Vitor Abdala
Enviado Especial
Barbacena (MG) - Paulo César adora carros e conhece toda a vizinhança. José Raimundo gosta mesmo é de tocar uma sanfona. Antônio Rodrigues prefere tomar sol na pracinha em frente a sua casa e cuidar desse espaço público como se fosse seu lar. Já Maria de Fátima vive um romance com Tomaz Aquino há vários anos. Todos eles moram juntos, na cidade mineira de Barbacena.
A casa seria apenas uma residência normal, em uma pacata cidade do interior do país, se não fosse por um detalhe: seus sete moradores passaram anos internados em um hospício e hoje, por ainda sofrerem de problemas mentais, vivem no local sob os cuidados do Estado.
Trata-se de uma das 25 casas terapêuticas de Barbacena, que, por décadas, foi conhecida como a Cidade dos Loucos, por concentrar sete hospícios e milhares de pacientes com distúrbios mentais.
As residências terapêuticas, que abrigam mais de 160 pessoas no município, fazem parte da política nacional de acabar com os hospícios e permitir a convivência social e familiar aos pacientes com problemas mentais. Essas casas são voltadas para aqueles que não têm laços familiares e tampouco podem viver sozinhas por ter algum tipo de dependência.
A casa de Paulo César, José Raimundo, Antônio, Maria de Fátima e Tomaz, por exemplo, conta com quatro cuidadores, profissionais que acompanham e ajudam os ex-internos, e uma profissional de serviços gerais, que ajuda a organizar o local. A supervisão fica por conta dos técnicos de referência, como a psicóloga Leila Maria Stefani.
As residências terapêuticas, que funcionam em Barbacena há oito anos, são casas alugadas com dinheiro do Sistema Único de Saúde (SUS). Em geral, são ambientes grandes porque precisam abrigar até oito moradores.
“No início, havia uma resistência dos moradores das redondezas e até mesmo dos proprietários, que não queriam alugar suas casas para residências terapêuticas. Hoje quase não tem mais essa resistência. As pessoas passaram a entender como elas funcionam. E os moradores [ex-pacientes] passaram inclusive a se integrar com a vizinhança”, conta Leila Maria.
Ela cita o caso de Paulo César, carinhosamente conhecido dentro da casa e pelos vizinhos como Bolinha. Apesar de ser um adulto, na faixa dos 40 anos, Bolinha parece ter a mente de uma criança, com dificuldades de falar e de se locomover. Mas, segundo a psicóloga, ele se integrou completamente à comunidade. “Hoje ele conhece todo mundo e é até convidado para aniversários aqui na vizinhança. As pessoas sempre passam aqui na rua e brincam com ele.”
Em breve, a casa deve perder dois de seus moradores. É que o casal Maria de Fátima e Tomaz Aquino deixará o espaço em busca de privacidade. Para isso, a prefeitura a procura um novo local para servir de residência terapêutica aos dois, que precisa ser adaptado porque Maria tem dificuldades de locomoção e Tomaz usa uma cadeira de rodas.
Edição: Juliana Andrade e Lílian Beraldo