Vladimir Platonow
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro – Os eleitores do Complexo do Alemão, na zona norte do Rio, votaram pela primeira vez, em muitos anos, sem a influência direta do tráfico de drogas. Com a região beneficiada por quatro unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) em maio deste ano, os moradores foram às urnas desde cedo, para eleger o prefeito e vereadores.
As principais ruas do conjunto de favelas amanheceram cobertas por um verdadeiro tapete de folhetos e santinhos de candidatos. Em muros, grades e janelas das casas, cartazes com nomes de diversos partidos demonstravam que os traficantes não exercem seu poder de intimidação como em anos atrás. Em passado recente só políticos alinhados com os criminosos podiam fazer campanha na região.
Espalhados pelas esquinas ou circulando de carro pelas ruas internas, equipes de policiais militares acompanhavam o movimento de eleitores, sem agir diretamente contra a distribuição de santinhos por cabos eleitorais, que abordavam eleitores de forma discreta, a fim de não serem flagrados pela fiscalização.
Mesmo com o novo esquema de segurança, o temor em falar abertamente com a imprensa ainda é quase uma regra. Quem se dispõe a conversar, geralmente pede para não ter o nome publicado ou não fala sobre assuntos de segurança.
“Está tudo tranquilo. Todo mundo está numa boa. Um ótimo domingo”, limitou-se a dizer um morador, que trabalha de marceneiro. Outro eleitor aceitou dar o nome, mas desconversou quando a pergunta foi sobre a influência das UPPs na comunidade: “Sobre isso aí, é melhor não falar nada”, disse o pintor Carlos Henrique.
Fora das vielas internas, caminhando pela avenida principal, mais à vontade, a dona de casa Maura Regina falou como eram as eleições anteriores, quando imperava o poder do tráfico. “Antes era muito tumultuado. Agora não, está mais calmo. A gente pode andar na rua com tranquilidade”, disse ela.
Ao lado do Complexo do Alemão, outra comunidade que recebeu recentemente uma UPP é a Vila Cruzeiro. Nas ruas é possível entrar e fazer fotos, mas os moradores continuam inseguros em falar com a imprensa.
Enquanto descansava sob uma árvore, o alagoano José Paulo dos Santos, falou o que achava dos políticos. “Eu voto porque é obrigatório. Mas depois a gente vê os políticos meterem a mão no dinheiro público e perde a confiança”, disse Santos, que encerrou a conversa quando o rumo derivou para o papel das UPPs na região: “Desse assunto eu não sei nada não”.
Mais relaxados, um grupo de jovens bebia cerveja em um bar próximo. Depois de falarem sobre as aventuras do craque Adriano do Flamengo, que volta e meia aparece por ali, onde se criou, os moradores disseram que votaram todos em uma candidata à reeleição que mantém permanentemente um centro social na comunidade.
“Minha mãe não enxergava um palmo. Passou a ver tudo, depois que ganhou um óculos da vereadora”, disse Fernando da Costa, que foi logo apoiado pelo primo José Leandro: “E a minha mãe arrancou dente e botou uma dentadura”, disse ele, apontando para o centro social, onde também é possível cortar cabelo e até fazer massagem. Tudo de graça.
Edição Beto Coura