Pollyane Marques
Repórter do Radiojornalismo da EBC
Brasília - A educação é um direito de todos, garantido pela Constituição. Em 2011 foram matriculadas mais de 558 mil crianças com necessidades educacionais especiais no Brasil. Há dez anos, o número não chegava a 142 mil. O diferencial é que hoje as escolas públicas e privadas devem garantir o acesso e a permanência desses estudantes no ensino regular e na educação especial.
Algumas crianças precisam de um pouco mais de atenção. É o caso das crianças com autismo, o transtorno do desenvolvimento global. Essas crianças têm dificuldade de criar vínculos com outras pessoas, de comunicação e de socialização. Como se trata de um transtorno, o autismo é uma diferença e não uma deficiência. Muitas dessas crianças têm um grau de inteligência elevado: algumas vezes parecem mais desatentas ao ambiente, embora isso não signifique que estejam alheias ao que acontece à sua volta.
Trabalhar na educação de crianças com esse transtorno exige muito do educador. Sheila Nantes é mãe de duas crianças com autismo: Vítor, de 14 anos, e Vinícius, com 10, matriculados na rede pública de ensino do Distrito Federal. Para a mãe, encontrar vagas não foi problema. O problema é a capacitação dos professores. Exemplo disso é que a mãe teve de trocar um dos filhos de escola, por ele ter sido deixado sozinho em sala de aula pela professora.
Sheila acredita que, além de capacitação, os professores devem ter vocação para a tarefa: “Não adianta só você te ter um diploma, você tem de ter dom. Criança especial é diferente, você tem que saber gostar, você tem de amar. Não adianta só chegar e dizer 'eu sou professora de ensino especial' só para ficar com um aluno na sala, só porque tem preguiça de dar aula para vários alunos. Assim, quem sofre são os pais e as crianças”, diz.
Uma das dificuldades na educação das crianças com autismo é a variedade das formas com que o transtorno se manifesta. Existem os que não falam, os que falam muito, os que não aceitam nenhum tipo de carinho e os extremamente carinhosos, os agressivos e os que ficam completamente alheios aos estímulos do ambiente.
Outra dificuldade passa pela falta de investimentos. A psicopedagoga Geici Mendes é professora de uma turma de educação especial no Distrito Federal. Na turma de Geici estudam dois alunos com graus diferentes de autismo. Ela conta que muitas vezes tirou dinheiro do próprio bolso para providenciar o material necessário para as aulas. Mas não se arrepende disso:
“Quando a criança dá o primeiro passo, os pais ficam felizes, acham aquela coisa maravilhosa. Aqui, quando eu vejo um progresso, mínimo que seja, é muito gratificante, eu comemoro com eles”, conta a professora.
O autismo é quatro vezes mais comum no sexo masculino do que no feminino. É encontrado em todo o mundo e em famílias de qualquer configuração racial, étnica e social e ainda não se conseguiu provar qualquer causa do transtorno. Mesmo assim, o preconceito é motivo de sofrimento para os pais. Muitos acham que a conscientização é a saída. É o caso de Cícero Santos, pai de Vitor e Vinícius, que evita as brigas com aqueles que não entendem seus filhos: “Eu passei por cima disso [do preconceito]. Às vezes eu ficava chateado, minha esposa até chorava. Hoje não, a gente procura passar para as pessoas o que aprendeu, quando uma pessoa não entende, a gente tenta explicar”, diz o pai.
Para a especialista em educação de crianças com autismo Márcia Lima, a compreensão e o apoio dos pais são fundamentais para o sucesso da criança: “É um processo muito complexo esse de se deparar com o diagnóstico. Depois que você entende, depois que você já amadureceu essa ideia, aí você é capaz de viver todas as possibilidades que esse filho pode te dar. Se para nós profissionais já é difícil, imagina para uma mãe que às vezes espera um 'eu te amo', ou um carinho que não vem. Então a gente tem pais que relutam muito em incluir seu filho na educação comum”, destaca a especialista.
Entre preconceitos, acolhimentos e superações, Sheila Nantes diz que iria até o final do mundo por um de seus filhos, e garante que não há nada mais satisfatório para uma mãe do que acompanhar a evolução da criança:
“Antes eu achava que nunca ia poder ver meu filho lendo ou escrevendo. E hoje eu vejo meu filho escrevendo, mesmo que com letrinhas tortas. Isso para mim é uma gratificação muito grande. Quando eu vejo meu filho escrevendo 'mãe' é como se eu estivesse vendo meu filho nascer”, conta Sheila emocionada.
Edição: José Romildo
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