Carolina Pimentel
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Motivado por uma campanha da empresa onde trabalha, em Belo Horizonte, o produtor cultural Danilo França, de 24 anos, decidiu doar sangue pela primeira vez. Junto com um grupo de colegas, seguiu as etapas previstas: preencheu a ficha de inscrição e foi para a entrevista com o médico do hemocentro. Na momento da conversa, França descobriu que não poderia doar sangue porque mantém um relacionamento homossexual. “Fiquei atordoado, sem graça. Fiquei chateado e me senti discriminado”, disse França.
Uma norma nacional considera inapto à doação qualquer homem que tenha se relacionado sexualmente com outro homem no período de 12 meses. O mesmo vale para heterossexuais que, no mesmo período, se relacionaram sexualmente com várias parceiras.
Entidades de defesa dos direitos dos homossexuais reclamam da restrição e querem reacender o debate sobre o tema. “A cada fato novo, a gente tem que abrir a discussão. Se a pessoa usa preservativo e não tem comportamento de risco, não pode ser impedida de doar”, argumenta Toni Reis, presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT).
A regra do Ministério da Saúde, que vigora há mais de sete anos e vale para todos os hemocentros, foi baseada em estudos internacionais que apontam que o risco de contágio pelo vírus da aids (HIV) é 18 vezes maior nas relações entre homossexuais masculinos, na comparação com relações entre pessoas heterossexuais. O motivo é a prática do sexo anal, que aumenta o risco de contaminação por doenças sexualmente transmissíveis (DST). Foi essa determinação que fez com que a Fundação Centro de Hematologia e Hemoterapia de Minas Gerais (Hemominas) negasse ao produtor cultural a possibilidade de doar sangue.
Em junho de 2011, o ministério baixou uma portaria que proíbe os hemocentros de usar a orientação sexual (heterossexualidade, bissexualidade, homossexualidade) como critério para seleção de doadores de sangue. “Não deverá haver, no processo de triagem e coleta de sangue, manifestação de preconceito e discriminação por orientação sexual e identidade de gênero, hábitos de vida, atividade profissional, condição socioeconômica, raça, cor e etnia”. Mas, na prática, os homossexuais masculinos ativos sexualmente seguem impedidos de doar sangue. Para as lésbicas, não há restrições.
O coordenador de Sangue e Hemoderivados do ministério, Guilherme Genovez, alega que a norma brasileira é avançada quando comparada à legislação de outros países. Nos Estados Unidos, por exemplo, um homem que tenha tido, no mínimo, uma relação sexual com outro homem fica proibido de doar sangue pelo resto da vida. “Acima de tudo, está o direito de um paciente receber sangue seguro”, alega o coordenador, lembrando que os testes não identificam imediatamente a presença de vírus em uma bolsa de sangue.
Desde o ano passado, o governo federal está implantando o NAT, sigla em inglês para teste de ácido nucleico, para tornar mais segura a análise do sangue colhido pelos hemocentros. O exame reduz a chamada janela imunológica, que é o período de tempo entre a contaminação e a detecção da doença por testes laboratoriais. Com o NAT, o intervalo de detecção do vírus HIV cai de 21 para dez dias. Até agora, 59% do sangue doado no país passam pelo NAT. A previsão é que a tecnologia chegue a todos os hemocentros até julho.
Edição: Vinicius Doria