agência Brasil

 

Rio de Janeiro - Frequentar escolas ou ser atendido em unidades de saúde não são direitos acessíveis para muitos ciganos que vivem em acampamentos no país. Ao lado do preconceito que faz com que muitos pais evitem matricular seus filhos na escola, o acesso a direitos básicos é dificultado pela falta de políticas públicas que levem em conta o fato de muitas comunidades serem nômades e não terem endereço fixo.

Mas, assim como os pais que trabalham em circos e migram com frequência de uma cidade para outra, os ciganos também podem matricular seus filhos nas escolas, em regime sazonal, durante um semestre em vez de um ano. Segundo o Ministério da Educação (MEC), nenhuma unidade pode negar uma matrícula, ainda que o aluno não tenha documentos ou certificados de escolas anteriores.

"Os circenses foram atrás desse direito, das escolas sazonais, que são para pessoas que caminham, que não têm endereço. Isso existe por toda a Europa. O problema aqui é que os ciganos nômades não conhecem a lei, só quando coincide de a população ser nômade e circense", constata a pesquisadora Cristina da Costa Pereira, autora de Os Ciganos Ainda Estão na Estrada.

Do grupo Calom, o professor da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Jucelho Dantas da Cruz, de 48 anos, que ainda tem família vivendo em acampamentos na Bahia, é o único de 11 irmãos que completou os estudos, depois que os pais passaram a morar em uma casa.

Para ele, além de esclarecer as comunidades sobre as escolas sazonais, é preciso desafiar a cultura machista de muitos ciganos que não permitem que as filhas frequentem a escola.

"Muitas mulheres são semialfabetizadas. Sei que a tradição é uma coisa, mas respeitar os direitos de cada individuo é fundamental", completa o cigano, que mantém as tradições, como a língua, mesmo não morando em acampamento há anos.

Como os ciganos nômades não têm endereço fixo, tirar documentos também é um problema, o que dificulta o cadastro em programas sociais do governo, como o Bolsa Família. Sem esses dados, ciganos nômades também não têm acesso a atendimento em unidades de saúde.

"Muitos são nômades, não têm endereço, não tem CEP. Não podem provar que moram numa casa, não têm conta de água e luz. E, sem residência fixa, precisam que o governo vá aos acampamentos tirar os documentos e fazer o cadastro para programas como o Bolsa Família", diz o presidente da União Cigana do Brasil, Mio Vacite, do grupo Rom.

A falta de moradia fixa também faz com que muitos ciganos não sejam atendidos em unidades de saúde, que exigem o endereço do paciente para colocar no prontuário. O Ministério da Saúde precisou editar uma portaria, em abril deste ano, para assegurar que ciganos e moradores de rua, por exemplo, recebam atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS).

As irmãs Sara e Sandra Rocha, moradoras de um acampamento cigano em Planaltina de Goiás, não existem para o Estado brasileiro. Elas têm 17 e 19 anos, respectivamente, e até hoje não têm certidão de nascimento. O pai não fez o registro das meninas por desconhecer a lei e temer preconceito no cartório. Elas nunca frequentaram uma escola e têm dificuldades para receber atendimento em hospitais públicos. "É ruim não ter documento porque a gente não pode estudar, não pode trabalhar, fica inválida", disse Sara.

A Secretaria de Direitos Humanos, que desenvolve ações  para emissão de documentos em comunidades tradicionais como indígenas, quilombolas e ribeirinhas, informou que não existe nenhum programa específico para os acampamentos ciganos.

 

 

Edição: Juliana Andrade e Lílian Beraldo