Camila Maciel
Repórter da Agência Brasil
São Paulo – Moradores do Jardim Ângela, bairro da zona sul da capital paulista, celebraram o Dia de Finados hoje (2) com um ato pela paz. Cerca de 1,5 mil pessoas, segundo estimativa da Polícia Militar, caminharam pelas ruas do bairro em direção ao Cemitério Jardim São Luiz. Para a organização, a caminhada, que durou quase duas horas, reuniu 6 mil pessoas. Em meio à onda de violência dos últimos meses no estado de São Paulo, eles pretendiam mostrar que a organização comunitária é um dos caminhos para amenizar o problema da segurança pública nos centros urbanos.
Em 1996, o Jardim Ângela foi apontado pela Organização das Nações Unidas (ONU) como a região urbana mais violenta do mundo. “[Os bairros] Capão Redondo, Jardim Ângela e São Luiz eram conhecidos como triângulo da morte”, disse Eduardo Oliveira, coordenador de comunidade da Paróquia Santos Mártires e um dos organizadores do ato. A coordenação do ato informou que, em 1998, eram registrados 130 homicídios para cada 100 mil habitantes na região.
“Nessa época, tinha um sentimento de medo muito forte. Foi então que nos reunimos para pensar o que fazer. Em vez de levantarmos grades e muros mais altos, fazendo das casas cadeias, vimos que o melhor era ir para a rua”, diz padre Jaime Crowe, da Paróquia Santos Mártires. Desde 1995, os moradores reúnem-se no dia 2 de novembro para protestar e dar visibilidade às vítimas da violência da região, muitas das quais são enterradas como indigente no Cemitério Jardim São Luiz.
“Reunimos 5 mil pessoas no primeiro ano. A caminhada deu-nos fôlego para pensar outras ações. Foi então que criamos o Fórum em Defesa da Vida, que continua se encontrando mensalmente na paróquia”, disse o padre. Ele informou que as reuniões aglutinam, em média, 50 pessoas. Dentre as conquistas resultantes do processo de organização, ele cita a construção do Hospital M'Boi Mirim e a implantação do policiamento comunitário. “A taxa de homicídio no Jardim Ângela caiu para 25 assassinatos a cada 100 mil habitantes. Queremos chegar a zero”.
O padre Jaime Crowe avalia que, quando a comunidade é assistida em termos de políticas públicas, os índices de criminalidade tendem a cair. “Você cria oportunidade para as pessoas”, diz. Ele avalia que os recentes casos de violência não chegaram tão fortemente ao Jardim Ângela. “O bairro não está mais em primeiro lugar no ranking. A desigualdade é responsável por gerar violência. Tem que fazer chegar cidadania nesses lugares”.
Eduardo Oliveira, que mora na região há 46 anos, acredita que a situação no bairro melhorou nos últimos 20 anos. “As pessoas enfrentavam muito preconceito quando diziam que moravam no Jardim Ângela. Era difícil até para conseguir emprego”, diz. Apesar dos avanços, o bairro ainda guarda muito desafios: transporte público, creches e ainda a questão da segurança.
A família do aposentado Antônio Cristóvão da Rocha, 70 anos, participa da caminhada desde que ela foi criada, na década de 1990. A esposa Joana Rocha, 69 anos, e as filhas Maria Rita, 33 anos, e Patrícia, 26 anos, concordam que a questão da segurança requer mais investimentos. “É certo que melhorou, mas ainda tem muito para mudar”, diz Maria Rita.
Durante o ato, os moradores usaram faixas brancas na cabeça com nomes de pessoas do bairro que foram assassinadas. Além disso, grupos de jovens fizeram apresentações teatrais. Ao final da caminhada, foi celebrada uma missa campal no cemitério.
Edição: Fábio Massalli