Comunidade de Niterói renasce junto com a indústria naval

27/06/2010 - 15h29

Vladimir Platonow
Repórter da Agência Brasil

Rio de Janeiro - A relação entre as estatísticas que apontam o vigoroso crescimento do país no setor naval e a vida cotidiana pode ser constatada em uma comunidade que há mais de um século depende do movimento dos estaleiros. Na Ponta da Areia, em Niterói, onde os primeiros navios brasileiros foram construídos, ainda no século 19, o sustento das famílias está relacionado ao número de embarcações e plataformas construídos nas empresas localizadas ao pé do Morro da Penha.

Tudo no bairro gira em torno dos estaleiros. Desde o pequeno quiosque onde os operários almoçam, até as empresas metalúrgicas que fornecem peças e equipamentos para os navios. Mas o ciclo econômico pode ser mais bem sentido junto aos moradores da região. No alto do morro, onde se pode subir sem medo de ser assaltado ou de ter que se explicar para alguma milícia local, o clima é de tranquilidade. O motivo é que a maioria dos trabalhadores voltou a atuar no setor naval, depois de passar quase vinte anos fora da área, ganhando a vida como vendedores, operários da construção civil ou trazendo o sustento do mar, por meio da pesca.

“A gente espera que haja continuidade nessa retomada, para que muitos amigos nossos que estão fora também possam retornar. Eu já trabalhei de serralheiro e na construção civil, durante o período em que não havia empregos”, disse Luiz Cláudio dos Santos, que hoje trabalha a bordo de um navio da Petrobras, como mecânico de bombas e compressores. Ele voltou ao setor faz quatro anos, depois de dez anos trabalhando em outras áreas.

Destino semelhante teve a família de Solange Pereira de Oliveira, onde quase todos trabalham na construção de navios, sofrendo os altos e baixos do mercado. O marido e os três filhos são soldadores e só um deles está desempregado. “A minha família toda sempre trabalhou com estaleiros. Desde o meu avô, o meu pai, os meus cunhados. Passa de geração a geração”, contou Solange.

Ela recorda os tempos difíceis, quando a maioria dos estaleiros praticamente fechou as portas. “Passamos muitas dificuldades, com filhos pequenos para alimentar. O que nos salvou foi o mar, com o meu marido saindo para pescar, vendendo o peixe e trazendo alimento para casa”, lembrou Solange, que ajudou a fundar a Associação dos Moradores do Morro da Penha, ainda na década de 80.

O atual presidente da associação é Adriano Boinha Oliveira, que comemora a volta do trabalho na comunidade onde mora desde que nasceu. “Os pais e os filhos vêm seguindo a tradição, a Ponta da Areia é o berço da construção naval. Nós queremos que as empresas melhorem cada vez mais para que os empregados e os comerciantes do local possam crescer juntos”, disse Adriano.

Um dos exemplos de como os milhões de reais investidos no setor chegam à pequena economia que se forma em torno dos estaleiros é o quiosque de Rosenilda Brito, perto do Estaleiro Mauá (um dos maiores da região) e na entrada do pequeno porto que atende aos barcos de pesca artesanal. “Se o estaleiro vai bem, todo mundo vai bem. Quando o estaleiro do meu bairro fechou, foi um desastre. Eu vi muita gente passando necessidade. Graças a Deus ele foi revitalizado e voltou a empregar muita gente”, disse Rosenilda, que comemora a boa fase da economia na Ponta da Areia, sem esquecer o período de vacas magras.

“Eu vi muito comerciante fechar as portas por falta de fregueses. Agora, fico emocionada de ver aquele monte de chefes de família indo trabalhar. A pior coisa que existe é um pai desempregado, porque tira toda a cidadania da pessoa”, contou ela, que chega a servir 50 almoços por dia para os trabalhadores do estaleiro e das outras empresas ligadas à construção naval.

Edição: Vinicius Doria