Heloisa Cristaldo
Repórter da Agência Brasil
Brasília – Terminou novamente sem acordo a audiência de conciliação em torno da obra de Monteiro Lobato. Representantes do Ministério da Educação (MEC) se reuniram hoje (25) com membros do Instituto de Advocacia Racial e Ambiental (Iara) para discutir ação que questiona o parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE) que liberou a adoção do livro Caçadas de Pedrinho, de Monteiro Lobato, no Programa Nacional Biblioteca na Escola (PNBE).
Sem conciliação, a ação volta ao Supremo Tribunal Federal (STF) e será julgada pelo ministro Luiz Fux. Os membros do Iara, autores do mandato de segurança, consideraram insuficientes a proposta do Ministério da Educação de enviar notas explicativas sobre as obras do autor brasileiro.
“Não diminuímos 1 milímetro sequer do pedido inicial. As políticas públicas não estão de acordo com a realidade. Achamos que estão sendo feitas, mas é muito pouco. O número apresentado pelo MEC, de professores capacitados, é menos de 4% do total de professores [do país]”, disse o advogado do Iara, Humberto Adami. A entidade defende recomendação anterior do CNE (parecer nº 15/2010) para não distribuição do livro nas escolas.
O Ministério da Educação defende o parecer questionado pela entidade e garante que há orientação do trabalho do professor em sala de aula sobre as obras de Lobato e outros autores. “O MEC não admite censurar obras de Monteiro Lobato e vai defender essa posição junto ao Supremo Tribunal Federal. [O parecer] Ele orienta com clareza os professores, as escolas, os sistemas de ensino, profissionais da educação de como obras de valor literário, científico devem ser mediadas pelos professores e que tenham sempre a preocupação da sua respectiva contextualização”, disse o secretário de Educação Básica do MEC, Cesar Callegari.
De acordo com Callegari, o Ministério da Educação vai intensificar a divulgação do parecer do CNE, proporcionando mais visibilidade e conhecimento do documento a todas as escolas brasileiras. “Nossa ideia é fazer que as 190 mil escolas do país tenham conhecimento adequado sobre a contextualização das obras de Monteiro Lobato”.
Callegari disse que o governo federal já implementou ações de medidas antirracistas e de promoção da igualdade racial, em atendimento à Lei 10.639, que torna obrigatório o ensino de história e cultura afrobrasileira em todas as escolas brasileiras.
“O MEC defende como pressuposto de qualquer programa educacional de boa qualidade, a plena liberdade de circulação de ideias e o pleno acesso dos estudantes às ideias no campo da cultura e da ciência, mediados por professores. Estamos tratando de obras de uso educacional”, disse Callegari.
Já o advogado do Iara ressaltou que a medida é insuficiente e afirmou que caso a entidade não consiga resultado satisfatório no STF, entrará com medidas em cortes internacionais. “O negro não pode ser visto como eterno escravizado. Vamos buscar a OEA [Organização dos Estados Iberoamericanos] no caso de não conseguirmos resolver no Poder Judiciário brasileiro essa questão".
Outra obra de Monteiro Lobato também está sendo questionada pela entidade, que encaminhou representação à Controladoria Geral da União (CGU) solicitando que investigue a aquisição do livro Negrinha. De acordo com Iara, a obra foi adquirida em 2009 pelo Programa Nacional Biblioteca na Escola (PNBE), do Ministério da Educação, e reforça o discurso racista da obra de Lobato.
“O mais importante é que o debate está sendo criado, ainda estamos discutindo resquícios da escravidão. Em carta para um amigo, Monteiro Lobato deixava claro que queria a instalação da [organização racista norte-americana] Klu Klux Klan no Brasil. E o que eles faziam? Exterminavam negros nos Estados Unidos”, disse Adami.
O secretário de Educação Básica afirmou que o Ministério da Educação ainda não foi notificado da representação.
Edição: Fábio Massalli