Relatório critica falta de política de eficiência no setor elétrico

12/11/2012 - 14h21

Carolina Gonçalves
Repórter da Agência Brasil

 

Brasília – O Brasil perde mais de 20% da energia no sistema de transmissão elétrica, ou seja, no processo de transferência das usinas até os polos consumidores. O prejuízo fica com a população que tem pago contas mais altas e sofrido com apagões. A constatação faz parte da segunda edição do relatório O Setor Elétrico Brasileiro e a Sustentabilidade, divulgado hoje (12), em São Paulo, por um grupo de organizações não governamentais (ONGs) que têm acompanhado o setor.

Ainda segundo o estudo, as perdas no sistema de transmissão de energia elétrica não chegam a 6% no Chile e, na Europa, está em 7%.

O cálculo apresentado no documento é resultado de uma auditoria feita pelo Tribunal de Contas da União (TCU), em 2007, quando o órgão avaliou o impacto dessas perdas, apontando deficiências no sistema de transmissão. Para as ONGs, a atual estratégia do governo, que tem investido na construção de hidrelétricas distantes das grandes cidades, pode agravar ainda mais a situação. A principal crítica diz respeito ao custo da transmissão da energia produzida a longas distâncias dos polos consumidores.

“As consequências da transmissão de longa distância, que ainda carecem de manutenção, são claramente perceptíveis pela população, afinal, as falhas nas linhas de transmissão, muitas vezes, acarretam nos denominados ‘apagões’ que se tornaram recorrentes na realidade da população brasileira nos últimos anos”, destaca a advogada Oriana Rey, assessora do Programa Ecofinanças da Amigos da Terra - Amazônia Brasileira.

O relatório do TCU também estimou que, em termos percentuais, o impacto das perdas sobre a tarifa média chega a 5%. Ao contabilizar a energia não faturada e o imposto que deixa de ser recolhido, os cofres públicos perderam cerca de R$ 10 bilhões, somente em 2007.

A pesquisadora ainda lembrou que, em fevereiro do ano passado, 33 milhões de habitantes de oito estados ficaram sem luz por aproximadamente quatro horas. Em novembro de 2009, problemas nas linhas de transmissão de Itaipu atingiram 70 milhões de habitantes de 18 estados brasileiros.

Para os autores do estudo, se houvesse investimento adequado para melhorar a eficiência do sistema de transmissão de energia elétrica brasileiro seria possível reduzir as pressões para construção de novas hidrelétricas na região amazônica – estratégia que vem sendo criticada pelos movimentos sociais.

As ONGs afirmam que a política do setor não considera as reais consequências ambientais e sociais provocadas por esses empreendimentos. Segundo o estudo, os impactos têm sido subdimensionados nos estudos de inventário de bacia e Estudos de Impacto Ambiental (EIA), elaborados pelo setor elétrico do governo e por empreendedores privados.

Para o ecólogo Philip Fearnside, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), a energia produzida por essas hidrelétricas “não é verde nem barata”. Ele destaca que, além do impacto sobre a vida das pessoas, que, na Amazônia dependem fortemente dos rios, as barragens que formam lagos na região agravam os níveis de emissões de gases do efeito estufa. “Não tem oxigênio no fundo dos lagos, o que leva à formação de [gás] metano e pode formar também metil mercúrio [substância que pode ser fatal para a cadeia que vai da mata ciliar, aos animais e pode chegar ao homem]”, explicou.

“Se for contar os custos reais não é [uma energia] mais barata. É mais barata porque ninguém está pagando pelo impacto humano e pela perda da biodiversidade e pelas emissões [de gases de efeito estufa]”, disse.

Segundo ele, apesar desses impactos, as hidrelétricas são “altamente subsidiadas pelo governo brasileiro”. Pelas contas do pesquisador, o spread (diferença entre a taxa de captação do dinheiro e a taxa cobrada do cliente) estipulado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para investimentos em hidrelétricas é 0,5%, enquanto para a energia eólica, a taxa chega a 0,9%. “É um raciocínio perverso. O país levaria um ano para fazer um parque eólico e leva cinco anos para construir uma hidrelétrica. Deveria ser o inverso se o interesse fosse o combate ao efeito estufa”, disse.

Procurados pela reportagem da Agência Brasil, os ministérios do Meio Ambiente, de Minas e Energia e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) não se pronunciaram sobre o estudo.

 

Edição: Lílian Beraldo