Repressão policial foi catalisador do movimento que reuniu 65 mil pessoas em São Paulo, apontam especialistas

18/06/2013 - 17h41

Camila Maciel
Repórter da Agência Brasil

São Paulo - A repressão policial aos manifestantes que protestavam contra o aumento da passagem de transporte público na última quinta-feira (13) foi o principal catalisador para que o movimento ganhasse força e reunisse 65 mil pessoas ontem (17) nas ruas da capital paulista. Além desse fator, especialistas ouvidos pela Agência Brasil conjugam outros dois itens para a composição desse cenário de mobilização de massas: insatisfação com questões políticas e sociais que estava represada e conjuntura internacional explosiva com manifestos eclodindo em diversos países, a exemplo da Turquia.

Na avaliação do cientista político Cláudio Couto, professor Fundação Getulio Vargas (FGV), a demanda inicial por transporte público apresenta uma capacidade de mobilização mais restrita. "As pessoas querem ter liberdade de manifestação, independentemente de qual seja a pauta. Falar isso não é reduzir a importância da questão do transporte. É uma questão crucial e tem um custo elevado para as famílias. Mas, quando você tem um elemento que une diferentes setores, você consegue realmente galvanizar apoio, sobretudo, quando ele assume um caráter dramático", disse.

O cientista político Pedro Fassoni Arruda, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, compartilha da mesma opinião. "Isso contribuiu bastante [para aumentar o número de manifestantes]. Até mesmo tradicionais veículos de comunicação mudaram o discurso adotado inicialmente, quando se referiam aos manifestantes como vândalos, e passaram a denunciar a truculência policial", declarou. Ele acredita que a forma pacífica como transcorreu o sexto ato da série de mobilizações reforçou o argumento de que os conflitos não foram provocados pelos manifestantes.

Couto avalia que a ação policial é uma questão que tende a aflorar e pode se tornar uma das pautas dos protestos. "Temos uma Polícia Militar que não mudou com a chegada da democracia. Continuou com o modo de atuar na ditadura. Essa maneira de agir da polícia, que é muito letal, é um tema que também precisará ser levantado", propôs. Ele acredita que manter um foco definido é fundamental para que não se perca a capacidade de mobilização. "Uma pulverização de temas acaba muitas vezes enfraquecendo o movimento", declarou.

O sociólogo Ricardo Antunes, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), aponta que, além da postura policial que engrossou a última manifestação, os protestos em várias capitais do país expressam um "descontentamento latente" com a política e com a qualidade do serviço público. Aumento do custo de vida, casos de corrupção, distanciamento entre o Poder Legislativo e a população, descaso com a saúde pública, problemas com mobilidade urbana nas grandes cidades são alguns dos exemplos trazidos pelo pesquisador.

"O projeto em curso nos últimos anos que beneficia classes dominantes, setor financeiro, agronegócio, indústria de minério, mesmo que combinado com a minimização dos níveis de miserabilidade no país, não altera estruturalmente o caso brasileiro", avalia. Ele acredita que esse cenário, que começou a ser construído na década de 1990 com implementação do neoliberalismo, ficou encoberto por avanços pontuais. Antunes cita, entre as melhorias, o aumento do salário mínimo e o crescimento econômico, que, na avaliação dele, não mudam de fato a condição de vida do brasileiro.

O professor da Unicamp destaca que isso se soma a um cenário internacional que provoca um "efeito demonstração". "Nos últimos dois anos, a Grécia, Espanha, Portugal, os Estados Unidos, países do Oriente Médio. Mais recentemente, a Turquia", enumerou. Todo esse movimento, segundo Antunes, ganha maior proporção com a internet. "A comunicação não depende mais da mídia oficial. Enquanto as mídias falam de vândalos que querem tomar de assalto a cidade, as redes falam dos jovens descontentes", disse.

 

Edição: Aécio Amado

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