Retirada de usuários de drogas das ruas foi ação de segurança pública e não de assistência social, diz promotor

24/12/2012 - 10h32

Akemi Nitahara
Repórter da Agência Brasil


Rio de Janeiro -  O promotor de Justiça de Defesa da Cidadania, Rogério Pacheco, criticou as operações, feitas ao longo dos últimos anos, para retirada de usuários de drogas das ruas do Rio de Janeiro. Na avaliação dele, as ações da Secretaria de Ordem Pública buscaram mais a perspectiva da segurança pública e não a da assistência social.

“São operações de enxugar gelo, porque as pessoas são recolhidas aos abrigos do município e lá não permanecem, porque esses abrigos ainda carecem de uma estrutura adequada e por conta da falta de uma política no município para o atendimento dessas pessoas.”

Desde março de 2011, a Secretaria Municipal de Assistência Social faz ações de retirada das ruas e acolhimento dos usuários, em parceria com órgãos de segurança. Em 2011, foram 63 operações que contabilizaram 2.924 acolhimentos, sendo 2.476 adultos e 448 crianças e adolescentes. Em 2012 foram 3.025 acolhimentos, com 2.695 adultos e 330 crianças e adolescentes, em 77 operações.

Apesar das críticas ao acolhimento de usuários de drogas, a subsecretária de Proteção Social Especial, Monica Blum, defende que o trabalho “é fundamentado, embora não seja perfeito”, mas que precisa envolver todos as esferas de governo. “O trabalho é dinâmico e vem sendo feito. Mas a política [de atendimento ao usuário] precisa ter todos os setores, serviços e esferas do governo juntas. O momento de recolher e levar para o abrigo é importante, mas não resolve”, admite Monica.

Para ela, é preciso discutir o que fazer com o usuário. “O usuário merece respeito e que sejam feitas políticas públicas para eles. Não podemos nos conformar com o que a gente faz, precisamos oferecer sempre algo melhor”, diz a subsecretária. De acordo com Monica, o governo está discutindo um novo modelo de atendimento.

Para crianças e adolescentes que tiverem a dependência química comprovada por especialistas, o abrigamento é compulsório. Ao serem localizados, esses jovens são encaminhados para uma das três centrais de recepção da Secretaria Municipal de Assistência Social, onde passam por triagem e avaliação psicológica, clínica e nutricional.

Durante o período de abrigamento compulsório, é feito um trabalho para a reaproximação com a família e a reinserção social, com matrícula na escola e em atividade complementar. A secretaria conta com cinco centros especializados de Atendimento à Dependência Química, além da Unidade Municipal Casa Viva, para o abrigamento compulsório. Todos têm equipes multidisciplinares compostas por médicos, enfermeiros, psicólogos, educadores, assistentes sociais e terapeutas ocupacionais. Ao todos, essas unidades oferecem 178 vagas. Atualmente, 123 crianças e adolescentes estão abrigadas compulsoriamente: 60% são meninos, metade tem entre 13 e 15 anos, 35% têm entre 16 e 17 anos e 15% são menores de 12 anos.

O crack foi a droga mais utilizada pelas crianças e pelos adolescentes abrigados, seguida pela maconha, cigarro, zirrê [droga que combina crack e maconha] e cocaína. Entre os acolhidos nas ruas e nas cracolândias, 40% foram encaminhados para a rede de proteção social e 60% são de outros municípios, sendo encaminhados para conselhos tutelares de suas regiões. Do total, 24% são reincidentes. Cerca de metade das crianças e adolescentes acolhidos compulsoriamente não recebeu uma única visita familiar.

No caso dos adultos, não há abrigamento compulsório. Mas para o usuário de droga que desejar atendimento, foi inaugurada, em 2011, a primeira Unidade Municipal de Reinserção Social Rio Acolhedor, com 422 vagas. No local, é feita avaliação e os usuários são orientados a procurar o atendimento contra a dependência química nos centros de Atenção Psicossocial (CAPs), mantidos pela Secretaria Municipal de Saúde.

Dentro do programa Rio Acolhedor, os abrigados têm oportunidade de fazer alfabetização para jovens e adultos, capacitação profissional, esportes e apoio a dependentes químicos, além de poder tirar nova documentação. As equipes contam com assistentes sociais, educadores, psicólogos, pedagogos, fonoaudiólogos, professores de educação física, enfermeira e nutricionista. São 438 vagas em unidades próprias do município e 100 vagas em instituições conveniadas.

De acordo com perfil traçado pela Secretaria Municipal de Assistência Social, a população de rua adulta do Rio de Janeiro é composta, na maioria, por homens (76%). O principal motivo que leva as pessoas a essa situação é o alcoolismo e o uso de drogas (58%), seguido de conflito familiar (26%) e desemprego (10%). Aparecem também como motivo a violência na comunidade (4%) e a situação de exploração sexual (2%).

A coordenadora-geral de serviços de acolhimento do Ministério do Desenvolvimento Social e Combater à Fome, Mariana de Sousa Machado Neris, lembra que o problema é muito amplo e exige atenção individualizada. “Não existe um sujeito claramente identificável como usuário de droga, são de todas as idades, gêneros, classes sociais, religiões, posições sociais. Cada experiência é uma vivência singular”.

De acordo com ela, o desafio é desmascarar o problema do crack para identificar os outros problemas do usuário. “A abordagem tem que romper com a linha higienista, que leva o usuário à privação de liberdade, para desenvolver uma estratégia integrada e integral, reconhecendo o usuário como sujeito de direito, sem estigmatizar. A responsabilidade é compartilhada entre os níveis da Federação.”

A Polícia Militar informa que apreendeu, de janeiro a novembro deste ano, 103.399 pedras de crack em toda a cidade. Dentro do programa federal Crack, É Possível Vencer, foram formados 48 operadores de segurança, entre eles, policiais militares, civis e guardas municipais, para atuar no combate à droga.
 

 

Edição: Lílian Beraldo