Desabrigado por terremoto no Haiti diz que quer esquecer desastre

24/11/2010 - 5h14

Vitor Abdala
Enviado Especial

Porto Príncipe - Aos 60 anos, Hasler não tem muitos bens materiais. Depois do terremoto de janeiro deste ano, até a casa ele perdeu. Hoje, vive com cinco pessoas de sua família em uma barraca montada sobre a laje de uma igreja evangélica no morro do Forte Nacional, área carente no centro de Porto Príncipe.

Apesar disso, Hasler (que fez questão de se identificar apenas com esse nome) não tem dúvidas. "Tenho uma boa vida", diz o haitiano, com um enorme sorriso no rosto. "Não quero pensar na minha casa. Preciso continuar vivendo."

Sobre o que espera do próximo presidente do Haiti, Hasler diz que não tem grandes expectativas. "Falta muita coisa para o Haiti. Basta olhar em volta", afirma, apontando para as moradias precárias do morro do Forte Nacional.

Na entrevista concedida à Agência Brasil, Hasler tem a ajuda do filho Chamyr Jean, de 27 anos. É ele quem traduz o creole, a língua popular do Haiti falada por seu pai, para o português, aprendido com as tropas brasileiras que mantêm um quartel no antigo Forte Nacional.

No meio da entrevista, aparece o neto de Hasler, um menino de 5 anos. A criança pergunta  ao oficial do Exército que acompanha a reportagem, em bom português: "Como você se chama?". Essa é uma das frases em português que o garoto sabe pronunciar.

O oficial diz seu nome e logo o menino, incentivado pelo avô e pelo tio, começa a cantar a música Entra na Minha Casa, em português perfeito. Chamyr diz que o sobrinho está aprendendo português com a influência do tio e a proximidade com os militares brasileiros que ocupam o forte em frente à barraca onde moram.

Pastor da pequena igreja evangélica que abriga a barraca de Hasler, Jhunes Fabien, de 67 anos, também começa a participar da entrevista. Sua igreja, conta ele, tem 500 membros frequentes, além de pessoas que aparecem para as cerimônias religiosas. Todo dia tem culto na congregação e "a casa está sempre cheia", garante.

Ele reclama da violência na área e diz que já foi ameaçado pelos bandidos que atuam na região. "Tem muito perigo aqui no Forte Nacional", diz, acrescentando que os problemas da vizinhança e de seu país são muitos. Mas, como líder religioso, Jhunes expressa sua fé. "Tenho fé. Só com fé pode-se viver no Haiti", diz o pastor.

Ao fim da entrevista, ele leva a equipe à porta da igreja. Lá, a reportagem conhece Felix Louissant, uma viúva haitiana. Com três filhos, ela monta diariamente uma barraquinha em frente ao templo religioso, há quase um ano.

Na pequena tenda, Louissant vende de tudo, de pão a papel higiênico, passando por detergente e biscoitos. "Preciso ganhar dinheiro. Por isso, vendo essas coisas. Ganho o suficiente para sobreviver", conta. A reportagem pergunta se ela vende muita coisa em seu comércio improvisado. A haitiana nem precisa responder. Logo um cliente se aproxima e entrega uma nota amassada de gourde, a moeda do país.

Edição: Graça Adjuto