Monica Yanakiew
Correspondente da EBC na Argentina
Buenos Aires – Os carperos (sem-terra paraguaios) deram esta semana um ultimato ao governo do presidente Fernando Lugo: querem uma solução para a questão das terras ocupadas há décadas por colonos brasileiros. “As terras foram adquiridas ilegalmente e precisam ser restituídas ao Estado”, disse à Agência Brasil, Federico Ayala, um dos líderes dos carperos. “Caso contrário, vamos fazer uma ocupação massiva, e vamos mobilizar também os motoristas de caminhão, que apoiam nossa causa, para bloquear as estradas”.
Segundo Ayala, existem 9 mil famílias de carperos acampadas em uma faixa de terra, por onde passam as torres de transmissão de energia, no município de Nanducay
O governo paraguaio informou que a Justiça está examinando os títulos das terras, apresentados pelos colonos brasileiros, para determinar sua legalidade. Os que estiverem ocupando terras ilegalmente podem perder suas propriedades. Mas, até a decisão judicial, cabe ao Poder Executivo proteger a propriedade privada.
“Vivemos um clima de incerteza e de tensão, que é prejudicial para a produção agrícola. Estamos colhendo com escolta policial. Mas quem vai continuar investindo nas terras sem saber se vai ser invadido ou se poderá transportar os produtos para serem comercializados ou exportados?”, declarou à Agência Brasil o produtor brasileiro Elói Walter. “Temos medo da violência porque os dois lados estão armados, e qualquer chispa pode desencadear uma tragédia”.
A história do conflito de terras, na fronteira do Paraguai com o Brasil, remonta à ditadura do general Alfredo Stroessner (1954-1989). Ele queria desenvolver a região do Alto Paraná e incentivou colonos brasileiros a ocupá-las, vendendo terras fiscais a preços acessíveis. Nas últimas quatro décadas, os brasiguaios (como são chamados os colonos brasileiros que se estabeleceram no Paraguai) investiram na produção agrícola, principalmente na lavoura de soja.
O Paraguai é hoje o quarto maior produtor mundial de soja, mas os paraguaios reclamam que essa riqueza não beneficia a população local: 80% das terras paraguaias estão nas mãos de 2% da população, segundo o governo, que quer promover uma reforma agrária. Um dos maiores proprietários de terras do país é o brasileiro Tranquilo Favero, que está no Paraguai há quatro décadas e naturalizou-se paraguaio.
“Muitos colonos brasileiros não têm culpa: foram usados por Favero, como laranja. Exploram terras que, na verdade, são dele”, disse Ayala. Mas Elói Walter assegura que os títulos dos brasileiros são legais e muito dinheiro foi investido nelas. “Eram terras improdutivas, que nós trabalhamos durante anos, até torná-las produtivas”, declarou. “É o meu caso. Vim para cá há 34 anos, graças à política de incentivo de Stroessner. Tinha acabado de passar no vestibular para medicina, e larguei tudo para começar do zero. Casei e tenho filhos e netos nascidos no Paraguai. Não é justo que agora queiram tirar tudo que construímos”, disse.
As invasões de terras começaram em 2011, mas nos últimos meses aumentaram. O governo paraguaio está enviando policiais à região para proteger os colonos e impedir novas invasões. Mas, segundo Ayala, essa situação não pode continuar assim por muito tempo. Se a Justiça demorar para resolver o problema, eles vão voltar a invadir as terras.
“Será uma invasão ordenada. Permitiremos aos brasileiros colherem o que já plantaram, mas não deixaremos que plantem mais ou que transportem suas mercadorias até resolver a questão”, disse Ayala.
Edição: Aécio Amado